O disco perfeito de Lindsey Buckingham

 

 

 

Lindsey Buckingham – Lindsey Buckingham

Gênero: Rock, pop

Duração: 36:38 min.
Faixas: 10
Produção: Lindsey Buckingham
Gravadora: Warner

5 out of 5 stars (5 / 5)

 

 

 

Descontando dois álbuns ao vivo e uma colaboração registrada em 2017 com Christine McVie, este é o sétimo álbum de Lindsey Buckingham. Sua banda original, o Fleetwood Mac, é, simplesmente, uma instituição do rock melodioso anglo-americano, tendo na sua versão californiana – da qual Lindsey e sua ex-esposa, Stevie Nicks, participaram – a mais bem acabada de toda a existência do grupo, desde suas raízes blues na Inglaterra sessentista. Lindsey é, sem dúvida nenhuma, o grande arquiteto da sonoridade do Big Mac desde meados dos anos 1970, responsável pela alquimia que uniu pop virtuoso e radiofônico com nítido apelo rock. Além dele, claro, Stevie dava o contraponto com as letras esotéricas e existenciais, enquanto o casal John e Christine McVie e o baterista boa praça, Mick Fleetwood, completavam o time vencedor. Por conta de várias divergências internas, brigas de casal e situações barra pesada, Lindsey nunca foi uma figura estável e sua permanência no Mac oscilava de tempos em tempos. Deixou a banda algumas vezes e, em 2017, às vésperas do grupo completar 50 anos, ele foi demitido por questões criativas. E não voltou mais.

 

Para seu lugar, o Mac chamou o sensacional Neil Finn, mente pensante da banda neozelandesa Crowded House. Nesta altura, em 2018, Lindsey já tinha a intenção de fazer mais um disco solo, mas não imaginava que, além da substituição de sua banda, ainda amargaria problemas de saúde, um divórcio e uma pandemia global, tudo em sequência. Felizmente, o tal disco novo, homônimo, lançado só agora, registra um panorama arejado e que não capta toda essa sucessão de porradas da vida e do destino. Pelo contrário, este novo trabalho é o que mais confirma a importância de Lindsey para a sonoridade do Fleetwood Mac. As estruturas das canções, os arranjos e as melodias são inevitavelmente perfeitas, tudo feito e pensado com lampejos de genialidade. Além disso, a intenção do cantor e compositor passava também por esta objetividade, ou seja, não há, em nenhuma das dez faixas deste álbum, qualquer indício de complicador sonoro. Tudo flui, nada cansa e, no meio do caminho, há algumas das melhores canções lançadas neste ano de 2021.

 

São nove originais e uma versão de uma gravação do grupo folk texano The Pozo-Seco Singers, tudo perfeitamente harmonizado neste contexto californiano, contemporâneo e melodioso. A sensação é de que, mesmo com algumas concessões simpáticas à modernidade, Lindsey quis nos oferecer a sua versão atual de percepção do mundo e das coisas, via música. Não tem rancor ou arrependimento de nada por aqui, apenas a dedicação ao artesanato pop perfeito. Por exemplo: “I Don’t Mind”, a segunda faixa do disco, é, seguramente, descendente direta de clássicos como “Go Your Own Way”, de “Rumours”, álbum clássico do Fleetwood Mac, de 1977, seja pelo refrão infeccioso, seja pela melodia perfeita. E ela é apenas um dos destaques que ouvimos por aqui.

 

“Swan Song” tem uma programação de bateria que coloca Lindsey nos anos 2000, sem falar na maravilhosa progressão de vocais de apoio e dedilhados de violão, marca registrada do homem. “Blind Love” é outra lindeza, cujo andamento mistura o clássico hit “Trouble” (de 1981), com algum tempero latino, dando um toque de Eagles no resultado final, seja pelos vocais perfeitos, seja pela melodia irretocável. “Time”, a tal cover dos The Pozo-Seco Singers, é linda e nem parece que é de autoria alheia, dando ao conjunto de canções um momento de pujança decalcada de um passado ideal. “Blue Light” é outra belezura, com refrão que explode em vocais e guitarras perfeitas; “Power Down” é outro flerte com programações de bateria moderninhas, que ornam bem com a estrutura pop-de almanaque que Lindsey ergue. “Santa Rosa” parece uma canção que poderia ser oferecida para Roy Orbison cantar em seu belo disco “Mystery Girl”, de 1989, que marcou o retorno do velho romântico ao disco. “Scream”, o primeiro single do álbum, é outro momento pop perfeito e “Dancing”, a balada sussurrante de encerramento, é simplesmente irretocável.

 

Se você gosta de discos como “Mirage”, de 1982 e “Rumours”, de 1977, este álbum de Lindsey nem vai te surpreender, vai te trazer pra casa. Se você não conhece a obra do cara, mas é um dos recém-convertidos ao Fleetwood Mac, está na hora de presenciar a genialidade do sujeito e perceber que o grupo ia muito, mas muito além da adorável figura de Stevie Nicks. Um dos melhores álbuns de 2021, sem sombra de dúvida.

 

Ouça primeiro: “I Don’t Mind”, “Dancing”, “Blind Love”, “Santa Rosa”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

2 thoughts on “O disco perfeito de Lindsey Buckingham

  • 17 de agosto de 2022 em 08:39
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    Opa, José. Pois é, são mudanças pelas quais a sociedade passa, evolução de processos culturais que resultam nisso. Também não sei o que pensar, mas a sensação é bem estranha. Obrigado pelo coment´raio.

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  • 16 de agosto de 2022 em 13:08
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    Carlos Eduardo, também concordo contigo….. muitas vezes penso e sinto que o mundo acabou no início dos anos 90, na literatura, na filosofia, na arte, na música, em filmes, na criação e produção de novos atores e músicos. Lamentavelmente muita decadência. Não me sinto negativista não… ou, mesmo, saudosista; observo apenas como uma pura e triste realidade.

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