CeeLo Green – CeeLo Green Is Thomas Callaway

 

 

 

Gênero: Soul, pop alternativo

Duração: 39 min.
Faixas: 12
Produção: Dan Auerbach
Gravadora: BMG

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

Desde que surgiu para uma audiência global, CeeLo Green mostrou ser um ótimo cantor. Ali, a bordo do sucesso “Crazy”, colaborando com Gnarls Barkley, Green mostrou que era um sujeito versado nos idiomas eletrônicos e pop daqueles anos 00. Anteriormente havia lançado alguns discos como rapper, também demonstrando capacidade e talento inegáveis, sendo que também atuara como compositor e produtor – a faixa “Don’tcha”, das Pussycat Girls é obra dele – demonstrando que não era só mais um nome na lista de créditos. Depois do Gnarls, CeeLo iniciou uma carreira em que sempre esteve aquém do que poderia demonstrar. Sua ótima voz surgia empavonada em álbuns pouco inspirados, mas sempre ficava a impressão de que ele poderia se tornar uma estrela de primeiro time. Por isso, o movimento em busca de um disco reflexivo e “calmo” não chega a surpreender, uma vez que ele novamente se mostra à altura do desafio. E quem produz e hospeda os trabalhos é Dan Auerbach, metade dos Black Keys, hoje um produtor requisitado. “CeeLo Green Is Thomas Callway” é o resultado desta colaboração e já adianto: é um discaço.

 

Auerbach sempre demonstrou sua vinculação ao passado, seja no Black Keys, seja como produtor. Se na banda ele busca a recriação de amálgamas chicletudos do rock setentistas, por trás da mesa do estúdio, ele é um fã do pop perfeito que era praticado nos Estados Unidos perto do fim da década de 1960. Seja em trabalho autoral, seja por trás de álbuns de gente como Jack Bugg, dos Pretenders ou da estreante – e sensacional cantora – Yola, Auerbach busca reproduzir uma sonoridade clássica, incrustada no mais clássico dos panteons. Ele age, pensa e grava como se estivesse num turno de estúdio da Motown por volta de 1968. Ou de outra gravadora, sonhando em ter artistas como Glen Campbell ou Four Tops dentro do estúdio, emulando arranjos perfeitos, flertando com este pop orquestral e reflexivo que se foi. E CeeLo era sabedor desta possibilidade, concordando desde o início com um trabalho que pisasse no freio com elegância inegável. Ou seja, o álbum soa como uma parada para pensar e respirar, com consequências ainda imprevisíveis.

 

O fato é que temos doze faixas redondíssimas, cheias de momentos inspirados com cordas, órgãos, metais, backing vocals, ou seja, toda a estrutura para recriar o tom e o som que mencionamos acima. Além disso, Auerbach recrutou vários músicos cascudos e veteranos da cena de Memphis, Tennessee, chamando CeeLo para gravar por lá, em seu estúdio particular. O resultado é magnífico, com um nítido caso de parceira que acaba fazendo bem a ambos os envolvidos. O nível das canções é impressionante, a produção é impecável e eu arrisco a dizer que é um dos mais eficientes resultados que Auerbach obtem na pilotagem de estúdio. O padrão do registro de Green é o das FMs mitológicas da virada dos anos 1960/70, com momentos sensacionais em que seu talento como cantor “sério” transparece com naturalidade, originando um disco que chega a ser surpreendente.

 

Momentos iluminados estão por toda parte. “For You”, a faixa de abertura, já inicia o álbum com órgão e efeitos climáticos delicadíssimos e CeeLo planando no horizonte das belas vozes. Seu timbre está mais grave no início e vai se soltando, como um belo crooner que exibe versatilidade. “Don’t Lie” é outra canção perfeita, com arranjo lembrando “Wichita Lineman”, de Jimmy Webb, imortalizada por Glen Campbell. O refrão é de arrepiar até uma estátua, absolutamente lindo. Outro momento também alude ao cânon de Webb/Campbell, a saber, a levitante balada “You Gott Do It All”, que poderia ser parte de uma trilha sonora de novela global lá de 1970. “Doing It All Together” já levanta o clima com guitarras e uma levada em midtempo feita com precisão, enquanto “Slow Down” surge como balada pungente, cheia de cordas e metais. Lá pro fim, “Down With The Sun” é lindeza cheia de pianos e órgãos, mostrando, mais uma vez, o quanto Auerbach evoluiu como produtor e recriador de um tempo musical específico quando solicitado.

 

“CeeLo Green Is Thomas Callaway” é um trabalho de pausa e reinvenção. O pop eletrônico de hoje é gloriosamente substituído por referências velhuscas, mas que soam novíssimas pela mão de Dan Auerbach. Uma beleza de disco.

 

Ouça primeiro: “”Don’t Lie”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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