A psicodelia praiana da Pluma

 

 

Não tem trocadilho no título, gente. Pluma é o nome de um quarteto paulista que acabou de capturar minha manhã, a partir de dica contrabandeada por nossa conexão gaúcha, comandada por Ariana de Oliveira. Ela me manda no whatsapp – “conhece a Pluma?” e eu, às voltas com mil coisas, digo que não após nem ler a pergunta direito. Ela me manda o link para “Leve”, no Youtube. Nos primeiros instantes a canção me pega de jeito. Teclados, uma paisagem que traz um tanto de som carioca à beira-mar, no sentido Marcos Valle ou algo assim, sessentista, bossa-novista relido. Um troço que embaralha minhas referências de tempo e espaço. Vejam, com o passar dos anos, esse tipo de desbunde musical vai ficando raro para o cri-crítico musical. Daí minha surpresa e necessidade imediata de ouvir e conhecer mais dessa gente.

 

Há três singles no Spotify: “Leve”, “Esquinas” e “Mais do que eu sei falar”, todas correlatas a partir dessa vontade/êxito de recriar umas paisagens psicodélicas não tão coloridas assim. Tem algo de Tame Impala no jeito que Diego Vargas pilota seu teclado, mas “Leve” só me traz a imagem de uma Praia de Copacabana ideal, misturada com o clima de “As Praias Desertas”, de Tom Jobim, cantada por Elizeth Cardoso no mítico LP “Canção do Amor Demais”, lá em 1958. Pode ser exagero, certo? Mas não é. Logo em seguida eu pulo para “Mais do que eu seu falar” e me deparo com um piano que acompanha tudo e já começa com um fraseado de quem entende do assunto. Diego, novamente. E a voz que vem, assim como na canção anterior, é de Marina Reis. Há um inquívoco sotaque 011 em seu jeito de cantar, mas é tudo muito solar, de alguma forma guanabaresco e carregado de reflexos inversos e reversos daquele tempo que já passou mas que ressurge sem nostalgia nessas canções.

 

E “Esquinas”, gente, é segundo eles mesmos, “inspirada em ‘Clube da Esquina'” e, sim, ele está presente. Diego canta, Marina também e a melodia tem algo de “O Trem Azul”, mas é só impressão. E não é só isso: tem jeito de passeio sob o sol da tarde, num dia de primavera ou algo assim. Teimam em vir à mente apenas essas imagens desta natureza viva, de reminiscência do que não aconteceu totalmente, daí fico divagando devagar. E a produção? Tudo muito bem feito, bem cuidado, tem até espaço para cordas e efeitos eletrônicos muito sutis. Lembra o trio Ivy, que era projeto paralelo de Adam Schlesinger, morto este ano, vocalista do Fountains Of Wayne. Lembra outras várias coisas boas.

 

Plumas está aí, nem digo que está pronto, mas já passou da hora de todo mundo conhecer e amar. Não há outra escolha para um som tão gentil e acolhedor. É música surpreendente para um país tão embrutecido como o nosso. Talvez por isso me venham paisagens de outros tempos, mas não. Essa gente – além de Diego e Marina, temos Guilherme Cunha e Lucas Teixeira a bordo – é de hoje. Curtem, além das referências nacionais, o BADBADNOTGOOD e o Khruangbin, dois grupos muito atuais, que fazem música de agora com o pé e os olhos nas melhores influências passadas. Pluma chegou e a gente só faz agradecer. Que venha muito, muito mais deles.

 

 

Colaborou: Ariana de Oliveira

Foto: Amanda Oliveira

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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