Milton Nascimento contra a censura em 1973

 

 

Em 1973, Milton Nascimento estava gravando seu disco MILAGRE DOS PEIXES, quando recebeu notificação da Censura Federal a respeito da interdição de três faixas: “Cadê”, “Hoje É Dia de El Rey” e “Os Escravos de Jó”. A resistência veio na forma de gravar as canções apenas com sua parte instrumental. Em vez das letras, Milton faria vocalises, algo que sempre fez muito bem.

 

Das três, a gravação de “Escravos” é a mais arrebatadora, com participação de Clementina de Jesus em meio a um coro de vozes que apenas canta a melodia. O último verso foi cantado pela veterana sambista de modo quase ininteligível: “Saio do trabalho, ei/Volto para casa, ei/Não lembro de canseira maior/Em tudo é o mesmo suor”.

 

Em 1977 a canção foi gravada por Elis Regina com outro título, “Caxangá”, e com a letra – escrita por Fernando Brant – em sua íntegra. Apesar da letra ser maravilhosa, o registro de 1973 segue como o melhor dessa canção.

 

Coloco a letra original abaixo e a versão censurada no link para que possamos cantar como era para ter sido, em 1973.

 

 

Sempre no coração, haja o que houver
A fome de um dia poder
Morder a carne desta mulher

Veja bem meu patrão como pode ser bom
Você trabalharia no sol
E eu tomando banho de mar

Luto para viver, vivo para morrer
Enquanto minha morte não vem
Eu vivo de brigar contra o rei

Em volta do fogo todo mundo abrindo o jogo
Conta o que tem pra contar
Casos e desejos, coisas dessa vida e da outra

Mas nada de assustar
Quem não é sincero sai da brincadeira correndo
Pois pode se queimar

Saio do trabalho, ei
Volto para casa, ei
Não lembro de canseira maior
Em tudo é o mesmo suor

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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