Joe Satriani – Shapeshifting

 

 

 

Gênero: Rock

Duração: 46 min.
Faixas: 13
Produção: Joe Satriani e Jim Scott
Gravadora: Sony

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

Joe Satriani está por aí há quase quatro décadas fazendo discos de rock instrumentais. Guitarrista dos guitarristas, ele é chamado de “gênio”, “humilde”, “gente boa”, mas o consenso maior sobre Satriani reside em seu talento como instrumentista e produtor. Ele é maior que sujeitos como Steve Vai, justo porque tem uma manha rara de se encontrar: “Satch” é bom compositor e tem noção de que a guitarra serve à música e não o contrário. Seus discos não são fontes de masturbação instrumental infinita, são bons exemplos de como o rock instrumental – este gênero quase insuspeito – consegue gerar bons espécimes. É o caso deste décimo-sétimo álbum do sujeito, “Shapeshifting”.

 

Satriani tem a seu lado grandes músicos. Na bateria está o versátil Kenny Aronoff, que já tocou com Smashing Pumpkins, John Mellencamp e com o próprio guitarrista, no projeto Chickenfoot. Também está presente Chris Chaney, baixista do Jane’s Addiction e o tecladista Eric Caudieux. Wendy Coleman, ex-The Revolution – a banda que acompanhava Prince nos anos 1980 – participa com seu piano em uma faixa. Produzindo o álbum, Jim Scott, que já pilotou trabalhos de gente tão diversa quanto Tom Petty, Foo Fighters e Panic At The Disco. Satriani também assina a produção e leva adiante esta ideia não declarada de oferecer um álbum de música instrumental moderna, rock e que seja capaz de retratar suas influências mais distantes e suas experiências mais recentes. O resultado chama a atenção.

 

Algumas canções são realmente inspiradas e nada se parecem com a opinião que o senso comum tem a respeito de discos assim. Satriani oferece uma diversidade impressionante de estilos, desde baladas até reggae, mostrando em todas as faixas uma incrível capacidade para imprimir detalhes que são interessantes até para ouvidos leigos no ofício de tocar guitarra. “Big Distortion”, por exemplo, é uma composição que tem inegável levada sessentista – do início da década – com andamento em marcha média, oferecendo espaço para riffs e licks bem mandados. A faixa-título, que abre os trabalhos, é uma nervosa canção noventista de rock alternativo, ótimo desempenho de Aronoff e linha de baixo sinuosa de Chaney. Em “Ali Farka, Dick Dale An Alien And Me”, Satriani revisita duas de suas influências – o malinês Farka – e o mestre da surf music, Dick Dale. O andamento da música pega emprestadas levadas que podem ser africanas ou não, com um ótimo trabalho guitarreiro como molho final.

 

“Nineteen Eighty”, como o nome já diz, é um aceno gentil e afetuoso ao rock dos anos 1980. Parece uma canção do Van Halen com algumas salpicadas de Rush, tudo no lugar e em alta octanagem. “Spirits, Ghosts And Outlaws” também é outro rockão oitentista, mas com outra pegada, especialmente na linha de baixo sincopada e na bateria bem marcada. “Waiting”, a faixa que tem Wendy Coleman ao piano, é uma delicadíssima canção que parece derreter sob a chuva, coisa sutil e linda, enquanto “Here The Blue River” é um ensolarado reggae, que não tem absolutamente nada de mecânico ou artificial, mas exibe uma bela estrutura, com a guitarra de Satriani fazendo base e solo, com virtuosismo e criatividade. “Perfect Dust” lembra o que seria um instrumental de bandas como ZZ Top e o fecho com “Yesterday’s Yesterday” é outra delicada peça, dessa vez mais próxima do folk zeppeliniano.

 

“Shapeshifting” faz jus a seu título: é um compêndio de canções de um guitarrista com impressionante capacidade de transformar de acordo com o que a composição lhe exige, sempre se colocando a serviço da melodia, num gesto de humildade e noção de coletivo. Coisa rara em guitarristas. Disco surpreendente.

 

Ouça primeiro: “Nineteen Eighty”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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