Lô Borges mantém média de um disco (bom) por ano

 

 

 

Lô Borges – Não Me Espere Na Estação
37′, 10 faixas
(Deck)

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

Os mineiros têm um encontro marcado com Lô Borges no dia 24 de março próximo: o show de lançamento de “Não Me Espere Na Estação”, a ser realizado no Grande Teatro Cemig – Palácio das Artes, no Centro de Belo Horizonte. A média de lançamentos de Lô é impressionante. Este novo álbum é o quinto de material inédito que ele lança desde 2019. E, se levarmos em conta o que tem feito no século 21, Lô atinge a impressionante marca de treze álbuns, entre inéditos, registros ao vivo e um trabalho em que se apresenta com Samuel Rosa. A ideia do homem, segundo entrevista recente para o Estado de Minas é, de fato, lançar um disco por ano. “Sou um compositor compulsivo, faço uma melodia em cerca de quarenta minutos”. Sendo assim, com as facilidades tecnológicas, uma banda de apoio fiel e talentosa e com sua capacidade artística intacta após tanto tempo na ativa, Lô segue produtivo, operante e, por que não, relevante.

 

“Não Me Espere Na Estação” se parece bastante com os discos que ele solta de 2019 para cá. É um folk rock amineirado, contemplativo, de aura beatlemaníaca, com teores altos de lirismo e doçura. Sempre haverá demanda para este tipo de canção, mas é um erro pensar que esta receita significa banalidade ou acomodação. Este tem sido o idioma artístico de Lô desde o Clube da Esquina, de 1972. No “Disco do Tênis”, sua estreia solo, do mesmo ano, Lô também desfilava essa visão musical da vida. Uma herança hippie-existencial, de levar a vida observando a natureza e entendendo-a como participante do dia-a-dia das pessoas. Não se trata de naturebismo ou algo assim, é mais sobre entender luares, estrelas, constelações, ventos, fenômenos atmosféricos como marcadores da nossa existência e, a partir disso, tê-los como testemunhas de que estamos aqui, vivendo e morrendo, amando e sentindo saudade. É praticamente instintivo na música que Lô faz.

 

As dez canções de “Não Me Espere Na Estação” foram compostas em parceira, usando as letras escritas por Cesar Mauricio, artista plástico, ex-integrante das bandas Radar Tantã e Virna Lisi. A distinção deste álbum em relação aos trabalhos recentes pode estar no fato de Lô ter elaborado as melodias na guitarra, algo que ele não fazia há tempos. A partir dessa referência, dá pra colocarmos as canções de “Não Pare Na Estação” como “aparentemente simples”, uma vez que suas melodias não são obvias, pelo contrário. O próprio Lô confirma isso: ” só tem duas canções mais palatáveis, que são baladas, e o resto é melodia torta, com harmonia torta, tudo meio surpresa”. Só que esse dado não impede o ouvinte de ouvir e reouvir as faixas do álbum, todas inequivocamente descendentes de suas criações mais celebradas, de “O Trem Azul” a “Equatorial”, passando por “Dois Rios” e “Sonho Real”.

 

As novas criações mantém este nível alto de lindeza, mas há momentos em que Lô mostra que não perdeu o talento de inserir o ouvinte nessa história de vida que parece compartilhada. “Nos Braços do Por do Sol” é uma balada com teclado e guitarra dobrando em meio a uma melodia perfeita de nascença, evocando algo que poderia ser do America ou similar. “Dancei nos braços do por do sol” canta Lô, como se estivesse chegando em Lumiar. “Flutuar” é outro momento iluminado, belo, com ótimas guitarras e sensibilidade habitual. “Retina” já tem guitarras mais psicodélicas e crocantes, que emolduram outra melodia que funciona como o rio correndo pro mar. Por fim, o instrumental “Setentones” é uma das coisas mais psicodélicas que Lô faz em décadas, oblíquo, interessante e surpreendente.

 

Se Lô mantiver essa média de um disco por ano, só temos a ganhar em podermos ver um artista de sua magnitude sendo vertiginosamente criativo e presente. Vivas.

 

Ouça primeiro: “Nos Braços do Por do Sol”, “Flutuar”, “Retina”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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