Ciência e batuque contra o novo coronavírus

 

 

Marisa Ribeiro transita entre dois mundos: o do batuque e o dos vírus e bactérias. Formada em Ciências Biológicas pela Universidade Gama Filho e tamborim do Desliga da Justiça, ela é um exemplo de pessoas que atuam em áreas da Ciência, ou da Saúde, e também na batucada.

 

“Desde o início da graduação me interessei pelo mundo dos vírus e das bactérias, ou seja, tudo que não dá pra ver, mas que a gente sabe que existe”, diz Marisa, Mestre em Biologia Molecular na Fundação Oswaldo Cruz. Hoje, trabalha na Fiocruz com desenvolvimento de diagnóstico molecular, de acordo com as emergências sanitárias do país e as demandas do Ministério da Saúde. “Estão no nosso radar os vírus Dengue, Zika, Chikungunya, Febre Amarela, Coronavírus e o que mais vier”, explica.

 

Já o início nos blocos foi por acaso. “Vi um anúncio no jornal sobre uma aula experimental de percussão que aconteceria no Circo Voador, na Lapa, aqui no Rio de Janeiro. Fui por curiosidade e porque precisava urgentemente de um passatempo. Já tinha um instrumento na cabeça: o tamborim. Fiz a primeira aula da oficina do Bloco Quizomba e me apaixonei. Isso foi em 2007, quando tudo começou. Nossa, quanto tempo! Esperava ansiosamente pelas quartas-feiras, dia do ensaio semanal… A batucada me deu amigos pra vida! E nunca troquei de instrumento. Tenho paixão incondicional pelo meu tambura. No coração tem espaço para o surdo de terceira, mas ainda é só um flerte”, brinca. No Carnaval deste ano do Desliga da Justiça, Marisa apresentou-se de Okoye, guerreira de Wakanda, personagem dos quadrinhos do universo Marvel e do filme Pantera Negra (a foto que ilustra esse texto, tirada por PH de Noronha, é do dia do desfile).

 

E como se dividem o coração e a cabeça de uma bióloga e batuqueira neste período de combate ao novo coronavírus? “A batuqueira quer festa, estar com os amigos, abraçar, brindar. Quem batuca gosta de aglomerar né… Mas a bióloga sabe que isso não é possível agora. Realmente estamos vivendo tempos difíceis. Todo o conhecimento que temos sobre o novo coronavírus é muito recente. Estamos aprendendo em tempo real enquanto a pandemia ocorre. O que sabemos é suficiente pra afirmarmos que o isolamento social é importantíssimo para diminuirmos a proliferação desse vírus. Essa pandemia vai passar. A ciência vai vencer essa batalha e logo estaremos todos juntos e aglomerados, batucando novamente!”, afirma Marisa.

 

A rotina mudou completamente desde o início do período de combate à Covid-19. “Durante a semana minha vida se resume a casa-trabalho-casa. Como preciso me locomover diariamente até o meu trabalho, tenho como hábitos a utilização de máscara, luvas e muito álcool em gel”, contextualiza. Para ela, o isolamento social é duro, mas necessário. “É a única maneira de preservarmos quem amamos”, aponta.

 

Nas horas vagas, muitas reuniões pelo Zoom (plataforma de videoconferências) e chamadas de vídeo pelos aplicativos WhatsApp e Instagram para matar saudades de amigos e familiares. E muitas dessas chamadas são feitas com uma taça de vinho ao lado, afinal ninguém é de ferro! “O isolamento social também tem servido para adquirir novos hábitos e retomar outros, como ler aquele livro para o qual nunca tive tempo, e para construir muitos planos pra quando tudo isso passar”, diz.

 

Por outro lado, a saudade dos ensaios é grande. “O ensaio é momento de alegria e de diversão, proporciona risadas e abraços! Mas confesso: não tenho tocado meu tamborim. Não por falta de vontade, é que, atualmente, a bióloga está ocupando todo o tempo, quase não sobrando espaço para a batuqueira. Digamos que o tamborim entrou em quarentena, daqui a pouco ele volta”, explica.

 

Aliás, tubos de ensaio e tamborim tem tudo a ver. “Ambos são desafiadores. Você tem que ter muita determinação e disciplina para lidar com os dois. São muitos experimentos para tocar o desenho certo de um samba e para chegar ao final de uma pesquisa. Eu nunca tinha parado para pensar como o tamborim e os tubos de ensaio possuem tanta afinidade!”, fala Marisa, surpreendida com pergunta do colunista que vos escreve.

 

Por fim, a esperança incondicional. Seja da pesquisadora ou da ritmista. “Logo estaremos batucando novamente. Ainda não dá para saber ao certo, porém, olhando para o avanço da pandemia em outros locais do mundo, acredito que em quatro ou cinco meses estaremos juntos, tocando por aí. Não vejo a hora!”, pontua. “É muito importante mantermos todas as medidas que aprendemos até agora com os países que estão passando por momentos difíceis devido à pandemia: lavagem constante das mãos, uso de álcool em gel, máscara, isolamento social. E muito pensamento positivo, porque vai passar”, torce Marisa.

 

E nós do Célula Pop torcemos juntos, desejando saúde e coragem a todos os profissionais como Marisa que, mesmo próximos dos riscos da pandemia, trabalham em prol da coletividade e mantêm a esperança na cadência certa, no ritmo de um amanhã melhor para todos.

 

Até a próxima!

Celso Chagas

Celso Chagas é jornalista, compositor, fundador e vocalista do bloco carioca Desliga da Justiça, onde encarna, ha dez anos, o Coringa. Cria de Madureira, subúrbio carioca, influenciado pelo rock e pela black music, foi desaguar na folia de rua. Fã de poesia concreta e literatura marginal, é autor do EP Coração Vermelho, disponível nas plataformas digitais.

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