Elvis Costello – Hey Clockface

 

Gênero: Rock, alternativo

Duração: 49 min.
Faixas: 14
Produção: Elvis Costello e Sebatian Krys
Gravadora: Concord

2.5 out of 5 stars (2,5 / 5)

 

 

Elvis Costello chega a mais um disco de sua extensa carreira tendo a caminhada inexorável do tempo como tema. Quer dizer, não necessariamente. Se há algo complexo em “Hey Clockface” é determinar qual o assunto abordado. Sim, porque Elvis lançou um de seus trabalhos mais fragmentados até hoje. Se ele ganhou notabilidade por ser capaz de encarnar várias vertentes musicais – do blues e do pop clássico à música erudita – sem perder suas características como cantor e compositor, aqui ele abre espaço para todas as influências possíveis em um só álbum. Há até pouco tempo, Costello destinava espaços maiores para dar conta de suas vontades criativas. Eram discos inteiros de jazz, de música clássica, de blues, de pop, enfim, o campo de experimentações era maior ou, melhor dizendo, ele precisava de mais tempo e espaço para exorcizar estes arroubos dirigidos de criatividade. Como tudo ficou mais rápido e fragmentado nesta vida de 2020, por que não o velho EC? Sendo assim, é o que temos por aqui, um trabalho que parece vários e, talvez, não pareça nenhum.

 

Elvis Costello é um dos sujeitos mais talentosos surgidos no levante punk inglês. Só que ele nunca foi um cara como um Joe Strummer ou mesmo como um Paul Weller. Logo ele se provou muito mais erudito e amplo em termos de espectro musical. Ao contrário do que pode parecer, tal característica não causou a perda de identidade de sua música, mas conferiu a ele uma espécie de compreensão maior por parte de fãs e críticos. “Ora, é Costello, vale tudo”. Pois bem, talvez a redução de espaço para dar conta das influências primordiais não tenha funcionado completamente neste novo álbum e o resultado seja equivalente ao de ouvir uma trilha sonora ou mesmo uma coletânea de vários períodos de tempo. Além disso, a safra de composições não é exatamente a melhor, deixando uma impressão estranha de ouvirmos um raro disco fraco de um dos maiores artistas do pop das últimas décadas. Mas é bom que se diga: “Hey Clockface” é um trabalho menor na carreira de Elvis.

 

Tal impressão só vem com a audição completa e reiterada das canções e causa surpresa, especialmente pela qualidade dos singles lançados. “No Flag”, por exemplo, eletrônica e apunkalhada, soou perfeita como uma declaração de virulência – ainda que meio isentona – em tempos de politização do espaço. Costello, que sempre foi um cara crítico e inteligentíssimo, não deixou passar o atual momento e se posicionou. Depois veio “Hetty O’Hara Confidential”, uma espécie de r&b, meio jazzística, meio eletrônica, com melodia dançante e criativa. Manteve o otimismo lá em cima. Depois Costello surgiu na mídia dizendo que havia gravado o disco em Helsinque, misteriosamente, procurando ir para um lugar no qual não fosse conhecido pela maioria das pessoas. Legal, deu ao álbum um tom de fuga e escapismo, que poderia indicar um bom trabalho.

 

Mas nada disso: Costello surgiu na mídia há pouco, dizendo que o álbum foi finalizado em Paris e com as outras canções, todas mais fracas que os singles lançados. Na verdade, há apenas outros dois momentos, bem distintos do que ele havia lançado. “The Last Confession Of Vivan Whip”, uma balada jazzística ao piano, arrepiante, com belo arranjo de sopros; e a última faixa do álbum, “Byline”, outra canção lenta e píanística, mas com jeito de cantiga de ninar, rabiscada, otimista e ingênua. Aqui está presente o Costello crooner, que faz milagres com sua voz de curto alcance, soando forte e visceral em meio a instrumentais singelos e doces. E só. Daí a gente fica pensando que o mundo atual nos faz duros, crueis e impiedosos, mas não. O álbum é só isso, gente.

 

“Hey Clockface” é um raro trabalho em que Elvis Costello perde a mão para dosar suas personas musicais. Pior: é um disco com canções esquecíveis em sua maioria. Porém, como o homem tem crédito de sobra, seguimos confiantes de que ele recuperará o terreno perdido no próximo lançamento.

 

Ouça primeiro: “No Flag”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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