E pra comprar CDs?

 

 

O capitalismo neoliberal decidiu que, no Brasil, os fãs de CD – mesmo que em número menor do que em outros tempos – não podem mais comprar discos novos. As lojas de rua acabaram. As lojas de shopping também. As megastores faliram e suas versões online minguaram. Os sites independentes da Internet que ainda resistem só conseguem importar os álbuns porque as filiais das gravadoras multinacionais no país não mais produzem aqui os disquinhos. E os artistas nacionais? Como fazem? O que está acontecendo/aconteceu com o mercado?

 

Veja esta listinha abaixo:

Killers – Imploding The Mirage
Bruce Springsteen – A Letter To You
Deftones – Ohms
Liam Gallagher – MTV Unplugged
Pet Shop Boys – Hotspot
Pearl Jam – Gigaton e Unplugged MTV
Paul McCartney – McCartney III
Roger Waters – Us And Them
The Strokes – New Abnormal
Neil Young – Homegrown

 

São discos lançados em 2020 lá fora e que chegariam aqui em outros tempos. Todas essas bandas e artistas já tiveram versões fabricadas aqui de seus álbuns e são todos bem conhecidos de seu público. Certamente venderiam algumas cópias em CD caso os preços fossem mais convidativos. Eu compraria todos se custassem até 30 reais, algo que, sabemos bem, a atual circunstância econômica do país não permite. Mas esta situação não é nova, o CD vem minguando e perdendo espaço…aqui. Lá fora, nas Amazons da vida, todos eles seguem sendo lançados pelo mesmo preço, vendidos e elogiados pelos consumidores. A demanda diminuiu? Certo que sim, afinal de contas, o streaming está aí como algo irreversível, mas estamos mesmo preparados para abrir mão das mídias físicas? Bem, se não estamos, teremos que ficar porque o Brasil deste início de década não parece mais disposto a investir nisso.

 

Tudo é custo, gente. Eu tenho em mente que, caso o mercado oferecesse um preço mais convidativo, os discos ainda seriam vendidos e dados como presente de Natal, aniversário e por aí vai. E mais: seriam comprados pelos consumidores de sempre. E os artistas nacionais, completamente desamparados pelas gravadoras, seguem usando os discos como um dos meios de obter receita. Não só o CD, mas o LP segue como um dos atrativos deles para os fãs. Quem gosta de uma banda ou cantor/cantora irá comprar a mídia física, creio eu, mesmo que os mais jovens pareçam desapegados. Mas tal afirmação também é contraditória, uma vez que estes mesmos endeusam os formatos LP/K7 como detentores de uma “fidelidade sonora maior” ou algo assim. Na verdade, tal mudança de paradigma é uma decisão do mercado, do sistema. Abracem a música digital. E ponto final. Se quiserem comprar a mídia física, paguem muito caro. Fim.

 

E o mercado também decidirá que, em alguns anos, o CD volta. Repaginado, fetichizado, refeito, mas voltará. É bom lembrarmos que o formato foi responsável pelo relançamento de várias discografias, bem como pelas constantes melhorias de qualidade sonora através das remasterizações e remixagens, bem como pela inclusão de faixas extras e pelo advindo das caixas, que continham os maiores sucessos da carreira de um artista, bem como versões raras, ao vivo e tudo mais. Quem conseguiu comprar uma dessas caixas em algum momento da vida, sabe bem a felicidade que elas podem proporcionar.

 

E não venham com a balela de que o LP é responsável por um eventual aquecimento da indústria fonográfica. É um mercado ainda mais segmentado e de proporções menores, que serve, sim, a colecionadores. O consumidor de CD ainda não deveria ser classificado dessa forma.

 

Aliás poucas coisas são mais irritantes do que ver um LP novo, de uma banda nacional dos anos 1980, sendo vendido a … 200 reais. Parem.

 

Voltando.

Se você quiser adquirir qualquer um desses discos listados acima em versão física, terá que importar. Como vivemos num país em regressão/recessão econômica, o valor deles não deverá ser inferior a 100 reais, pelo câmbio de outubro. Digo isso porque decidimos comprar o novo álbum do Bruce Springsteen e teremos que contar com a boa vontade de um amigo que mora em Portugal, que receberá a encomenda lá e virá ao Brasil no fim do ano, nos entregando aqui em casa. Quero acreditar que uma tiragem de 500 cópias do álbum venderia o suficiente por aqui.

 

Enquanto isso, apenas para álbuns que já foram lançados há tempos, em outros tempos, os sebos continuam sendo opções ótimas. Há vários online, basta procurar, ainda que a meca dos sebos, a Secondspin, tenha fechado após décadas de operação. Resumindo: não é um bom tempo para gostar de algo que não seja academia de ginástica ou farmácia.  Ou cultura.

 

Aliás, disco é cultura. Ainda é.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

3 thoughts on “E pra comprar CDs?

  • 21 de fevereiro de 2023 em 08:41
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    Estou desde o lançamento correndo atrás do Ohms, do Deftones.. mas (ainda) não estou disposto a pagar mais de 100 reais pelo importado. Primeiro CD da banda não lançado no Brasil. Muito triste.

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  • 23 de outubro de 2020 em 00:47
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    Nem fala…
    Sempre procuro comprar em CD meus preferidos do ano. E a cada ano consigo menos.
    Nesse, com o prejuízo da pandemia, só consegui o da Laura Marling, por enquanto (e mesmo assim pagando quase 100 reais…)
    Eu podia jurar que pelo menos o Neil Young e o Dylan teriam tiragem nacional, mas parece que nem esses.

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    • 23 de outubro de 2020 em 16:23
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      Pois é, o panorama é desolador. A gente aqui em casa comprou o Bruce Springsteen novo, mas saiu por quase 100 reais também e ainda conseguimos comprar na gringa para um amigo nosso receber em Portugal. Ou seja, uma operação de guerra.

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