Novo álbum confirma a majestade de L’Imperatrice

 

 

L’Imperatrice – Tako Tsubo

Gênero: Eletrônico

Duração: 48 min.
Faixas: 13
Produção:
Gravadora: miroqlima

 

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

A primeira vez que ouvi algo do grupo parisiense L’Imperatrice, foi lá em 2017, quando a impressionantemente bela “Sonate Pacifique” chegou aos meus ouvidos por sugestão do algoritmo do Spotify. Por essas e outras, enquanto muita gente fala mal dele, eu vou agradecendo. A banda francesa é uma das mais legais em atividade no mundo já há algum tempo e soa, mais ou menos, como uma mistura bem dosada entre uma modalidade mais orgânica do Stereolab com o Daft Punk em seu modo mais exploratório. Além dessas duas referências, o grupo tem algo que é indispensável para toda e qualquer criatura sonora: sabe como poucos escrever boas canções. Nada que o L’Imperatrice grava ou produz soa “esquisito”. As músicas têm charme, melodia, referência… é como se fosse possível voltar para a encruzilhada entre os anos 1960/70, sabendo que houve Disco Music e meter várias variáveis naquele pop espacial que se fazia na época. É um adorável paradoxo sonoro e “Tako Tsubo” é o mais novo capítulo dessa saga.

 

 

O grupo é formado por Flore Benguigui, Charles de Boisseguin, Tom Daveau, David Gaugué, Hagni Gwon e Achille Trocellier. A ideia deles é partir dessa mistureba temporal mencionada acima e adicionar o ponto de vista personalíssimo que uma banda francesa tem. E isso tem a ver, não só com a graça de Flore nos vocais, como na própria visão que eles têm desses ritmos e estilos construídos nos Estados Unidos, principalmente a Disco Music. Ainda que ele surja na música do sexteto como uma referência, a perspectiva é muito distinta e adiciona charme e uma pitada de exotismo no que o grupo faz. Mas, para meus olhos e ouvidos de historiador/jornalista, o grande lance do L’Imperatrice é a apropriação desses símbolos de um futuro que não aconteceu. De um projeto de modernidade que não se concretizou. Carros voadores, colônias na Lua, o ápice do sonho do pós-guerra que nunca aconteceu.

 

 

Sendo assim, a música que o grupo oferece soa como um aceno de uma realidade paralela, no melhor estilo Phillip K Dick em “O Homem do Castelo Alto”, e tudo soa tão real e autoral que a gente se pergunta para onde foram estes tempos idos nunca realizados. Certamente essa camada de sentido turbina a música produzida pelos sujeitos, o que amplifica o prazer em ouvir e buscar referências futuristas no presente, colocadas como quem olhasse para o passado. Parece complicado, mas uma audição dedicada fará você, não só compreender o rocambole temporal, como embarcar nele sem desejo de voltar. E, antes que eu me esqueça: “Take Tsubo”, é o nome de uma doença cardíaca que tem o apelido de “síndrome do coração partido”. Metáforas, temos.

 

Flore equilibra seu registro entre o sexy, o atrevido e o doce. Os rapazes, fornecem invólucros funky-disco-soul na medida certa, sempre tendo em mente a possibilidade de remixes e amplificações. É tanta faixa bacana que fica difícil destacar. Mas tem “Anomalie Bleue”, que abre o álbum com um teclado tristonho, que evolui para todos os instrumentos, com uma batida seca de bateria eletrônica, como se fosse Judy Jetson. Depois tem a batida funky em teores ultra-light de “Fou”, emendando com o techno gentil e com teclados vintage de “Hématome”. Daí, a partir destas três faixas, o álbum vai por conta própria, ditando o ritmo. “Submarine” começa mais calminha e evolui para uma contida e elegante festança neodisco, com toques até de Swing Out Sister. “Peur Des Filles” é cheia de efeitos mais dramáticos, que evocam algo que Frankie Valli colocou na faixa-título de “Grease”. “Voodoo?”, com sua batida seca e vocais no limite da resistência apaixonada, sintetiza tudo por aqui.

 

“Take Tsubo” é o melhor disco de L’Imperatrice, o mais bem resolvido instrumento de ida e vinda no tempo, via música. É um arraso, uma prova de genialidade dessa banda tão legal. Ouça sem qualquer comedimento.

 

Ouça primeiro: “Fou”, “Voodoo?”, “Submarine”,

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

3 thoughts on “Novo álbum confirma a majestade de L’Imperatrice

  • 2 de setembro de 2021 em 09:33
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    Resenha muito boa, perfeita essa analogia do “futuro que o passado projetava mas que nunca aconteceu”! Caí no tako tsubo pelo algoritmo do youtube e fiquei impressionado com a qualidade do grupo assim como tbm impressionou a baixa repercussão deles, ao menos perante a mídia brasileira.

    Mereciam mais reconhecimento, tudo bem que não são nada disruptivos, mas quem tem sido em 2021? Eles tem referencias musicais muito claras e conseguem deixar uma impressão muito própria do grupo em cima dessa mistureba pop que é usada como base.

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  • 31 de março de 2021 em 13:28
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    Muito bem observado! Descobri L’impératrice recentemente também por conta do algoritmo do Spotify, e inclusive, muito obrigado, Spotify, já sou mais um fã da banda. É de se encantar a autenticidade do grupo e essa miscelânia de estilo que eles conseguem fazer, tudo com muito charme pelo toque francês, harmonia e sonoridade impecável.

    Ótima resenha, vou acompanhar mais o blog

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    • 31 de março de 2021 em 14:09
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      Sim, o grupo é sensacional! Obrigado pelo carinho!

      Resposta

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