Lloyd Cole, melhor que Morrissey

 

Fiquei sabendo dia desses que Lloyd Cole está para lançar novo disco. Dia 26 de julho, chega às plataformas digitais e às prateleiras dos lugares mais afortunados, “Guesswork”, um álbum com oito canções e com uma guinada “eletrônica”. Cole e sua banda mergulharam naquele approach elegante dos anos 1980/90 via sintetizadores, falando de amor e existência, como Lloyd costuma faz há, caramba, quase 40 anos. Já há duas canções disponíveis nos streamings da vida: “Night Sweats” e “Violins”. As faixas foram gravadas no estúdio caseiro do sujeito, em Massachussets, e mixadas em Dusseldorf, na Alemanha. Ao lado dele, Neil Clark e Blair Cowan, dois colaboradores seminais, além de Fred Maher, que já tocou com muita gente, inclusive com Lou Reed. No fim do texto eu posto o link pra ouvi-las e já aviso que a resenha do álbum está garantida aqui na Célula.

 

Pra quem não sabe, o homem é um destes poetas angustiados dos anos 1980, que toparam engrossar as fileiras do pós-punk como veículo para expressar sua angústia diante do mundo. Aos 23 anos, em pleno 1984, Cole estava à frente do grupo The Commotions e lançou um dos álbuns mais sensacionais daquela década, “Rattlesnakes”, que continha singles sensacionais como “Perfect Skin” e um verdadeiro hino dos que sabiam que o mundo era muito mais do que ser yuppie especulando no mercado financeiro anglo-americano: “Are ou Ready To Be Heartbroken”. O grupo durou pouco – assim como The Smiths – e Cole, assim como Morrissey, logo embarcou numa carreira solo elegantíssima, da qual, infelizmente, poucos ouviram falar. Ao todo são 14 discos, sendo nove em carreira solo e duas colaborações com The Negatives e outro com o alemão vanguardista Joachim Roedelius.

 

A comparação com Morrissey é uma óbvia provocação, especialmente por conta do posicionamento político assumido por este nos últimos tempos. Aqui na Célula Pop a gente não acha legal a defesa de preconceitos e a propagação da intolerância sob qualquer aspecto, vinda de qualquer pessoa. Quando você tem o poder de influenciar pessoas e despertar paixões, como Morrissey, esta postura nossa fica ainda mais acirrada. Se você não concorda, fique na boa, a gente respeita sua opinião. Apesar da provocação, Cole e Morrissey são, de fato, contemporâneos e disputaram a atenção/preferência da imprensa inglesa – e do público – no inicio da carreira de suas bandas. É certo consenso a percepção de que os Commotions eram maiores que os Smiths em 1984. Mas que o grupo de Morrissey e Marr ultrapassou Cole e sua turma já no lançamento do segundo disco, “Meat Is Murder”, em 1985. E com a hiperatividade na composição e lançamento de singles e novos discos, se tornaram uma das mais prolíficas bandas dos anos 1980. Cole e companhia eram mais low profile, não estavam totalmente preparados para a fama e a idolatria. Deu no que deu.

 

O fato é que a carreira solo de Lloyd Cole é elegantíssima e esconde discos maravilhosos. O sujeito é um poeta laureado, excelente cantor e tem um enorme bom gosto para escolher colabores e arranjadores para suas canções. Basta uma olhadela em “Baby”, composta em 1996, para o disco “Love Story”. O arranjo de cordas, teclados e a beleza da melodia são da mais alta qualidade. E o versos: “winding my hair, I can be everywhere” ou “Baby, I can’t live without you, since I don’t have a place to call my own”. O homem é um romântico incurável. Mas sua atitude é positiva, digamos. Aliás, Cole já se manifestou sobre a eventual comparação com Morrissey dizendo, em entrevista concedida em 1999, que “Morrissey era um cara contrário a tudo e todos. Eu sempre fui mais positivo, logo, a imprensa – sempre atrás de notícias e vendas – o via como uma pessoa mais interessante”. Faz sentido.

 

 

Temos então a expectativa de mais um disco de Cole, elegante, reservado, vivendo na Costa Leste americana, fazendo shows esporádicos para fãs fiéis. E temos Morrissey nas luzes dos palcos, claudicando em posicionamentos lastimáveis. Cole pode nunca ter sido o “inglês mais importante que já viveu” – título dado a Moz pela … imprensa britânica nos anos 1980 – mas segue vivendo em coerência com o que sempre fez: bela e sensível música. Mas, dirá você – com certa razão – o que é a coerência hoje em dia? Eu vou te aconselhar: ouça Lloyd Cole, jovem. Esperando por “Guessbook” ansiosamente.

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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