Tuxedo: Atrás do funk elétrico só não vai quem já morreu
Tuxedo – Tuxedo IV
33′, 11 faixas
(Stem)
Rick James, Cameo, Zapp, Parliament/Funkadelic, Prince. Esses e outros artistas foram mestres absolutos na criação de uma variação do funk que se caracterizava pelo uso maciço de sintetizadores, baterias eletrônicas, efeitos de voz, entre outros elementos tecnológicos da virada dos anos 1970/80. Esta sonoridade adentrou os anos 1980 com força e se instalou como uma espécie de padrão para muitas produções. Ouça, por exemplo, a faixa “1999”, de Prince. Ou “More Bounce To The Ounce”, do Zapp. Ou então “Give It To Me”, de Rick James. Todas elas juntaram esses timbres e mudanças estéticas, além de fazer muito sucesso nas paradas e alavancar as carreiras de seus criadores quase no mesmo momento. Ao longo do tempo, o eletrofunk foi deixado de lado, especialmente quando o hip hop surgiu como força criativa, cerca de dez anos depois. Mesmo que os parâmetros tenham mudado, alguns herdeiros se mantiveram ativos e influenciados pelos timbres robóticos e sensacionais, caso do duo canadense Chromeo, o superstar Bruno Mars (ouça o sucesso mundial “Uptown Funk” e entenda exatamente o que queremos dizer) e Mayer Hawthorne, que andava sumido nos últimos anos mas, na verdade, vinha integrando esta dupla bacaninha chamada Tuxedo. junto com o rapper e produtor Jake One. Desde 2015, estes dois se dedicam a recriar climas e sonoridades que gravitam neste universo do eletrofunk. Agora chegaram ao quarto trabalho, que segue a lógica utilizada pelo Zapp para nomear seus lançamentos: o nome da banda e o algarismo correspondente, em romano. Sendo assim, temos o bom “Tuxedo IV”.
E qual é o barato desse disco? Exercícios de estilo em forma de canções mas tudo feito de acordo com o figurino e com a intenção de celebrar sem se dar ao trabalho de pensar demais. Claro que este tipo de obra tem valor e merece ser considerado. Mayer e Jake são cascudos o suficiente para recriar timbres e arranjos convincentes e totalmente inspirados nos grandes momentos do estilo. Ambos tocam todos os instrumentos necessários e a produção funciona bem, jogando a favor das canções, sem inventar muito. É uma música à moda antiga, melódica, sem preocupações inovadoras e feita com cabeça fresca, nitidamente por dois sujeitos que estão se divertindo mais do que qualquer outra coisa. Além da parte sonora, o nome “tuxedo” puxa a ação para a parte puramente festeira que o eletrofunk pode oferecer. Danças, passinhos, bons momentos na pista de dança ou escolhendo aquela balada derramada para dedicar a quem você ama. É legal, vai.
Dentre as canções presentes em “Tuxedo IV”, podemos dizer que não há momento desperdiçado por aqui. Tudo está num bom padrão criativo e às vezes avança no tempo, deixando os timbres intencionalmente datados para trás, caso, por exemplo da ótima e suingada “Ride With Me”, que tem fluência de hip hop pop noventista, lembrando, por exemplo, o sumido Montell Jordan. Em “Jake’s Groove”, por exemplo, saem de cena os tons dançantes e pop e temos, nem que seja por cerca de um minuto e meio, uma levadinha jazz funk clássica, bem feita mesmo que seja produzida em timbres meio sintéticos demais. O que vale é a intenção. A maior parte do tempo, no entanto, Mayer e Jake oferecem ótimas canções ao ouvinte, com destaque para a colossal “Cake”, que tem vibrações oitentistas evidentes, lembrando alguma produção obscura de gente como o Debarge ou o Shalamar, grupos que se beneficiaram do uso desses timbres em momentos extrapop como “Rhythm Of The Night” ou “A Night To Remember”, respectivamente. “Cake” tem fluência total e se insere no grupo de canções que fazem dançar até as estátuas da praça.
No mesmo nível é a sensacional “This Is 4 You”, que tem um talhe mais funky setentista mas entrega no desenho do synthbass as suas inteções e origens mais definidas. E tem o balanço de “Windows Down”, que lembra muito as fases oitentistas de Kool And The Gang e Earth, Wind And Fire, quando mergulharam neste mar calmo de timbres sintetizados e sedutores. Fechando o álbum, a balada estilizada “We Made It”, cheia de corinhos e metais sintetizados.
“Tuxedo IV” é disco de diversão, mas também é um resultado feliz de dois músicos que amam e entendem o que fazem, buscando reverenciar grandes mestres esquecidos. Vale conhecer e recordar.
Ouça primeiro: “Windows Down”, “Cake”, “This Is 4 You”
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.