E o roberto jefferson, que tem um disco gravado?
Ponderei muito se deveria escrever esse texto. Como vocês sabem, a Célula Pop é de esquerda e comprometida com a ideia de um Brasil em que o combate à desigualdade seja algo presente em nosso cotidiano. E, a partir disso, a gente não dá espaço para quem pensa que, sim, devemos ter miséria material e humana, que é a principal consequência da desigualdade. Sendo assim, a gente só fala dessas pessoas quando é para criticá-las, até porque, elas, de fato, nada têm que valha a pena ser mencionado. Sendo assim, após o incidente de ontem, no qual o ex-deputado federal roberto jefferson, do partido que atende pela sigla PTB, resistiu à prisão decretada por desacatar a ministra do TSE, Carmen Lúcia em vídeo, o nome desta nefasta criatura veio novamente à tona.
Ele já tem uma folha corrida bem extensa, mas, para quem não lembra, foi ele que desencadeou o que se chamou de Petrolão, no meio da década de 2000, ligando o então Presidente Lula a um escândalo de corrupção gigantesco, porém, ínfimo se comparado ao atual orçamento secreto, mantido pelo ocupante da presidência e pelo Congresso Nacional. Após este episódio dantesco, que teve direito a dois policiais federais feridos por disparos de jefferson, que também arremessou duas granadas em direção aos carros da PF, e participação do inacreditável padre kelmon, o ex-deputado encontra-se preso e já foi indiciado em quatro processos pela PF. Em tempo: bob jeff, como ficou conhecido, já está sob prisão domiciliar, violada diversas vezes, culminando com o tiroteio de ontem. Pois vendo um vídeo do canal Galãs Feios sobre o assunto, vejo que os apresentadores Helder Maldonado e Marco Bezzi mencionaram a existência de um … DISCO DO ROBERTO JEFFERSON, o qual eu desconhecia completamente.
Como vocês sabem, já fiz uma resenha de um álbum do … roberto justus no passado, e pensei que não poderia ir mais fundo, porém … eu fui. O artefato que jeff e outros algozes da música registraram chama-se “On The Road”, com uma capa na qual o ex-deputado aparece em cima de uma motoca, como se estivesse numa dessas motociatas que se tornaram moda entre o público da terceira idade no país. Olhando o tracklist, nos deparamos com um who’s who do que há de mais brega e surrado do cancioneiro pop velhusco internacional, de “My Way” a “She”, de “Fly Me To The Moon” a “Perhaps Love”, não sobrando misericórdia nem para “Summertime” ou “Unforgettable”, tudo foi atirado numa vala comum em que o instrumental investe no padrão “churrascaria de festa baile” para que jeff meta sua voz inacreditável e profane com mau gosto e uma pronúncia de inglês que faz Joel Santana
parecer Winston Churchill.
É um dos desfiles de mau gosto mais intensos e incríveis que eu já pude testemunhar. Perto dele, “Just Between Us”, a incursão cafoníssima de roberto justus no mesmo universo, é um “Sgt Pepper’s”, um “Pet Sounds”.
A crise no Brasil é de todos os níveis, incluindo aí a estética. Este disco é um motivo de vergonha para qualquer pessoa que tenha se envolvido na sua produção, inclusive para a Tratore, batalhadora empresa brasileira de CDs que assina seu nome na distribuição. Em tempo: o álbum foi gravado em 2011, justo na transição do governo Lula para o primeiro mandato de Dilma Rousseff, mostrando que era possível até para uma criatura deste naipe gravar e lançar um CD.
Afastem-se deste artefato. Ou ouçam. A vida é de cada um.
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.