Volta o punk rock solene do Gaslight Anthem

 

 

 

 

The Gaslight Anthem – History Books
40′, 10 faixas
(Rich Mahogany)

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

Ainda que o título desta resenha fale em “punk rock”, o termo não mais é totalmente preciso para definir a sonoridade do Gaslight Anthem. Tudo bem, os sujeitos começaram fazendo algo bem próximo disso, lá em 2006, mas, mesmo naquele tempo, sua sonoridade incorporava muito de rock clássico, especialmente de gente como Rolling Stones, Van Morrison, Tom Petty e Bruce Springsteen. Hoje, dezessete anos depois disso e encerrando um hiato iniciado em 2014, o que o grupo de New Brunswick, New Jersey, faz mesmo é classic rock americano. Brian Fallon, o homem por trás das letras e conceito do grupo, é um discípulo aplicado das histórias e ensinamentos do Boss e isso se reflete mais do que nunca neste ótimo “History Books”, cuja faixa-título tem participação de Bruce em pessoa. O fato é que o Gaslight tem uma pegada de rock esclarecido, com canções que fazem reflexões sérias sobre a existência, o amor e tudo o que pode acontecer dentro desses dois temas centrais, caso não haja correspondência, compartilhamento e vivência. É uma banda séria, “solene”, como também diz o título. E muito boa.

 

Este hiato mencionado acima, se deu, especialmente, em relação a discos de inéditas. O grupo fez turnê em 2018, promovendo os dez anos de seu álbum “The 59′ Sound” e até lançou um disco de sobras das sessões de gravação. Além disso, Brian Fallon iniciou uma carreira solo prolífica, que já conta com quatro álbuns lançados entre 2016 e 2021, o que significa que a banda se reagrupou agora por motivos muito específicos. Entre eles, a noção de que tudo acaba. Por mais que isso seja clichê e meio emocional demais, ao tomar conhecimento da morte de Taylor Hawkins, baterista do Foo Fighters, Brian se deu conta de que poderia estar perdendo tempo precioso com sua banda. Como estava voltado para sua carreira solo, ele se obrigou a escrever canções que tivessem a marca da banda e, após criar quatro novas composições, entrou em contato com os outros integrantes. Após ajustes aqui e ali, o Gaslight Anthem retomou suas atividades gradativamente, começando pelo lançamento desta nova produção em formato de EP nas plataformas de streaming. Entre elas, duas pequenas gemas: “Positive Charge” e “History Books”, que contava, veja você, com vocais do muso inspirador maior: Bruce Springsteen. Daí para um novo disco, foi um pulo.

 

Com o grupo novamente em turnê desde o ano passado, Fallon e os outros integrantes partiram para a composição de mais canções e, com dez faixas finalizadas – contando com as quatro iniciais – o grupo preparou este bom “History Books”, que chega agora aos serviços de streaming. É o disco mais maduro do Gaslight Anthem, ainda que isso signifique, muitas vezes, conter o ímpeto de tempos atrás e colocar mais emoção em canções mais contemplativas. Quando isso acontece, o trabalho dos sujeitos perde um pouco do brilho, mas jamais chega a comprometer, visto que Fallon é um dos grandes letristas do rock atual. Os outros músicos – Alex Rosamillia (guitarra), Benny Horowitz (bateria) e Alex Levine (baixo) – fornecem uma massaroca sonora entre o que Tom Petty e Bruce Springsteen fariam se iniciassem suas carreiras nos anos 1990, ou seja, um rock de guitarras muscular e com pouco espaço para solos e repetições. É tudo direto e reto e, com o tempo – como neste álbum – com bastante sentimento envolvido.

 

Fallon e sua turma são caras normais, vindos de famílias que se constituíram ao som de suas influências musicais, especialmente Springsteen. Logo, suas canções refletem os valores de trabalho, honestidade e dedicação, mantras que o próprio Boss desfilou por toda a sua carreira. Sendo assim, “Spider Bites”, a faixa-título, “Autumn” e, especialmente, “The Positive Charge”, são pequenos hinos sobre valorizar os bons atos e posturas diante da vida. Quando Fallon reencontra sua veia romântica, o efeito também é muito bacana, caso específico de “I Live In The Room Above Her”, uma rara canção que mistura riffs pesados de guitarra, andamento noventista pós-grunge e uma letra que fala sobre uma visão feminina que surge na janela, algo sutil como uma intuição, talvez uma inspiração, mas que coloca em risco o relacionamento, digamos, oficial, que o narrador da história tem.

 

“History Books”, o disco, é um ótimo álbum de retorno. Gaslight Anthem é dessas raras bandas que assumem sua origem clássica e capitaliza em cima delas, usando-as como crédito e espaço para criar. O resultado, que já era bom, se manteve e amadureceu com o tempo. Ouça, conheça, ache bacana.

 

Ouça primeiro: “The Positive Charge”, “Spider Bites”, “History Books”, “I Live In The Room Above Her”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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