Cinco vezes Ryan Adams

 

 

 

Sword & Stone 4 out of 5 stars (4 / 5)
Star Sign 4 out of 5 stars (4 / 5)
Prisoners (Live) 3 out of 5 stars (3 / 5)
Heatwave 3.5 out of 5 stars (3,5 / 5)
1985 3.5 out of 5 stars (3,5 / 5)

 

 

 

 

Uma olhadela nos serviços de streaming mostrará que, de 2020 para cá, Ryan Adams lançou a impressionante quantia de quinze álbuns. Tem de tudo: ao vivo, tributo, inédito, acompanhado, solo, um verdadeiro exercício da independência e da liberdade criativa, algo proporcionado pelo fato de que Adams é dono de sua própria gravadora e selo, Pax Americana. Daí, fazendo praticamente tudo no estúdio, ele concebe, executa, decide se lança e, caso positivo, coloca tudo no ar, além de oferecer aos fãs a chance de comprar versões em vinil artesanais, à venda em seu site. Ou seja, Ryan Adams não deve nada a ninguém, certo? Errado. Cancelado pela opinião pública há cerca de cinco anos, após sua ex-mulher, Mandy Moore, acusá-lo de assédio moral e Phoebe Bridges, ela mesma, do Boygenius, também divulgar experiências de má conduta de todos os tipos por parte de Adams quando eram namorados, o sujeito, após desculpar-se e ser inocentado das acusações, entrou num modo frenético de produção. E, do nada, em pleno dia primeiro de janeiro de 2024, colocou estes cinco álbuns online.

 

São 77 faixas ao todo e, como é de costume, não há momento desperdiçado por aqui. Ryan Adams sempre foi um cara talentoso desde os tempos em que liderava a querida Whiskeytown, uma das bandas pioneiras do alt.country, na virada dos anos 1990/2000, adentrando o novo milênio como artista solo. Sua música é herdeira direta do folk country rock americano dos anos 1970, devidamente turbinada por influências punk, pós-punk e até britpop das décadas seguintes, conferindo ao que ele escreve um ar, digamos, exótico e atual. Esta marca sonora habita, variando de intensidade aqui e ali, todos esses novos trabalhos, definindo-os uns em relação aos outros. Três deles – “Sword & Stone”, “Heatwave” e “Star Sign” – orbitam a mesma estrela, ou seja, são trabalhos com esta impressão musical à frente de tudo. Há influências de Bruce Springsteen, Tom Petty e similares por todos os cantos, além, claro, da pegada do próprio Ryan, cantando bem como sempre e exibindo ótima forma como compositor. Exemplos de lindeza estão em toda parte, mas atingindo o teto em “Friday Night NYC” e “Nuclear War”, com o ótimo verso “walking down the street to your house, thinking about nuclear war”

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Além delas, “Be Wrong”, “Shining Through The Dark”, “Star Sign” (todas do álbum “Star Sign”) respondem pelo início da carreira de Ryan, parecendo muito com as gravações do Whiskeytown e de seus primeiros álbuns solo – “Heartbreaker” e “Gold”. Fechando este primeiro lote, “Why” e “Too Late”, ambas de “Heatwave”, mostram o lado roqueiro mais acentuado de Adams. Neste álbum, ele pisa um pouco mais fundo nos pedais de distorção e apresenta canções mais, digamos, nervosas. O resultado é bom, mas a surpresa fica por conta de “1985”, álbum punk/hardcore, com 29 minutos de duração para … 29 canções. Em meio a momentos mais gritados e raivosos, Ryan se sai muito bem exibindo influência latente de Lemonheads inicial e Replacements, oferecendo, pelo menos, uma ótima quina de canções: “Waste Of Time”, “I Don’t Want To Know”, “How To Belong”, “Bag Of Trash” e “On A Side”, que lembra algo que poderia ser feito por um The Police mais punk e iniciante.

 

Já “Prisoners (Live)” surge como um registro da turnê de 2017, divulgando o álbum de mesmo nome, com versões competentes dos originais gravados em estúdio, com destaque para a faixa-título, com belos solos de harmônica e saxofone, e da ótima “Outbound Train”, uma das melhores canções que Ryan já escreveu.

 

Sem dúvida, este é um pacotaço para iniciar 2024 com o pé direito. E já está na hora de pensarmos em suspender o cancelamento de Ryan Adams. O sujeito errou, admitiu, foi inocentado e tenta, loucamente, compulsivamente, recuperar seu status com produções incessantes e competentes. Com estes cinco álbuns, Ryan pede e ganha atenção. Alguns momentos nestas 77 faixas mostram quão bom ele é.

 

Consulte a playlist abaixo para ouvir nossas recomendações neste montão de faixas

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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