2012 é inevitável
No tempo em que eu tinha televisão, era absolutamente impossível passar por todos os canais sem notar que, ao menos um deles, estava exibindo “2012”. Outro dia eu, em pleno bode de início de ano, com todo o catálogo da Netflix à disposição, acabei parando na produção de Roland Emmerich e … a vi novamente. Sim, porque já vi 2012 várias vezes, desde a primeríssima, numa sala lotadíssima no Plaza Shopping, aqui em Niterói. Estava tão cheio que precisamos sentar nas primeiras filas, com direito a filme começado e torcicolo posterior.
Sendo assim, para tirar a poeira desta adorável parte da Célula Pop, o “É Ruim Mas Eu Gosto”, vamos com este texto da época (e inédito) sobre o filme.
Já foi dito acertadamente que os livros e filmes de ficção científica falam do presente e não do futuro. Talvez sejam a mais fidedignas fontes de observação da sociedade que os produz, em qualquer época. Essa máxima fica ainda mais evidente quando vemos os filmes do alemão Roland Emmerich na telona do cinema.
Dessa vez, não satisfeito em detonar o mundo com alienígenas (Independence Day, 1994), monstros mutantes (Godzilla, 1998), alterações climáticas drásticas (O Dia Depois de Amanhã, 2004), Emmerich resolveu, literalmente, não deixar pedra sobre pedra em 2012. As imagens são impressionantes, o elenco é o melhor que ele já reuniu (John Cusack, Amanda Peet, Danny Glover, Oliver Platt, Thandie Newton, Chiwetel Ejiofor, Woody Harelson, entre outros) e as pequenas histórias pessoais que entrelaçam as hecatombes sísmicas estão bem mais convincentes dessa vez, além da própria trama, que se mostra muito mais eficaz do que todas as outras desenvolvidas por Emmerich, que também assina o roteiro, ao lado do colaborador Harald Kloser.
O fiapo de história da vez é o seguinte: astrônomo indiano e geólogo americano investigam alterações no comportamento do Sol, que poderão causar desastres catastróficos em pouco tempo. As estimativas dos estudos apontam para 2012, o ano em que o calendário dos maias encerra sua contagem. Tem início uma operação mundial para salvar o máximo de pessoas e da cultura humana, uma vez que o desastre é certo e vai, segundo Danny Glover, interpretando uma versão madura e pragmática do presidente Obama, “vai acabar com o mundo como o conhecemos”.
Emmerich sempre recorre aos mesmos temas em seus filmes, o que nos leva à frase sobre os filmes e livros de ficção científica sempre nos falarem do presente e nunca do futuro. A humanidade, vitimada pelos agentes da destruição, sejam eles de qualquer natureza, significa o povo americano. O drama, seja na escala mundial ou pessoal, retrata sempre a superação de um indivíduo desfavorecido, seja pela condição social, pela profissão desacreditada, pela raça, enfim, uma pessoa americana que não compactua com o tal american dream e que, ainda assim, é capaz de resgatar o verdeiro espírito americano, amante da liberdade, da igualdade e pró-fraternidade. Sabemos, vocês, eu e a torcida do meu querido Flamengo, que não é assim. Quando observamos personagens como o cientista judeu frustrado e o piloto negro rejeitado pela NASA (vividos por Jeff Goldblun e Will Smith em Independence Day) e os comparamos com o cientista negro frustrado (sim, outro) e o escritor frustrado branco que precisa dirigir limusines para sobreviver (Chiwetel Eliojofor e John Cusack) de 2012, notamos a presença do mesmo espírito. A capacidade destes americanos menos favorecidos, detentores de uma fibra e garra de não se abate nunca, é a metáfora da América vencendo toda e qualquer intempérie, na defesa do mundo livre.
Se entrarmos no cinema com estes pensamentos racionais e razoáveis sobre subtexto e reais intenções, nunca nos divertiremos assistindo os efeitos especiais vertiginosos criados pela bagatela de 260 milhões de dólares. E eles são absolutamente sensacionais e capazes de tirar o fôlego. Há cenas – como a alardeada queda do Cristo Redentor após um terremoto e um tsunami – que perdem de goleada para outras – que não contarei para não estragar o divertimento de meus queridos leitores.
2012 é superior a todos os filmes recentes sobre o fim do mundo, incluindo aí Armaggedon, O Núcleo, Impacto Profundo e as próprias obras anteriores de Emmerich, já citadas acima. Vale uma bela ida ao cinema, com um bom saco de pipocas (doce, no meu caso) e um copão de refrigerante. Pouco tempo depois, toda a sua trama será esquecida e arquivada em seu cérebro, preocupado com coisas mais importantes da vida, porém, por 158 minutos, você não será capaz de pensar em nada a não ser na próxima tragédia natural que aparecerá na tela.
Bom divertimento.
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.