Nossos 20 Discos Gringos dos 1990

 

 

 

Dia desses o site Pitchfork publicou uma extensa lista contendo 100 álbuns dos anos 1990, escolhidos por seus leitores em votação recente. A ideia é velha, mas eficaz: lembrar da década em que a música alternativa teve seu protagonismo confirmado e impresso na cultura pop de forma irreversível. No caso do Pitchfork, a música alternativa sempre foi o alvo primordial dos caras.

 

 

Aqui na Célula Pop a coisa é diferente. O escopo é mais abrangente, tem mais espaço para outros enfoques e perspectivas, porém, não dá pra ignorar que somos, sim, fãs de música alternativa. Em se tratando de anos 1990, também para nós, houve um número elevadíssimo de álbuns interessantes e definidores. Sendo assim, num misto de lista pessoal e tentativa de capturar o máximo de abrangência, digamos, histórica, decidimos fazer uma relação de álbuns mais modesta. Em vez de 100, temos 20, o que nos possibilita, ao contrário da Pitchfork, emitir comentários sobre os discos, em perspectiva, ou seja, mostrando o que pensamos hoje sobre a produção daquele tempo. Alguns álbuns permaneceram no gosto pessoal desde então, enquanto outros vieram se juntar, deixando alguns favoritos de fora, gerando uma lista bem peculiar. Em que lugar você acharia, por exemplo, uma relação de álbuns dos anos 1990 sem as bandas de Seattle? Ou sem o Radiohead?

 

 

Aqui não pretendemos ser óbvios, mas sim valorizar alguns excelentes discos que costumam ficar de fora nesse tipo de lista, além de também guardar espaço para algumas reflexões sobre como a música pop evolui e evoluiu nesses trinta anos. Leia, concorde, discorde, divirta-se, irrite-se.

 

 

20 – Daft Punk – Homework (1997) – a estreia do duo francês é praticamente perfeita. Batidas encadeadas num quarto, tendo a cidade como testemunha através de seus ruídos, em meio a reminiscências sonoras da infância disco e da adolescência funk. Deu no que deu.

 

 

19 – Portishead – Dummy (1994) – poucas vezes a gente tem o privilégio de estar diante de uma sonoridade que pareça absolutamente inédita. O trio de Bristol, Inglaterra, ofereceu isso ao mundo com este álbum e ainda revelou, de quebra, uma das grandes vozes da década – Beth Gibbons.

 

 

18 – Jeff Buckley – Grace (1994) – uma voz que influenciou várias outras, decantando lirismo folk, sofrimento rock e isolamento amoroso em níveis e prismas distintos. “Grace” é tudo isso e, mais que tudo, um disco triste por nos deixar diante de um colosso que nunca se levantou em vida.

 

 

 

17 – Boards Of Canada – Music Has The Right To Children (1998) – a música eletrônica dos anos 1990 é um prodígio em suas diferentes formas. Aqui, com o duo escocês Boards Of Canada, ela soa experimental, subliminar e assume a forma de fragmentos de memórias – reais ou não – enquanto vai vestindo seu cérebro como uma luva.

 

 

16 – Chemical Brothers – Dig Your Own Hole (1997) – a música eletrônica que enche estádios mas não abre mão da genialidade. Isso foi o que os Chemical Brothers propuseram neste seu segundo disco. Uma amostra: “Setting Sun” e sua releitura de realidade alternativa para “Tomorrow Never Knows”, daquele grupo de Liverpool que vocês sabem qual.

 

 

15 – Yo La Tengo – You Can Hear The Heart Beating As One (1997) – o grande momento do rock alternativo de guitarras americano na década. Mais que Pavement, mais que Pixies, mais que Flaming Lips, o Yo La Tengo condensou referências, misturou com sua pegada habitual e se saiu com seu melhor trabalho e, pelo menos, me deu um clássico pessoal da década: “Moby Octopad”.

 

 

14 – Primal Scream – Screamadelica (1991) – a síntese do que foi a transição do som acid das raves inglesas da virada da década em forma de álbum, cheio de canções maravilhosas e uma identidade sonora sendo forjada diante dos nossos olhos e ouvidos. Primal Scream foi um dos grandes nomes dos 1990.

 

 

13- Spiritualized – Ladies And Gentlemen, We Are Floating In Space (1997) – o grande disco do ano que também teve “Blur” e “OK Computer”. Aqui a psicodelia está ao nosso alcance, uma vez que estamos flutuando no espaço. Tem gospel, tem Elvis, tem modernidade, está tudo aqui.

 

 

 

12 – Weezer – Weezer (1993) – o grande disco do quarteto californiano em todos os tempos. A ingenuidade, a doçura, o contraste com as guitarras apitando, tudo junto num milkshake de amor não compreendido e jamais declarado. Weezer é o contrário dos coachs red pill que pululam por aí, o que é ótimo. De quebra, uma das melhores canções da década, “Only In Dreams”.

 

 

11 – Teenage Fanclub – Grand Prix (1995) – o ápice do grupo escocês, pelo menos até agora. Ainda que eu tenha memória afetiva insuperável com o antecessor, “Thirteen” (1993), foi “Grand Prix” que eu ouvia pra pegar no sono, que me dava esperanças pra vida e que encapsulava os contos perfeitos de amor que eu queria viver. São tantas canções irretocáveis que nem dá pra mensurar.

 

 

10 – Arrested Development – 3 Years, 5 Months And 2 Days In The Life Of… (1992) – eu não pensava que era possível fazer rap com influência de country music, porém, reduzir esta obra prima apenas a essa fusão é ser reducionista demais. Na estreia deste grupo de Atlanta, há revolução, Sly Stone, ótimas canções e um aspirante – fracassado – a líder de uma geração: Speech.

 

 

9 – De La Soul – De La Soul Is Dead (1991) – o grande álbum de rap da década … de 1980. Na verdade, este trabalho do De La Soul é uma ampliação de escopo de seu antecessor, “3 Feet High And Rising”, mantendo o mesmo número elevado de faixas, vibrações positivas, celebração da juventude e um monte de canções maravilhosas, caso de “Saturdays”, até hoje, um hit na minha rádio-cabeça.

 

 

8 – Elliott Smith – XO (1998) – muitos hão de preferir o Elliott Smith do início de carreira, de álbuns menos polidos como “Roman Candle” ou “Either/Or”, mas minha preferência recai sobre essa estreia numa gravadora major – Dreamworks – e uma produção mais polida, na esteira do sucesso de “Miss Misery” na trilha sonora de “Gênio Indomável”. Quem não lembra de Elliott defendendo sua canção no Oscar de 1998?

 

 

7 – DJ Shadow – Endtroducing… (1996) – o grande disco de música eletrônica da década, a meu ver. Shadow ofereceu uma versão pessoal para o hip hop, o techno e vários outros estilos, soando como se estivesse numa loja de discos usados em Pasadena, Califórnia. Um marco até hoje não igualado. Ouça “Building Steam Of A Grain Of Salt” e entenda o que queremos dizer.

 

 

6 – Blur – Parklife (1994) – o grande disco do britpop e da carreira do Blur. Aqui a crítica de costumes se mescla com a ótima habilidade de Damon Albarn de escrever letras e melodias perfeitas, sem falar nas guitarras esquisitas e oblíquas de Graham Coxon. “End Of A Century” segue imaculada e perfeita. O Blur ainda faria ótimas canções, mas nunca um outro álbum tão coeso.

 

 

5 – U2 – Achtung Baby (1991) – a reinvenção do U2 como testemunha dos tempos que mudavam diante dos olhos. Sai o esgotado messianismo dos estádios e fundações, entra o cinismo eletrônico em estado da arte, marcado pela versão de “Night And Day”, lançada meses antes deste álbum. Nunca mais o U2 soou tão relevante e instigante.

 

 

4 – REM – Automatic For The People (1992) – o grande álbum de gravadora grande do REM. As tonalidades cinzentas, a melancolia chiaroscuro, as letras torturadas e canções imaculadas como “The Sidewinder Sleeps Tonight”, “Ignoreland”, “Man On The Moon” e “Nightswimming”, uma obra-prima da banda de Athens, Geórgia.

 

 

3 – Massive Attack – Protection (1994) – um álbum cujas sessões de gravação eu gostaria de ter visto. O trip hop de Bristol, misturado com doses pesadas de reggae e funk, tudo encapsulado no ambiente cinzento e estranho do grupo, ainda com a presença de Tricky em suas fileiras. A faixa-título é uma das grandes, imensas e perfeitas canções de todos os tempos, seja no original, seja no acachapante remix feito por Brian Eno.

 

 

2 – Elvis Costello e Burt Bacharach – Painted From Memory (1998) – este certamente foi o álbum mais distinto dos anos 1990. Nada foi feito nesses termos em toda a década. Uma mistura da habilidade (então revalorizada) de Burt Bacharach em escrever melodias perfeitas e a inquietude de Elvis Costello, que vinha numa década de várias e sucessivas mudanças estilísticas. O resultado é um álbum que poderia ser lançado em 1971, tamanha a excelência de suas canções, arranjos e interpretações.

 

 

1 – Grant Lee Buffalo – Fuzzy (1993) – o melhor momento da década – a nosso ver – é um disco relativamente “menor”. Tem folk, tem glam, tem rock, tem pianos, guitarras, canções surreais sobre a América mitológica, arranjos maravilhosos e dois clássicos: “The Shining Hour” e “Jupiter And Teardrop”, sem falar na presença do melhor vocalista daquela década, Grant Lee Phillips. Ouro puro.

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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