E o novo disco do …. Kiefer Sutherland?

 

Kiefer Sutherland – Bloor Street

Gênero: Alt Country

Duração: 37:17 min
Faixas: 11
Produção: Chris Lord-Alge
Gravadora: Cookin Vinyl

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

Como ator, Kiefer Sutherland é uma interessante surpresa cantando. Claro que isso é exagero, especialmente na parte referente à capacidade de Kiefer atuar, vide sua presença em filmes como “Linha Mortal” e “Os Garotos Perdidos”, ambos lá do fim dos anos 1980 e início dos 1990. A verdade é que o filho de Donald Sutherland ganhou fama e notoriedade atuando em “24 Horas”, um seriado de espionagem meio picareta, no qual vivia o agente Jack Bauer. Este papel marcou sua carreira, pelo menos aqui no Brasil, pra não falar na atuação mais recente que ele empreendeu, o bonzinho Tom Kirkman, um funcionário de terceiro escalão, que se vê alçado à presidência dos Estados Unidos após um atentado devastador na capital americana sofrível série “Designated Survivor”, veiculada pela Netflix. Foram três temporadas de uma montanha russa de patriotada e acontecimentos inverossímeis, mas tudo bem. Estamos aqui pra falar de “Bloor Street”, o terceiro e bom álbum de Kiefer Sutherland, o cantor e compositor. Em onze faixas bonitinhas, ele evoca os cânones de Tom Petty e Bruce Springsteen, para falar de saudade da família, da infância e de sua Toronto natal, uma vez que a rua que dá nome ao disco é uma das mais conhecidas da cidade.

 

A música é uma paixão recente na vida de Kiefer, que começou sua carreira em 2016. No entanto, ele é um compositor prolífico, lançando agora o seu terceiro trabalho em quatro anos. Em entrevistas recentes, ele disse que foi um ouvinte de rock clássico na infância, mas que se enamorou da música tradicional americana, o country e suas variações modernas, nos anos 1990 e não parou mais de ouvir artistas do estilo e de frequentar rodeios. Durante as filmagens de “Designated”, ele se viu longe de casa por muito tempo e começou a escrever sobre o assunto, quando a pandemia veio dar seus primeiros sinais, no início de 2020, obrigando o isolamento social. Ao longo do período de confinamento, Kiefer escreveu as canções e começou a esboçar o que seria “Bloor Street”, sempre tendo em vista este híbrido de rock e country-folk ianque, que é muito familiar ao pessoal de lá e que respinga no resto do mundo através de gigantes como os já mencionados Petty e Springsteen. Não que Kiefer seja comparável a estes dois mestres, mas sua música certamente visa percorrer os mesmos caminhos de saudade e amor por um cotidiano mais tranquilo, prezando amizade, amor e trabalho sinceros.

 

Em “Bloor Street”, Kiefer se vale da produção de Chris Lord-Alge, uma velha raposa dos estúdios, que já assinou embaixo de lançamentos de meio mundo, garantindo a pegada rock necessária, mas sem perder de vista a suavidade e a doçura. Todas as canções do álbum têm esse elemento pop que gruda no ouvido e a voz de Sutherland convence pela sinceridade. Em “Chasing The Rain”, por exemplo, ele baixa o tom em busca de uma narrativa mais sofrida e consegue fazer isso em meio a um bom arranjo com guitarras e pianos. Mas é nas levadas mais próximas do que Tom Petty fazia em seus últimos discos que Kiefer consegue erguer os maiores feitos de “Bloor Street” e ele começa a fazer isso já na faixa-título, que abre o disco. Uma levada bem feita de guitarra que se abre num refrão grudento, feito sob medida para as ondas do rádio. Em “Going Down”, outra canção com levada aerodinâmica, Kiefer vai conduzindo a melodia com segurança, mostrando que tem a manha para cantar e carisma como compositor.

 

Além das influências de Bruce e Tom, há uma certa dose de Fleetwood Mac aqui e ali, o que dá ao disco este tom mais pop. As canções vão se sucedendo com boas soluções de arranjo, como o ataque de guitarras sutis em “Two Stepping In Time”, os violões dedilhados de “So Full Of Love”, o piano mais confessional que evoca tons springsteenianos setentistas em “County Jail Gate”, que fala sobre um sujeito que saiu da cadeia em busca de redenção. E o rock mais limpo e direto, que se manifesta em “Goodbye”, por exemplo, mostra que Kiefer tem recursos para ser bom vocalista e conferir personalidade a suas próprias canções. “Down The Line”, uma típica canção mais pendente pra o country, com violinos e acordeões, novamente mostra o afeto de Kiefer por esta vertente mais tradicional do estilo, num bom dueto com Eleanor Whitmore.

 

Não se engane: Kiefer Sutherland ainda não é uma figura com muito costado no ofício da música mas tem um talento inesperado. Se você quer um disco com onze boas canções e aquele capinzinho no canto da boca, “Bloor Street” pode ser uma boa opção.

 

Ouça primeiro: “Bloor Street”, “Down The Line”, “Chasing Rains”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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