Parece Glasgow mas é San Francisco

 

 

 

 

The Umbrellas – Fairweather Friend
35′, 10 faixas
(Tough Love)

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

 

Ouvir o segundo disco do quarteto Umbrellas é dar de cara com um monte de referências sonoras que não têm muito a ver com sua San Francisco natal. Saem o sol, os hippies, os prédios coloridos, ladeiras e a Golden Gate Bridge e entra todo um imaginário de chuvas, melancolia, saudade e tons acinzentados, típicos de lugares como Glasgow, Manchester e similares. Não há engano nesta impressão. O som que os sujeitos fazem é deliberadamente influenciado pela produção dos selos K Records e Sarah Records, bem como por bandas como Smiths, Sundays, Felt, Orange Juice, Pastels e toda e qualquer formação que misturou sentimentos com violões e guitarras elétricas, que lembram, em primeira instância, o que Johnny Marr fazia nos Smiths iniciais, talvez o momento mais popular e acessível desta sonoridade em todos os tempos. As dez faixas de “Fairweather Friend” oferecem toda este pacote de referências, mas não se limitam a apenas revisitar o passado de quase quatro décadas atrás. Tem novidade, pujança e belezura no som que sai da caixinha.

 

A banda tem seis anos de existência e conta com Matt Ferrara (guitarras e vocais), Morgan Stanley (guitarras e vocais), Nick Oka (baixo) e Keith Frerichs (bateria). Em 2021 estrearam em disco com o bom álbum homônimo, que se tornou um preferido cult em muitos lugares, especialmente por conta da delicadeza das canções, com destaque para os belos vocais entremeados de Matt e Morgan, criando vários duetos homem-mulher que trouxeram novidade para o estilo. Na parte instrumental, o entrelace de guitarras acústicas e elétricas é a marca registrada, mas, no terreno das novidades, podemos dizer que os Umbrellas têm um fraco pelo lado mais pop da coisa, com dedicação especial a melodias ganchudas, arranjos que podem surpreender e até desagradar o fã mais ortodoxo deste rock tristonho e dedilhado que eles fazem, conhecido lá fora como “jangle rock”, um rótulo que, a princípio, também serviria para gente mais graúda como os Byrds, por exemplo. Melhor entender o que eles fazem como uma recriação do rock alternativo britânico oitentista alternativo. É mais longo, porém, mais preciso.

 

O grande barato deste novo álbum “Fairwheater Friend” é notar como os arranjos da banda evoluíram nestes poucos anos de atividade. Se o primeiro disco lhes deu a chance de excursionar dentro e fora dos Estados Unidos, este segundo trabalho mostra uma banda com mais capacidade de manobrar dentro do estilo, incorporando mais referências visuais – a capa, por exemplo, é linda – e reforçando as características sonoras. Logo de cara, com a ótima “Three Cheers”, é possível se transportar lá pra 1986 com o dedilhado de baixo, a entrada das guitarras e os vocais que se alternam entre grave, agudo, masculino, feminino. A construção do clima é muito bem feita e totalmente harmônica. São pouco mais de três minutos que passam voando e arremessam o ouvinte – com cara de felicidade – no resto do álbum.

 

“Goodbye” é totalmente conduzida pelos vocais de Morgan e isso faz muita diferença, ampliando a sonoridade que a banda consegue atingir. Tudo funciona, enquanto “Toe The Line”, logo em seguida, surpreende por ter uma levada acelerada, lembrando um pouco os Smiths de “Cemetery Gates”, mas com vocais femininos que fazem muita diferença. A quantidade de belas canções é muito grande. “Echoes” é uma delas, com baixo cheio de graves e uma levada que lembra muito The Sundays, o que é sempre uma ótima referência para mencionar. “Games” é outra faixa com vocais femininos que também tem ritmo e andamento mais acelerados, dessa vez pendendo um pouco para o country, enquanto “Gone” coloca na frente do arranjo as guitarras dedilhadas tão familiares para quem gosta da sonoridade que os Umbrellas oferecem. E quando nos aproximamos mais do fim do álbum, surge a nervosinha “When You Find Out”, a dedilhada e pungente “Blue” e a melancólica, porém brejeira, “PM”, que ameaça lembrar “Boys Don’t Cry” em algum momento da melodia, mas sai pela tangente.

 

“Fairweather Friend” é uma ótima pedida para quem gosta do rock oitentista mais melancólico, low profile e britânico. O que os Umbrellas oferecem aqui é um feixe de canções estilosas, mas muito belas, dotadas de vida própria. Conheça.

 

Ouça primeiro: “PM”, “Echoes”, “Three Cheers”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *