The Avalanches – We Will Always Love You

 

 

Gênero: Eletrônico

Duração: 71 min
Faixas: 25
Produção: The Avalanches
Gravadora: Modular/Astralwerks

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

 

Blood Orange, MGMT, Johnny Marr, Tricky, Leon Bridges, Perry Farrell, Mick Jones, Neneh Cherry, Kurt Vile, Karen O, Rivers Cuomo e Cornelius. Estes são alguns dos convidados deste terceiro álbum dos australianos enlouquecidos e geniais do The Avalanches. Se eles levaram 16 anos entre o primeiro disco – “Since I Left You” (2000) – e o sucessor, “Wildlife”, lançado em 2016, agora só levaram cerca de mil e duzentos dias para dar vida a este surpreendente “We Will Always Love You”. Na verdade, “surpreendente” não é exatamente o termo, uma vez que os Avalanches Robbie Chater e Toni Di Blasi se valem do padrão que estabeleceram há tempos: um caleidoscópio de sons, colagens, samples e a sensação de que estamos diante de um quebra-cabeças musical, em que tentamos identificar os trechos e as pistas que são deixadas ao longo das 25 faixas. É como participar daqueles desafios do filme/livro “Jogador Nº1”, em busca de referências e coerência no que vamos ouvindo. E tal sensação é irresistível para quem ama samples e acredita neles como uma ferramenta de real transformação na produção musical. Bem, a carreira do próprio The Avalanches é a prova definitiva disso.

 

“We Will…” tem um conceito. É um álbum que foi construído a partir do encanto de Chater e Di Blasi com a história do disco dourado que está viajando pelas estrelas a bordo da Voyager I. Nele foram gravados sons do planeta, declarações de amizade, amor, paz e algumas informações matemáticas sobre a Terra. Além disso, o projeto foi chefiado por Ann Druyan, que trabalhou com Carl Sagan, por quem acabou se apaixonando. E toda essa história foi absorvida pela dupla, a ponto de estampar a capa do álbum com uma foto de Druyan e com o registro de suas ondas cerebrais. É coisa de nerd, de fã de ficção científica e gente esquisita, mas é algo igualmente genial, especialmente porque o resultado entrelaça aquela visão ultrapassada de espaço e futuro, com o pragmatismo pessimista deste 2020 tão cruel. O que surge disso tudo é um compêndio de beleza e engenhosidade, com mais foco do que “Wildlife”, o antecessor, mas ainda aquém da espontaneidade exuberante da estreia.

 

Os samples dividem a atenção com a constelação de convidados. Tem pra todos os gostos, desde faixas mais conhecidas do povo, como “Hurting Each Other”, dos Carpenters (em “we Go On”) ou “Eye In The Sky”, do Alan Parsons Project, (em “Interstellar Love”) ou mesmo “Magalenha”, de Sérgio Mendes (em “Wherever You Go”). O uso deste tipo de informação, muito além dos beats e linhas de baixo – que também estão presentes em abundância – mostram a maestria do Avalanches em assumir esses trechos manjados sem qualquer problema e ressignificá-los de forma destemida e genial. E a diversidade do espectro sonoro só joga a favor desta exuberância, dando à dupla possibilidades inesgotáveis na confecção das faixas. Não por acaso, “We Go On” (com Cola Baby e Mick Jones, ex- Foreigner), “Interestellar Love” (com Leon Bridges) e “Wherever You Go” (com Jamie XX e Neneh Cherry) estão entre os pontos altíssimos do álbum, misturando climas, batidas e ocultando/revelando significados o tempo todo.

 

Além delas, há outros colossos. “Music Makes Me High”, como o nome já diz, é festa sem limites sob a luz das luas de Marte. “The Divine Chord”, com MGMT e Johnny Marr, é uma doçura pop multidimensional, com sample constante de “It’s Love That Really Counts”, das Shirelles. Outra sacada de gênio é “Gold Sky”, com Kurt Vile, que traz a estrutura ferroviária de “Last Train Home”, faixa que Pat Metheny gravou em 1988, com ares de “Clube da Esquina”. E tem “Running Red Lights”, com participação de Rivers Cuomo, que traz sample de uma canção celestial do grupo Association, “Toymaker”, além de trechos de uma gravação recente do Purple Mountains, “Darkness And Cold”. Tantas referências e caminhos são a glória suprema para detalhistas e constituem combustível para várias e várias audições exploratórias.

 

“We Will Always Love You” é outro trabalho colossal dos Avalanches. É um patchwork musical, uma colcha auricular, uma rede interligada de referências, intenções e execuções. Nem precisava ser tão bonito, mas, vejam só, é. Um colosso.

 

Ouça primeiro: o disco todo, na ordem.

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

2 thoughts on “The Avalanches – We Will Always Love You

  • 15 de dezembro de 2020 em 10:15
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    Obrigado, Zózimo! As nossas listas sairão na semana que vem, fica ligado! E quanto ao Avalanches, os caras são feras. E o disco do Ed é ótimo mesmo.

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  • 15 de dezembro de 2020 em 10:02
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    Ótima banda, e mais um ótimo trabalho de garimpagem. Sem querer parecer um velho rabugento, mas ultimamente as listas de melhores do ano ficam mais e mais indigentes. Ainda assim, a sua pesquisa sempre nos traz algumas pérolas, como o novo do Ed O’Brien, que eu ouvi e em seguida comprei após uma dica sua, e já reputo como um dos melhores do ano. Abraços

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