Onde está Summer B?

 

 

Um dos discos mais queridos que tenho na minha coleção é o primeiro do grupo americano Ben Folds Five. Lançado em 1995, o disco homônimo é um verdadeiro OVNI naquela década. Enquanto muitas bandas investiam tempo e estúdio num rockão pós-grunge e/ou alternativo, nos moldes definidos por bandas como Sonic Youth ou REM ainda no início dos 1990’s, o BFF era um trio de malucos fanáticos por pop e jazz. As melodias que Ben Folds, o vocalista e pianista, compôs nessa estreia são verdadeiros oásis de bolso para ouvidos acostumados à mesmice de então. Como se não bastasse a leveza pop setentista das faixas e dos arranjos, as letras – compostas na maioria pelo baterista Darren Jessee e por Folds – são extremamente pessoais e quase funcionam como um diário da vida pós-adolescente dos caras em sua cidade natal de Chappel Hill, na Carolina do Norte. Completava o trio o baixista Robert Sledge, que usava pedais malucos em seu instrumento, fazendo-o soar como uma guitarra, a exemplo do que fazia Mark Sandman no Morphine.

 

Meu primeiro contato com o álbum foi, na verdade, com o single de “Underground”, a faixa que puxou o disco. Eu estava na gloriosa Spider CDs, numa galeria de Ipanema, quando ouvi a melodia infecciosa. Era pouco comum que Wolmar, o dono da loja, tocasse algo que não fosse eletrônico ou britpop e o som do Ben Folds Five era, de fato, muito diferente. A letra era perfeita: “we can’t be happy underground” criticando a esquisitice como ela realmente é: esquisita e fator de segregação social, especialmente entre gente jovem. A voz de Folds vai dos falsetes aos tons mais enraivecidos. Tem desde influências jazz/glam – de Elton John e Queen – passando pela exuberância melodiosa do mesmo Elton e uma cara de novidade sôfrega, algo que não existia em lugar nenhum. Perguntei o que era aquilo e, ao ver o single que só trazia duas canções, a outra era a aerodinâmica – e ótima – “Sports And Wine” – acabei comprando na hora, com a certeza de que o disco completo chegaria em um mês. E, claro, já o encomendei ali mesmo.

 

Uma vez com o álbum em mãos, tive acesso a um dos mais sensacionais discos daquela década, criminosamente esquecido. Canções como “Philosophy”, “Boxing”, “Video”, orgulhariam mestres do pop pianístico mundial em todos os tempos, mas o mais bacana foi ter acesso a este mundo de amigos dos caras do Ben Folds Five. Várias canções faziam alusões a uma turma de pessoas, que só podiam ser reais. Uma das faixas se chamava “Julianne”, que iniciava-se como “eu conheci essa garota que se parece exatamente com Axl Rose”, introduzia talvez o momento de maior peso do álbum, com direito a sons de louças quebradas e acordes abruptos ao piano. Outra delas é “Alice Childress”, que fala do rompimento de um casal que era muito diferente em sua aparência. A então esposa de Ben na época, Anna Goodman, também participou da composição. Outras faixas têm personagens definidos, como “Jackson Connery” e “Uncle Walter”, todos mais ou menos reais às vezes com mistura de características de pessoas reais.

 

Minha preferida do álbum, com o tempo, se tornou “Where’s Summer B.?”. É uma adorável melodia ao piano, linear, na qual Folds vai colocando sua amiga, Summer Burke, a par do que mudou na cidade durante o tempo em que ela esteve fora. A letra é um relatório sobre casais que se separaram, gente solitária que continua solitária, lugares que acabaram, empregos que vieram e a expressão da saudade por conta da ausência da menina. No meio da letra, o narrado admite que já é hora de “sossegar” e pensar na vida.

I’d like to tell you, like to tell you
Tell you everything
Cause nothing changes, ever changes
Doesn’t seem the same these days

Dave’s been a mess since Cheryl left
Just sits at home and beats back death
And Beth still wears his stupid dress

There goes Joe Caparo again
(Aaah, Aaah, Aaah)
With Darren’s girlfriend
(Aaah, Aaah, Aaah)

They’re asking where ya been, like I know
Where ya been? Hey Summer, where ya been?

I tried to tell you, tried to tell you
Took a little bit too long
And now your phone is disconnected
And your shit’s out on the lawn

The Hardback Cafe closed down
Now we’ve got Office Town
You shoulda stuck around

There go Ross and Frank again
(Aaah, Aaah, Aaah)
They’re holding hands
(Aaah, Aaah, Aaah)

They’re asking where ya been, like I know
Where ya been? hey Summer, where ya been?Woo, ooh, ooh
Woo, ooh, ooh

I could take a train or fly away
Maybe write a book or change my name
I could settle down

There goes Joe Caparo again
(Aaah, Aaah, Aaah)
Hey, that’s Darren’s girlfriend
(Aaah, Aaah, Aaah)
Ross and Frank are holding hands
(Aaah, Aaah, Aaah)

They’ve been asking where ya been
Hey Summer where ya been?

I…
smoking both kills
we’ll settle down but

Hey Summer where ya been?

 

 

O mais adorável sobre “Where’s Summer B?” vem agora. Além de ser uma das músicas mais legais deste primeiro disco sensacional, ela foi incluída numa compilação muito especial, chamada “Songs For Summer“, lançada em 2000 pela Oglio Records. A ideia era reunir as canções prediletas de Summer Brannin, uma fã da banda, que morrera por conta de câncer nos rins, aos 21 anos. Seu namorado, Adam Gimbel, queria escrever um livro sobre ela, mas decidiu lançar um disco com suas quinze músicas mais queridas nos últimos momentos de vida e reverter o lucro da venda para uma fundação que ajuda crianças vítimas de abusos sexuais nos Estados Unidos, a Free Arts for Abused Children.

 

 

O tracklist é admirável.

1. Where’s Summer B? – Ben Folds Five
2. Song For Her – Jason Falkner
3. True Dreams Of Wichita (Live) – Soul Coughing
4. Indian Summer – The Jazz Butcher
5. Brief Candles – The Posies
6. Midsummer – Babacar
7. In The Aeroplane Over The Sea – Neutral Milk Hotel
8. All Along The Frying Pan – Squirrel Nut Zippers (live)
9. Funky Cold Medina – The Frank & Walters
10. Summer – Beasley
11. Summer You Let Your Hair Grow Out – Pansy Division (live)
12. Summer Of Love – The B-52’s
13. After The Beach – Sandycoates
14. Rhyme For The Summertime (original demo) – G Love
15. That Summer Feeling – Jonathan Richman
16. Bonus Track – Songs For Summer

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *