New Order e o nosso Natal

 

 

 

1988

 

O Natal chegou.

 

Meu pai faz aniversário no dia 24 de dezembro e naquele tempo meus primos eram solteiros e nossas comemorações barulhentas, com direito a Papai Noel bêbado e o aniversariante vestido num “Reginaldo Rossi style.”

 

Não fui uma criança com muitos brinquedos;  tive apenas uma Barbie (que me deixou empolgada por uma semana) e quando conto que nunca ganhei um Lego, algumas pessoas me olham como se eu já tivesse nascido com 38 anos. O mais engraçado é que, se você me perguntar o que eu ganhei no Natal dos meus sete anos, eu não saberia te dizer. Mas lembro exatamente o presente de um dos meus irmãos.

 

Eles costumavam juntar moedas para comprar seus vinis  e um disco foi o pedido do Alexandre, o mais velho. E lá fomos nós, eu e meus pais para uma loja de departamentos, o cúmulo da modernidade, fazer um Natal mais feliz e comprar o presente do Alê.

 

No meu saudosismo controlado, confesso: acho que nenhum formato moderno substituiu o fascínio do vinil .A expectativa ao comprar aquele que era o nosso objeto de desejo, os chiados entre as faixas e a briga para encontrar um papel de presente que pudesse embrulhá-lo é coisa que nenhum Spotify pode nos dar. Os tempos se modernizam, mas a saudade dos velhinhos fica.

 

Meu pai não colocou o presente embaixo da árvore e resolveu deixá-lo no porta malas do carro. E quando eu estava na garagem com meus primos menores, tentando fugir de um dos mais velhos que tentava nos assustar com uma carcaça de peru, meu irmão desceu as escadas dizendo que ia pegar algo no carro .Comecei a rir, tentando não estragar a surpresa, que em sua capa branca colocou um grande sorriso no rosto do Alê. Agitando o presente em suas mãos ele gritava:

 

– Valeu, Birro Kid !! (o apelido do nosso pai)

 

O pedido do meu querido irmão foi um discos essenciais e clássico: O “Substance”, do New Order, que nos anos seguintes não me permitiu ser contagiada pela febre New Kids on the block (é, realmente fui uma criança metida a diferentona.). Eu era muito mais “Ceremony” do que “Step by Step.”

 

Escrevi esse texto na época do Lollapalooza de 2014, inspirada pelo relato de uma ex-aluna que assistiu ao show do New Order. Essa semana o encontrei perdido na minha timeline e pensei em mandar para o CEL como um jeito de deixar esse período terrível um pouco mais leve. Procrastinei até ele dividir com a gente sua playlist maravilhosa “Tijuca, início dos 1990´s” e me transportar para uma época pela qual eu sou grata sem cair na tentação de parecer uma tiazinha triste porque o tempo passou:

 

A década que moldou muito do meu gosto musical e tornou nosso Natal de 1988 inesquecível. Sem me comprar nada, meu irmão me deu de presente algo mais valioso, uma daquelas heranças emocionais que fazem as nossas memórias valerem a pena. E de quebra uma paixão incurável por “Blue Monday”.

 

 

 

Aqui está a playlist.

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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