O quase mundano Evanescence

 

 

Evanescence – The Bitter Truth

Gênero: Rock alternativo

Duração: 47 min.
Faixas: 12
Produção: Nick Raskulinecz
Gravadora: BMG

3.5 out of 5 stars (3,5 / 5)

 

 

 

Pouca gente em 2021 poderia se importar com o Evanescence, certo? Errado. Isso porque o grupo americano, liderado pela cantora Amy Lee, tem um dos públicos mais fiéis e numerosos do rock. Quando temos uma galera assim, devidamente ansiosa pelo novo lançamento de sua banda preferida – o primeiro disco de inéditas em dez anos – a tensão/ansiedade em torno do trabalho faz as pessoas subirem pelas paredes. Aliás, se formos justos, o Evanescence surgiu para preencher um vácuo de banda alternativa de rock que dialogasse com signos do metal e da música, digamos, mais “gótica” de uma forma palatável sem que fosse preciso a imersão em fábulas de duendes, elfos e fadas. Ainda que a banda sempre tenha mantido algo misterioso em seu approach, a temática de Amy Lee – a síndica, compositora e cara do grupo – sempre esteve no âmbito do amor – perdido, não correspondido, idealizado. Mas, desde o ano passado, o Evanescence deu alguns sinais de que poderia estar num processo de sacudidela da poeira. Deste jeito, “The Bitter Truth” ganhou, além da demanda reprimida dos fãs, uma aura de que seria um disco de transição. Bem, ele é quase isso.

 

Outros sinais foram dados. Amy surgiu fazendo covers interessantes na Web. A primeira foi de “Chains”, do Fleetwood Mac – para a trilha de um game – e a outra foi de “Cruel Summer”, balada oitentista das inglesinhas do Bananarama, que fez sucesso naquele tempo. Bem, era uma olhada para um terreno menos fabuloso e muito mais urbano/mundano. Além das versões, a banda começou a soltar singles e a temática do voto e da necessidade de se posicionar diante da adversidade permeou “Use My Voice”, uma das primeiras faixas a sair em formato de single. A própria Amy Lee surgia com zero maquiagem no clipe da canção, mostrando que, de fato, poderíamos ver um álbum diferente no cânon do grupo. E não era só isso, algumas passagens dos outros singles apontavam para, pelo menos, um processo em andamento.

 

“Better Without You”, ainda que seja totalmente devedora do padrão clássico do grupo, vem com detalhes eletrônicos em seu arranjo e consegue conjurar o peso e a dramaticidade no ponto certo. “Yeah Right” é um boogie eletrônico de pegada invejável, facilmente a melhor canção do álbum, que dá à banda uma enorme cara de novidade, misturando o binômio peso/voz com esta abordagem mais moderna e alternativa. Mas ficamos por aí. As outras faixas antecipadas já voltavam mais para o tradicional da banda. “The Game Is Over” e “Wasted On You” já orbitavam terrenos conhecidos, de baladas e arranjos mais épicos que vão dialogando com peso de guitarras e bateria que teimam em “sujar” intencionalmente a pureza do canto e da ideia.

 

Mesmo pisando em terras familiares, o Evanescence se sai bem. “Broken Pieces Shine”, por exemplo, é uma bem aplicada porrada na cara, com riff maníaco, bateria pesadona e boa interação entre a voz e os instrumentos. “Feeding The Dark” também é legal, alimenta (sem trocadilho) um clima de tensão que vai crescendo em meio a barulhinhos eletrônicos. “Take Cover” é outro momento de uso de timbres eletrônicos, mas eles estão totalmente a serviço do modelão clássico da banda, metidos em detalhes aqui e ali. Funciona mas não tem criatividade. E neste mesmo nicho, mas bem mais interessante, está “Better Without You”, mais cadenciada e mais forte.

 

O que fica da audição deste álbum para os fãs: Amy Lee segue cantando muito bem e mostra um desejo de alargar as fronteiras de atuação da banda, que, por sua vez, está bem, forte e pesadona. Levando em conta que este é um disco que teve algumas canções terminadas antes da pandemia, outras gravadas remotamente e algumas compostas fora de época, o resultado tem coesão e vai deixar os fãs ansiosos e desejosos por mais.

 

Ouça primeiro: “Yeah Right”, “Broken Pieces Shine”, “Better Without You”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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