The Who com fôlego para bom álbum ao vivo

 

 

 

 

The Who With Orchestra – Live At Wembley
105′, 20 faixas
(Universal)

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

O The Who é uma das cinco bandas de rock mais importantes da História. Ajudou a formatar o estilo nos anos 1960, gravou álbuns que se tornaram clássicos, viveu várias fases ao longo de quase sessenta anos de carreira. Perdeu o baterista original há 45 anos e o baixista há 21, mas segue em frente com a dupla Roger Daltrey e Pete Townshend que, aos trancos e barrancos, muitas vezes na base da porrada, mantém a lenda viva. Com apenas três álbuns de canções inéditas lançados desde 1982 e um sem-número de registros ao vivo neste espaço de tempo, a banda permanece. A encarnação mais recente, na forma de dupla, está em turnê constante. Já reviu o clássico disco duplo/ópera rock “Quadrophenia” recentemente e executa atualmente a “The Who Hits Back Tour” passeia por Estados Unidos e Europa com constância. No dia 28 de agosto desde ano, ao lado de Richard Ashcroft e do grupo Lightning Seeds, o The Who se apresenta com a Royal Philarmonic Orchestra, em Sandringham. No meio desse contexto de excursões constantes, em junho de 2019, Daltrey, Townshend e a excepcional banda que eles montaram para a estrada, subiram ao palco do Estádio de Wembley com uma orquestra de cinquenta integrantes. E este show chega ao público agora em vários formatos.

 

 

Roger Daltrey e Pete Townshend mostram disposição e criatividade em apresentação com orquestra no mitológico estádio de Wembley, mas foi essa banda de apoio que sustentou o set que o Who mostrou. Com as guitarras de Simon Townshend (irmão mais novo de Pete), a bateria superlativa de Zack Starkey (filho de Ringo Starr e afilhado de Keith Moon, o falecido baterista original da banda), Randy Landau, Emily Marshall, Audrey Snyder, Katie Jacoby, Keith Levenson, Billy Nicholls e o baixista Jon Button, o grupo que sobe ao palco para secundar Roger e Pete é mais competente e encorpado do que qualquer formação prévia do The Who e consegue executar com precisão matemática qualquer canção do repertório prévio da banda. Se isso é um trunfo em dias em que a tecnologia parece sobrepujar quase tudo, pode, porém, significar uma certa uniformização sonora, limando imperfeições eventuais – as quais sempre vieram somar detalhes nos álbuns ao vivo do Who.

 

 

O fato é que, beirando os oitenta anos, a dupla remanescente da banda ainda tem lenha para queimar. Este álbum com orquestra poderia ter inspiração em “Unledded”, o disco que Jimmy Page e Robert Plant lançaram em 1994, reinterpretando canções do Led Zeppelin. A proporção e a circunstância são quase as mesmas, mas o registro do Who é mais linear e devedor do que a banda vem fazendo há muito tempo. Como atrativo, oferece a chance de, não só documentar a performance dos quase octogenários, como disponibilizar versões ao vivo de canções recentes, no caso, “Tea And Teatre” (de “Endless Wire”, de 2006), “Ball and Chain” e “Hero Ground Zero”, estas duas últimas, faixa do mais recente álbum de inéditas do Who, lançado em 2019, homônimo. Fora isso, é o bom e velho repertório sendo entoado, mas com escolhas interessantes, que evitaram hits muito óbvios, que a banda deve acreditar já terem sido esgotados para esse tipo de registro.

 

 

Sendo assim, o Who brilha com versões particularmente bacanas de “Eminence Front”, “Who Are You” e “Baba O’Riley”. Se mete num set acústico não-bundão em que solta leituras bacanas de “Substitute”, “The Seeker”, “Behind Blue Eyes” e “Won’t Get Fooled Again”. Além delas, um mini-medley que revisita “Quadrophenia”, com “The Real Me”, “I’m One”, “The Punk And The Godfather”, “5:15”, “Drowned” e “The Rock”, sem falar no resgate simpático de “Imagine A Man”, do ótimo “The Who By Numbers”. Tudo isso com Daltrey e Townshend em ótima forma vocal e instrumental, se comunicando com a plateia e contando histórias bacanas, como a já conhecida inspiração para “Won’t Get Fooled Again”, a canção anti-hippie do Who, ambígua, mas compreensível em seu tempo.

 

 

Ver uma dessas formações histórias do rock em atividade é sempre um privilégio. No caso do Who, a banda consegue driblar qualquer tipo de crítica e faz desse álbum um importante documento da trajetória de artistas que se recusam a sair de cena enquanto conseguem subir no palco.

 

Ouça primeiro: “Eminence Front”, “Baba O’Riley”, “Substitute”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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