Mais um disco perfeitinho do Field Music

 

Field Music – Flat White Moon

 

Gênero: Rock alternativo

Duração: 38:48 min.
Faixas: 12
Produção: David Brewis, Peter Brewis
Gravadora: Memphis

 

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

Qual é o limite para o rock/pop ser bem informado? O sucesso? As espertezas que críticos encastelados notarão? O resultado das canções diante do público? Ou a realização pessoal dos seus realizadores? Esta questão sempre me assalta quando eu ouço um álbum como este ótimo “Flat White Moon”, nono trabalho dos ingleses Field Music. Formado pelos irmãos David e Peter Brewis, multinstrumentistas, produtores, nerds musicais, além de outros músicos que os acompanham em apresentações ao vivo, o Field Music é um desses projetos que encontra diversão e sentido na revisita de minúcias do pop-rock oitentista, mais precisamente da primeira metade daquela década, marcada por bandas que tiveram tempo e talento para elaborar discos sensacionais. Falo de gente como XTC, Prefab Sprout, Scritti Politti e de uma outra galera, presente também nos anos 1970, caso de Talking Heads, Steely Dan, Todd Rundgren e Peter Gabriel. Todos esses artistas e bandas têm em comum o detalhe, a boa sacada no estúdio, o timbre exato na hora certa. Eram/são verdadeiros estetas.

 

O Field Music se posiciona nesta linhagem direta e tem cacife para isso. Peter e David têm a manha, entendem destes timbres e do nível de detalhamento necessário mas, assim como seus inspiradores, também dominam a ourivesaria sonora, aquela pegada necessária para forjar boas canções, que grudarão na mente de seus ouvintes privilegiados. Mais que isso: a dupla deve se divertir horrores enfiando referências e timbres bem sacados em seus arranjos, sempre conseguindo um bom equilíbrio entre o fácil e o complexo, nunca comprometendo o resultado final, que serve para a delícia de fãs de um pop rock mais interessante ou que também se amarra em perceber essas mesmas citações e referências. A coisa é feita de um jeito tão natural que tudo flui, tudo faz sentido e, no caso de um disco como este ótimo “Flat White Moon”, as doze faixas, distribuídas em quase 40 minutos, fluem facilmente, de um jeito adoravelmente lógico, jamais previsível.

 

O single “Orion From The Street” abre o disco e já dá o recado. Melodia perfeita, arranjo de acrílico, revestindo baixo, bateria e guitarra de elegância, evocando com força as alamedas ajardinadas em que Scritti Politti e Prefab Sprout caminhavam nos anos 1980. Se esta canção dá o ponto de partida no álbum, ela também enseja a noção da variedade de timbres que o ouvinte terá pela frente, especialmente porque “Do Me A Favour”, logo em seguida, é uma vibrante canção powerpop no melhor estilo XTC do álbum “Oranges And Lemons”. Daí em diante, o mesmo ouvinte já não arrisca prever o que virá, até porque, “Not When You’re In Love”, a terceira faixa, tem um loop insistente de piano, percussão estranha, vocais de apoio que vêm de várias direções, ou seja, um pequeno, controlado e adorável caos. E, bem, são só as três primeiras canções que o Field Music oferece. Ainda temos muito, muito mais.

 

Ao longo do percurso sonoro, teremos uma grande amostra deste pop roqueiro bem informado dos anos 1980, que mais parece feito por e para nerds sonoros do que qualquer outra coisa. “Out Of The Frame” ainda é bem XTC, mas “When You Last Heard From Linda” já tem cordas, dedilhados de violão e certa aura mccartneyana, enquanto “No Pressure”, o outro single, é um funk rock de branco esquisito, lembrando Talking Heads, mas de uma forma mais singela e menos abrasiva. “In This City” é puro Peter Gabriel, modelo 1980, com guitarras crocantes, instrumental à frente do tempo. E outras faixas, como a adorável e beatlemaníaca “Invisible Days”, a discreta e grooveada “The Curtained Room” ou “You Get Better”, que tem Prince e Talking Heads como influências majoritárias, são sensacionais, cada uma à sua maneira.

 

“Flat White Moon” é um discaço. É mais: uma prova de genialidade de uma geração de músicos que cresceu tanto vendo show como colecionando discos, absorvendo mais e maiores quantidades de informação, gerando uma capacidade maior de dar conta de espectros sonoros mais amplos. Percorrer estas doze faixas é um adorável circuito de retas e curvas do melhor da música pop da década de 1980 e extremidades. Muito legal.

 

Ouça primeiro: “Orion From The Street”, “Do Me A Favour”, “You Get Better”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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