Van Morrison – Three Chords And The Truth
Gênero: Rock, jazz, blues
Duração: 67 minutos
Faixas: 14
Produção: Van Morrison
Gravadora: Exile
O que você tem feito de 2015 pra cá? Eu, por exemplo, tenho cursado o doutorado de História na UFF e tentado sobreviver como jornalista e historiados, algo nada fácil. Van Morrison, por sua vez, lançou sete discos, se contarmos com este lindo “Three Chords And The Truth”. Talvez ele seja o artista mais prolífico de sua geração e tal fase não significa diluição de sua mistura mágica de rock, jazz, blues e soul, algo que ele faz com maestria e identidade desde os anos 1970. Claro, seu início de carreira na Irlanda do Norte dos anos 1960, como vocalista do Them, seus primeiros – e mágicos – discos, ainda naquela década, tudo isso faz parte da história da música popular. O fato é que Van encontrou uma fórmula que vem mantendo há muito tempo, sempre com mais êxito que fracasso. Nos últimos tempos, ele, simplesmente, não consegue não lançar discos. A gente agradece.
“Three Chords…” não difere muito do que ele vem entregando, pelo menos, desde o início dos anos 2000: discos com produção imaculada – a seu encargo – com uma banda afiadíssima no estúdio – que o acompanha ao vivo – e um ramalhete de canções, que podem ser covers ou próprias, sempre falando sobre este imaginário mítico do rock, da vida, do passar do tempo e expressando um ponto de vista que foi ficando mais legal à medida que Van envelheceu e se tornou um senhor meio ranzinza, estiloso, provavelmente difícil de se lidar, como o são todos os gênios. Neste novíssimo disco não está nenhuma canção que vai se juntar ao seu panteão de clássicos, mas são faixas corretíssimas, belíssimas e que, de vez em quando, revelam sua excelência. Para muitos, um disco de Van Morrison é uma passagem para um mundo mais gentil e lento, o que é bom.
Dessa vez, em meio ao desfile de elegância musical, há uma novidade interessante: o dueto com Bill Medley, um dos Righteous Brothers, em “Fame Will Eat The Soul”, numa crítica à fama massiva de hoje em dia e como manter-se íntegro diante dela. A canção é belíssima, o arranjo mostra o melhor dos dois cantores e só mostra o quanto Van, apesar de discreto e introspectivo, é um atento cronista da vida à sua volta. E seus temas recorrentes estão presentes com novos e gloriosos capítulos. “Dark Night Of The Soul”, por exemplo, é uma lindeza crescente, sobre espiritualidade, religiosidade e tudo aquilo que Van explora há décadas, contrastando sua hipotética ranzinzice com elevação da alma. “In Search Of Grace” também vai por aí, só que com arranjo mais soul e gentil.
Os híbridos vanmorrissonianos são sempre belos. “Nobody In Change” mistura country e soul numa levada gentil e feliz; “Read Between The Lines” é um r&b sessentista tardio, cheio de suíngue e simpatia; “Does Love Conquer All?” é balada soul de FM setentista, com pujança e propriedade, “Early Days” é country-rock endiabrado, porém contido, trazendo outro tema recorrente no cânon do homem: a saudade e reverência pelos primeiros dias do rock’n’roll. A passagem do tempo também está presente, seja na balada derramada “If We Wait For Mountains”, seja na cadenciada “Bags Under My Eyes”. A faixa-título exalta a verdade da country music e, como não podia deixar de ser, “Days Gone By” é o épico que encerra os trabalhos, bela, forte, porém sem perder a ternura.
Van Morrison segue sua trajetória, gravando, produzindo, fazendo shows lotados pela Europa e Estados Unidos e reforçando a tinta com a qual seu nome está escrito na história da música popular planetária.
Ouça primeiro: “Dark Night Of The Soul”
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.