Tente não amar o novo disco do The Courettes

 

 

The Courettes – Back In Mono

Gênero: Rock

Duração: 36:20 min.
Faixas: 14
Produção: Søren Christensen e Seiki Sato
Gravadora: Damaged Gods

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

O terceiro disco do duo The Courettes, “Back In Mono” tem um trunfo: ignora praticamente tudo o que foi feito na música pop a partir dos anos 1970. Sua opção é por submergir totalmente no rock primordial sessentista, resultante de surf music, girl groups, influência da Motown e dos ensinamentos dos pais fundadores do estilo – Elvis, Chuck, Eddie Cochran – e construir sua própria obra perfeita. Além dessas influências musicais é somada a presença do estúdio como ferramenta sonora, materializada por Phil Spector e seu wall of sound. É com essas credenciais que a brasileira Flavia Couri e seu marido, o dinamarquês Martin Couri, apresentam aqui. Acredite, poucas coisas soam mais legais, acolhedoras e bem feitas neste ano de 2021.

 

Jornalistas musicais convencionais até irão ignorar este disco precioso. A regra da imprensa “especializada” é privilegiar um pop/rock atual que é o diâmetro oposto do que o Courettes significa. E a busca por esta contemporaneidade fere de morte a percepção de outras formas de música pop. O que Flávia e Martin oferece aqui, sob esta aura retrô intencional, é pura majestade pré-punk/bubblegum original. O que faz o álbum escapar da alegação de apenas reproduzir estéticas sessentistas é a excelência das composições e da produção, que representam os grandes motivos para a existência do próprio álbum. Como se não bastasse, a sonoridade da dupla é, por si, um atrativo: diferente do que pensariam apressadinhos, o formato de duo guitarra/bateria é plural e consegue resultados muito distantes. Pense no que separa, por exemplo,  Kills, Black Keys, White Stripes e Royal Blood, todos duos, do Courettes.

 

É nesta rota de exceção e no abraço ao rock mais clássico, que está a perfeição do resultado de “Back In Mono”. E precisamos fazer justiça ao talento impressionante de Flávia Couri. Outrora baixista dos Autoramas, no Courettes ela responde pela guitarra cheia de fuzz, pelos ótimos vocais e pela adição de detalhes como pianos e efeitos. Martin é um baterista excelente, consegue inserir elementos de percussão de forma bem sutil e responde com competência às necessidades dos arranjos que, ao contrário do que parece, estão bem longe da simplicidade. E há que se mencionar a produção de Søren Christensen e a mixagem à la wall of sound feita por Seiki Sato. Com estes elementos musicais, com a estética dos clipes e da capa, o Courettes se sai muito bem.

 

Exemplos de ótimas canções não faltam: os singles “Want You Like A Cigarette”, “Night Time” e “Hop The Twig”, cada um à sua maneira, abriram caminho para esta sonoridade que é bem mais complexa que a dos trabalhos anteriores e incorpora definitivamente as influências mais pop, no sentido girl groups do termo. E tome belezura harmoniosa, como “Hey Boy”, que parece uma canção das Ronettes esquecida no baú. Tome também o amor desesperado de “Until You’re Mine”, a doideira trash de corinhos e fofuras de “Misfits & Freaks” os experimentos spectorianos de “My One And Only Baby”, tudo isso revestido pelo carisma de Flávia, que tem sua voz embebida por ecos, efeitos e um monte de reflexos aurais que vão deixar o ouvinte sem saber o quê o atingiu.

 

“Back In Mono” é um discaço. Sua estética anti-modernidade é revolucionária e, ora bolas, moderníssima. Quem não ouvir este álbum estará vagando nas trevas absolutas da melhor música pop, a real música pop. Abrace e ame este disquinho.

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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