O Halloween galhofeiro do Duran Duran

 

 

 

 

 

Duran Duran – Danse Macabre
50′, 13 faixas
(BMG)

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

A esta altura do campeonato, o Duran Duran é uma banda quarentona. Com seu primeiro álbum, homônimo, lançado em 1980, o grupo de Simon Le Bon, Nick Rhodes e os Taylors – Andy, Roger e John – já fez de tudo um pouco. Gerou tendências e teve posters decorando quartos de adolescentes oitentistas; já quis ser mais sério e se deu mal; já se reinventou fugazmente nos anos 1990 e, do início do século para cá, vem fazendo apenas o que sabe de melhor: híbridos dançantes de rock e funk, com eletrônica e apelo pós-new romantic perene. Com o tempo, Simon e sua turma entenderam que estão nessa coisa de subir nos palcos do planeta para se divertir e entreter um público que espera isso deles: boa música e um certo bom humor. Por isso que “Danse Macabre”, o novo trabalho dos durannies é tão sintonizado com a atual fase dos sujeitos: é um álbum “temático” sobre Halloween, “soando como uma festa” (segundo Simon em entrevista recente), regado a covers, reinterpretações de canções antigas e algumas novidades. Tudo isso com as marcas registradas do grupo, a saber, boas linhas de baixo, teclados entre a invenção e a releitura technopop e a canastrice vocal no ponto certo. E, bem, é exatamente isso que o ouvinte tem aqui.

 

É um álbum fadado às piores avaliações. Possivelmente o humor dos durans não será entendido completamente pelos mais jovens, que acharão estranho um bando de “idosos” brincando de vampiro e monstro nesta altura do campeonato. Os contemporâneos e mais velhos acharão ridículo (e não estarão errados totalmente), lembrando também que o grupo não é muito conhecido por ser bom em covers, vide o fracasso do álbum “Thank You”, de 1994, no qual o Duran Duran trucidava obras de Lou Reed a Grandmaster Flash sem dó. Porém, trinta anos depois, o jogo parece ter virado e a casca adquirida com a passagem do tempo parece ter dado aos sujeitos um cinismo que sustenta esta empreitada. Além disso, o resultado sonoro é muito superior a qualquer faixa de “Thank You”, ainda que não haja muita criatividade na escolha das canções alheias que compõem a maior parte de “Danse”. A novidade é que o grupo resolveu rever algumas composições próprias com um critério que passa bem longe dos hits óbvios e das criações mais conhecidas.

 

Essas auto-covers compõem um painel diverso do trabalho do Duran ao longo do tempo. “Nightboat”, por exemplo, foi originalmente gravada no álbum de estreia, há 43 anos e ressurge aqui num clima noir e meio gótico, de acordo com o conceito da empreitada. “Love Voudou”, originalmente gravada como “Love Voodoo”, estava no álbum homônimo de 1993, que ressuscitou o grupo com o hit “Come Undone” e também ganha roupagem dark na nova versão. “Secret Oktober” é um dos lados-B mais queridos do grupo, saindo originalmente no single de “Union Of The Snake”, em 1983. E ainda tem a citação de “Lonely Nightmare”, originalmente pertencente a “Rio” (1981), entrando aqui como fio condutor para uma inesperadíssima – e ótima – versão de “Super Freak”, de Rick James, o que nos leva às covers propriamente ditas. Dentro do climinha do álbum, as escolhas refletem o conceito, indo de “Ghost Town” (dos Specials) a “Spellbound” (Siouxsie And The Banshees), passando por “Psycho Killer” (Talking Heads), com participação da baixista do Maneskin, Victoria de Angelis. Além delas, tem uma revisita inesperada ao mago francês da disco music, Cerrone, com “Supernature”, a conversão de “Paint It Black” (Rolling Stones) em uma canção lúgubre por conta do célebre riff de guitarra do original e a inesperada cover de “Bury A Friend”, de Billie Eilish, cuja letra é cantada por Simon Le Bon imitando sotaque do Leste Europeu, talvez para soar como um Drácula pós-apocalipse. Ou não.

 

No setor das novas canções, o destaque vai para a colaboração com o bom e velho – e amigo – Nile Rodgers, que empresta sua guitarra superstar para “Black Moonlight”, que soa como uma releitura de alguma faixa obscura de “Notorious”, álbum de 1988, produzido por Rodgers. A linha de baixo de John Taylor faz a diferença, reforçando o apreço do Duran pelo bom e velho disco funk. Além dela, a faixa-título também é interessante, com a mão pesada no arranjo “de terror” e sintetizadores fazendo linhas lúgubres. Até que entram os vocais de Le Bon, num semi rap que mais confunde do que explica, como se aquele seu tio, já mais pra lá do que pra cá, resolvesse pegar o microfone no karaokê da festa de debutante, deixando todo mundo com grau máximo de vergonha alheia. Essa aí não dá pra defender, mas é apenas uma canção entre várias outras.

 

“Danse Macabre” não é para ser levado a sério. É um trabalho de diversão pura e simples, que convence pela habilidade dos envolvidos e pelo humor saudável que o permeia. Mesmo nesse cenário, há ótimos momentos por aqui, valendo a audição. Ouça sem preconceitos. Ou não.

 

 

Ouça primeiro: “Black Moonlight”, “Super Freak”, “Nightboat”, “Ghost Town”, “Spellbound”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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