The Chemical Brothers – No Geography

Gênero: Eletrônico
Duração: 46 min
Faixas: 10
Produção: Tom Rowlands and Ed Simons
Gravadora: Virgin/Universal

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

Artistas como os Chemical Brothers são garantia de que a música eletrônica sobrevive à febre nociva da EDM. Por esta sigla, que significa, genericamente, electronic dance music, entende-se toda e qualquer música sintética que seja feita, especialmente com a intenção de distrair e fazer pular públicos absolutamente desvinculados do que está sendo ouvido. É uma espécie de fundo musical de grandes proporções, que, além de abastecer uma rede de artistas inócuos e gerar um público bunda, soterrou aqueles que, de fato, possuem proposta e estofo nesta seara. Tom Rowlands e Ed Simons, os próprios ChemBros, sabem disso e gravaram o seu disco mais legal em muitos anos, mostrando o quão bacana e aventurosa pode ser a música eletrônica quando ela é bem feita.

Para “No Geography” ser tão legal e refrescante, os Chemical abraçaram uma parte de sua herança como produtores/artistas do ramo: o amor pelos samples, pela reinterpretação, pela música feita pra pular. Em alguns momentos o ouvinte se sente em 1995, quando a dupla surgiu para o mundo como uma espécie de representante do melhor que a cultura das raves inglesas podia oferecer. Em outras passagens, a dupla se mostra capaz de absorver os ensinamentos passados por outra dupla, o Daft Punk, que foi o artista mais desenvolto nestes tempos de EDM a oferecer algo legal e que criou uma espécie de impressão digital sonora, que os Chemical seguem aqui em alguns momentos, especialmente no single “Got To Keep On”, que parte de um sample da canção “Dance With Me”, de Peter Brown, um pequeno clássico da Disco Music. Aliás, “Got To Keep On” reata a relação da dupla com a feitura de singles dourados, algo que não acontecia desde, vejamos, “Star Guitar”, lançada há 15 anos.

As primeiras cinco faixas de “No Geography” formam um blocão demoníaco, feito sob medida para a dança. Tudo é aerodinâmico, bem feito, crocante, e pensado milimetricamente para dar certo. O início, com “Eve Of Destruction”, arranca toco com um sample de “Weekend”, de Class Action, canção de 1983, que fornece a base tecnofunk necessária. Daí, emendada e sem falhas, vem “Bango”, que envereda por percussões e linhas de baixo sinuosas – um traço marcante dos Chemical – e avança sem medo de errar, em direção à faixa-título, que é um pouco mais lenta e psicodélica no início, mas engata numa bateção total e conduz ao single luminoso “Got To Keep On”, fechando esta primeira fase do álbum com “Gravity Drops”, que tem a batida mais 2019 dentre as cinco canções.

Daí em diante, o disco muda e a face mais experimental dos Chemical Brothers surge, mas não chega a tomar posse das ações, mantendo o foco do álbum na dança e nos caleidoscópios de samples, lembrando um pouco os australianos do Avalanches. É o espaço ideal para canções como “We’ve Got To Try”, que tem sample de “I’ve Got To Find a Way”, de 1973, cantada pelo The Hallelujah Chorus. Aqui fica evidente a capacidade de Rowlands e Simmons como artistas pensadores do estúdio e do sampling. A caminho do fim do álbum, outra canção pipoca, pedindo atenção: “MAH”, que surge psicodélica e experimental, sendo possuída aos poucos pelo sample de “I’m Mad As Hell” (1977), dos americanos El Coco.

“No Geography” é o disco mais legal de música eletrônica a surgir em muito tempo. O gênero precisa de gente com noção e bom senso, além de talento. Estes predicados os Chemical Brothers têm de sobra. Se os festivais brasileiros tivessem mais visão, esta seria uma atração perfeita para redefinir parâmetros da música eletrônica no país.

Ouça primeiro: “Got To Keep On”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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