Música legal de quem você (ainda) não conhece

 

 

Um dos propósitos da Célula Pop é apresentar música pras pessoas. Além de falarmos de grandes bandas e artistas do passado – distante e recente – ou mesmo do presente, que sejam conhecidos e badalados em diferentes níveis, confesso que oferecer ao leitor o prazer da descoberta é algo inestimável no ofício de escrever sobre música. Já vivenciei tal experiência muitas vezes no passado e poucas sensações se mostram tão prazerosas quanto ouvir uma nova canção, se apaixonar por ela e, a partir disso, pesquisar sobre quem a escreveu, gravou e lançou. Acredito que isso muda vidas e a ideia por aqui é essa. A Célula é um site ambicioso.

 

Sendo assim, pesquisar música nova e artistas – ainda – desconhecidos é uma das minhas tarefas diárias. De tempos em tempos a gente faz um inventário, seleciona os mais bacanas e divulga em forma de um textão único, apresentando-os ao leitor e torcendo para que este curta uma ou outra – quem sabe, todas? – as nossas sugestões. Tem de tudo, de artistas estrangeiros em busca de atenção a bravos brasileiros, que insistem em desafiar a triste conjuntura do país, governado por gente que despreza a cultura e a arte. Deem uma olhada na lista abaixo, clique nos links e corra para espalhar a palavra. Só assim a gente resiste a diferentes formas de opressão, se liberta de padrões impostos e dá uma respirada de ar puro neste 2020 abafado.

 

Em tempo: a quantidade de gente fazendo música boa no mundo é espantosamente grande. Sabendo como e onde procurar, não há motivo para você ser refém das mesmas coisas e ficar achando que a música que se fazia antigamente é que era boa. Procure, fuce, ache.

 

Quinn DeVeaux – Nascido na mesma cidade que os irmãos Jackson – Gary, Indiana – o jovem soulman é uma novíssima voz que surge para o coração dos amantes de sonoridades “vintage”. Seu disco “Book Of Soul” é um compêndio de 12 canções em que a voz de Quinn se destaca em meio a instrumentais criativos e ótimas sacadas. “Been To Long” é um bom exemplo do que ele tem para mostrar.

 

 

Black Pumas – Direto de Austin, Texas, o Black Pumas é um duo, formado por Eric Burton e Adrian Quesada, que recrutaram um bando de músicos felpudos de estúdio, capazes de recriar sonoridades típicas da Motown setentista e de gente como Curtis Mayfield. O disco homônimo deles, lançado em 2019, ganhou edição de luxo com faixas acústicas. É uma ótima pedida pra quem ama soul music tocada com respeito pelas tradições.

 

Dabliu – O músico curitibano lança o terceiro álbum, “Ares”, completando uma trilogia em que os outros vértices do triângulo são “Sobre Os Ombros dos Gigantes” (2012) e “Ilha Desconhecida” (2015). A música é suave, eletrônica, acústica e muito brasileira. Tem até sample da voz de Clarice Lispector em “C’Alma” e algumas canções bem bonitas, como “Alícia 2”

 

 

The Memories – Lá no meio do último disco do The Memories, “Pickles and Pies”, há uma cover de “The Sign”, do Ace Of Base, em ritmo de reggae eletrônico lo-fi. Só ela já valeria como chamariz para o álbum, mas ainda há um monte de faixas sensacionais, como “Last Chance To Dance”, “Someone To Love Me” e “Too Old (To Fall In Love)”, que têm um clima meio Electric Light Orchestra, meio The Cars, meio revival de new wave. A diversão é garantida.

 

 

Mild Orange – Os neozelandeses do Mild Orange são mais uma banda que tem no lo-fi a sua razão de ser. A diferença está na qualidade das composições e na utilização de referências do dream pop para dar luz a belezuras como “First Taste”. No fim das constas, lembram um Cocteau Twins menos climático e mais pop.

 

2nd Grade – Peter Gill é um fã de Monkees e powerpop em geral e isso fica claro ao ouvirmos “Hit to Hit”, novo disco de sua banda 2nd Grade, no qual há 24 faixas, dispostas em pouco mais de 40 minutos, ou seja, um monte de pequenas pepitas sonoras com menos de 120 segundos de duração. Em alguns momentos, o sujeito atinge níveis de perfeição teenagafanclúbicas, caso de “Velodrome”, “Baby’s First Word”, “Dennis Hopper In Easy Rider”, “Sucking The Thumb” e na romântica “When You Were My Sharona”.

 

 

 

André L. R. Mendes – Baiano de Salvador, André é o ex-guitarrista e vocal da Maria Bacana e tem uma consistente carreira solo, cheia de ótimos discos. Em tempos de pandemia, ele vem soltando singles interessantes, ora acústicos, sempre pontuados por sua boa verve como compositor. Ouça “Desabafo” e “Manda Notícias”.

 

Holy Hive – Trio de soul pop de Nova York que tem nas gravações da Daptone Records a sua fonte de inspiração. Isso significa dizer que o novo álbum dos caras, “Float Back To You” é uma pequena fonte de belas gravações. De cara a gente já leva um choque com a beleza de “Broom”, a faixa de abertura, e se aventura pelas águas calmas de “Hypnosis”, “Be Thou By My Side”, “Didn’t You Say” e da faixa-título. Uma lindeza constante.

 

Gary Olson – Oriundo das fileiras da gravadora Elephant 6, Gary Olson já teve uma banda chamada Ladybug Transistor, na qual militava na confecção de pequenas belezuras psicodélicas. Agora, em carreira solo, ele encarna algo como uma mistura de Josh Rouse com Lloyd Cole, concebendo um disco em que não há uma única canção menos que bela. É um dos grandes trabalhos deste ano. “Giovanna Please” é cheia de cordas em elipse, uma coisa muito linda.

 

Nicole Atkins – Cantora muito talentosa de Nova Jersey, Nicole surgiu nos anos 2000, com um belo disco chamado “Neptune City”, produzido por Rick Rubin. Ela evoluiu ao longo do tempo, tornando-se uma devota de Dusty Springfield e Fleetwood Mac, banhando seu canto de referências de white soul e fluência pop, chegando num nível impressionante em “Italian Ice”, seu novíssimo trabalho. Há inúmeras canções belíssimas por aqui, especialmente “Forever”, “Am Gold” e “Captain”.

 

 

False Heads – Banda inglesa que faz um correspondente de 2020 ao que o Ash, banda irlandesa noventista, fazia há uns 25 anos. A diferença é que o pessoal do False Heads não tem muito jeito para fazer canções muito leves, mas eles têm a noção de que a melodia e o refrão importam. Sendo assim, “It’s All There But You’re Dreaming”, novo disco dos caras, é cheio de pequenas e bem aplicadas cacetadas na orelha. Confira a trinca “Help Yourself”, “Slew” e “Slease”.

 

 

Sorrey – Liderada por Emilee Sorrey, a banda é uma versão 2020 do shoegaze/dreampop do início dos anos 1990, especialmente de Sundays e dos primeiros momentos do Cranberries, mas também lembrando algo do Beach House. As melodias são todas belíssimas e os arranjos não hesitam em mergulhar em belezuras instrumentais que só realçam a bela voz de Emilee. Destaque para “Baby”, “Full Bloom”, todas presentes no álbum de estreia do grupo, “In Full Bloom”.

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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