Porque você deve ouvir o novo disco da Taylor Swift
Taylor Swift completa 30 anos no próximo dia 13 de dezembro. Lança agora, alguns meses antes, o seu oitavo disco e reafirma sua posição como provável maior estrela do pop mundial. Acho que ela está à frente de Beyonce neste quesito e quase posso entender o motivo. Apesar de Taylor ser a típica e ainda idealizada mocinha americana – lourinha, magrinha, olhos azuis – seus discos e canções são revestidos de um elemento importantíssimo: sinceridade total. Ela disseca relacionamentos pessoais, canta com coração aberto sobre o que vê nas revistas, TV e Internet, além de expor dores e dissabores de sua vida. Sim, isso não é novo, mas Taylor maneja este quesito com admirável maestria. E, claro, há uma forte e eficiente parte musical que dá conta do recado com folgas. Vejamos este “Lover”.
Está lá nos créditos do álbum: Taylor desempenha, além das funções habituais, um posto chamado Creative Packaging Direction. Ou seja, a moça está no total comando da p….toda. Ela concebeu, pensou, verbalizou e arregimentou pessoas competentes para a execução de tudo o que ouvimos durante os 61 minutos de duração do disco. Depois de dois ótimos álbuns – “1989” e “Reputation” – a peteca não podia cair com “Lover”, ainda que ele pareça muito mais arejado e colorido que seus antecessores, que tratavam, respectivamente, origens e perda da inocência em latu sensu. Aqui Taylor parece apenas exercer seu fascínio por conta de ser, simplesmente, quem ela é. E isso, apesar de soar pretensioso, é o grande lance. Ela é natural, empática e talentosa, porém com algo conservador e comportado em seu pacote. Não é uma Britney, nem uma Madonna, pelo contrário. Ela é uma espécie de amiga que toda menina queria ter. E isso funciona totalmente.
Deixando essa análise antropo-musical de lado, “Lover” é um belo exemplar de pop padrão 2019. Isso quer dizer que as 18 faixas manejam o estúdio com eficiência, proporcionando canções sintonizadas com ritmos eletrônicos e abordagens que têm em mente o boom latino atual – mas sem muitas concessões – e as evoluções popescas de trap e dubstep. Além disso, há, claro, a afeição por baladas românticas e faixas em midtempo, compondo um produto vendável e afetivo o bastante para vender, antes de seu lançamento, 1 milhão de cópias. Este número em dias como os atuais, é grande, sim.
Há várias faixas legais em “Lover”. A faixa-título, por exemplo, é uma balada climática, cantada com sofreguidão, dizendo o quão bom é assumir seus amores e sentimentos. É a Taylor madura e sofrida aconselhando sua audiência apenas falando de si. “The Man”, logo em seguida, com batidinhas eletrônicas sob controle, traz uma série de comentários pessoais sobre sexismo e machismo, de uma forma que todo mundo entende, na base do “If I’d be a man, I’d be a man”, atacando frouxos, misóginos e preconceituosos em geral. Em algum ponto da letra, ela diz: “se eu fosse homem, seria como Leo (nardo di Caprio) em San Tropez”. Funciona também. “Paper Rings” tem um pouco de sua herança country aflorando na batida rapidinha e nos vocais sentimentais, enquanto “London Boy” fala sobre passear com seu namorado na cidade natal dele, algo que caberia até num cartão postal, se eles ainda existissem como antes. Funciona. Em “You Need to Calm Down” ela fala a todos os LGBT+ e ainda há ótimas faixas como “False God”, “ME!” e “Afterglow”…
O tiro de misericórdia na alma dos ouvintes: “Soon You’ll Get Better”, uma canção de amor e encorajamento para a mãe, Andrea Swift, que está lutando contra um câncer desde 2015. As ótimas Dixie Chicks participam da gravação e conferem a dramaticidade necessária. A própria Taylor já declarou que esta canção não será apresentada ao vivo, uma vez que ela não consegue lidar com tamanha emoção. Funciona ou não? Claro que sim.
Taylor é cativante e sincera. Em tempos como os atuais, especialmente no teatro dos vampiros que é a música pop industrial, uma artista com sua magnitude não ter medo de chorar e louvar suas pitangas em disco e shows…é bem legal. E “Lover” é uma pequena aula de como fazer boa música sem abrir mão do que é essencial.
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.