DJ Shadow – Our Pathetic Age
Gênero: Eletrônica
Faixas: 26
Duração: 91 minutos
Produção: DJ Shadow
Gravadora: Mass Appeal
Uma certeza: DJ Shadow nunca vai lançar outro “Endtroducing…” seu magistral disco de estreia, lançado no distante ano de 1996. Mas ele pode – e deve – buscar igualar este feito. De lá pra cá, Josh Davis – o próprio Shadow – teve uma carreira um pouco abaixo do que pensávamos que teria. Não foi capaz de encapsular num álbum a angústia de seu tempo e os desejos de expandir os limites estéticos de sua arte, no caso, o hip hop e a música eletrônica. Ele é um dos faróis de legitimidade das batidas sintéticas como meio condutor de grande música, ao contrário do que os Guettas e Aloks da vida fazem as pessoas crerem. E agora, Shadow tenta chegar ao pódio da temporada com esta crônica massiva, “Our Pathetic Age”.
São dois discos. O primeiro tem onze faixas instrumentais, concebidas por Shadow na solidão de seu estúdio particular. Ele misturou estilos modernos e reatou namoro com o hip hop, voltando à obrigação autoimposta de explorar seus caminhos e mistérios. O resultado é estranho e inquietante, no melhor sentido dos dois termos. São faixas que alternam a contemplação com as batidas, mostrando que há muito de jazz na música que Shadow se dispõe a fazer agora, unindo-se de outra forma ao seu primeiro disco. Há momentos de lirismo com “We Are Always Alone”, cheia de pianos e teclados esparsos. E há também força e exploração nas batidas intrincadas de “My Lonely Room”. Momentos bacanas surgem em “Juggernaut”, certamente a melhor canção do primeiro disco, com tempo e espaço para mudar de pele e atravessar estilos como trap ou uk garage, coisas que Shadow conhece mais do que se pensa.
No outro disco, o DJ Shadow recebe um monte de convidados para dezesseis faixas cantadas. O clima muda sensivelmente e temos o velho e bom nativo da periferia de Los Angeles lidando com as batidas, os samples e um monte de gente legal. Nas e Pharohe Monch tomam conta logo de cara de “Drone Warfare”, fazendo um flow nervosíssimo sobre uma base angulosa e surpreendente. Em “Rain On Snow”, o sample de “Rain Or Snow”, faixa de 1968, cantada por Samantha Jones, se intercala com um arsenal de batidas e vocais de Ghostface Killah. “Rocket Fuel”, logo em seguida, traz De La Soul em ótima forma em meio a um sample de “Na Na Hey Hey (Kiss Him Goodbye)”, sucesso manjado de The Belmonts, de 1972. Esta atenção ao sampling é o grande trunfo de Shadow, ele faz a ponte entre o passado e o presente sem abrir mão da relevância do estilo, escapando do que o senso comum passou a entender como hip hop. E se sai bem.
Outro bom momento é “C.O.N.F.O.R.M”, com Gift Of Gab, que tem uma concepção aerodinâmica e cativante em seu arranjo, unindo batida que dá espaço e relevância pra canção. Outra revelação bacana é a presença de Paul Banks, vocalista e guitarrista do Interpol, em “Small Colleges (Stay With Me)”, ao lado de Wiki. Run The Jewels (“Kings & Queens”) e Pusha T (“Been Use”) também mandam bem em suas faixas, contrabalançando as estéticas do estilo com graça e importância. O fecho do disco é com a ótima “Two Notes”, com Barny Fletcher.
“Our Pathetic Age” é um atestado de vigor artístico de DJ Shadow, bem como um disco que avisa a todos o quanto ele é importante para a música feita na virada do milênio. O cara é raposa felpuda e está atento a tudo. Ouça no volume máximo, enxergando possibilidades.
Ouça primeiro: “Rocket Fuel”
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.