A sonora majestade de Jennifer Souza

 

 

 

Jennifer Souza – Pacífica Pedra Branca

Gênero: MPB Alternativo

Duração: 39:31 min.
Faixas: 9
Produção: Jennifer Souza e Leonardo Marques
Gravadora: Balaclava

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

Conheci o trabalho de Jennifer Souza quando ela participava do grupo mineiro Transmissor, uma espécie mineira de cruza entre Fleetwood Mac e Clube da Esquina, ou algo assim. A voz doce, o timbre cândido, porém triste, de Jennifer chamava a atenção em meio ao instrumental solar da banda. Ao longo dos anos 2010, ela e o grupo foram alternando trabalhos de muita qualidade, sendo que o último registro autoral que ela lançou foi o ótimo “Impossível Breve”, de 2013. De lá pra cá, veio um “mini-álbum” acústico de seis canções em 2016 e, finalmente, este lindo, lindíssimo “Pacífica Pedra Branca”, lançado agora. Posso afirmar que se trata de um dos mais belos álbuns nacionais de 2021 e o do mais bem acabado trabalho que Jennifer lança, incluindo aí seus discos com o Transmissor. Ou com o Moons, projeto folk do qual ela faz parte desde 2016.

 

Com produção, arranjos e composições divididas com Leonardo Marques, Jennifer consegue um resultado arrepiante, cheio de pianos, violões, metais e vários instrumentos harmônicos, todos envolvidos por uma aura crepuscular muito bonita. É como se estivéssemos vivendo num mundo sutilmente diferente, mais brando, mais lento, mas doce, que nos envolve sem que tenhamos a noção exata de como isso veio a acontecer. E não adianta procurar explicação, uma vez que os timbres dos instrumentos e a voz de Jennifer proporcionam uma espécie de antídoto para a rapidez e a burrice instituídas no nosso cotidiano. Ouvir as nove faixas de “Pacífica Pedra Branca” é entrar numa outra sintonia. As canções pedem sua atenção e, em troca, oferecem detalhes tão pequenos de nós todos, visões da natureza idealizada, talvez reminiscência inevitável da música mineira setentistas que, de alguma forma, paira sobre este registro belíssimo que

 

Jennifer oferece com gentileza. As canções são todas belas, lentas, majestosas em uma discrição impressionante, quase à meia voz. São vozes baixas, doces, quase segredadas aos nossos ouvidos, como lembranças. É quase inevitável deixar os parâmetros do tempo/espaço de 2021 ao som do álbum. E não é só a aura ou o clima despertados pelos arranjos ou pelos vocais, todas as nove faixas são belas composições, com linhas melódicas muito claras e bem pensadas, com espaço para pequenas explosões instrumentais e contrastes sem voz para a doçura que Jennifer espalha por todos os cantos do álbum. Mas não engane: é uma sutileza, uma inteligência musical constante o que a cantora e compositora mineira esbanja por aqui.

 

A faixa-título é uma das mais belas canções brasileiras de 2021, sem qualquer sombra de dúvida. É como se ela fosse um Beto Guedes mulher, muitos anos mais jovem, relatando sobre uma comunhão entre pessoa e lugar, lembrança, coração e impressões em versos como “Que traços vão me guiar para perto do teu amor?”, dando a tônica de que é possível ver o amor, não só como um ato de liberdade, mas de resistência. Em “Ultraleve”, faixa de abertura, o tom já é dado pelo dedilhado de guitarras, pelo tom baixo, pela bateria intrincada e pelo belo uso dos pianos, quase num arranjo post-rock. “Birds”, em seguida, é ainda mais delicada e contemplativa, novamente com pianos e detalhes belíssimos que vão surgindo pelo caminho. Assim como são “Amanhecer” (outra sobrinha-neta do Clube da Esquina), “Serena” (que tem participação vocal dos companheiros do Moons) e todas as outras canções do disco. Especialmente bela é “Ser No Espaço A Minha Luz”.

 

Deixe “Pacífica Pedra Branca” levar você pela mão. São promessas de momentos menos atribulados e, do jeito que a coisa está, o que ele oferece é praticamente tudo o que precisamos. Um triunfo de sutilezas e amor.

 

Ouça primeiro: “Pacífica Pedra Branca”, “Ser No Espaço A Minha Luz”, “Birds”, “Serena”, “”Ultraleve”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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