A Sertania Nordestina de Luiz Gonzaga e o Brasil que não se destrói

 

 

Luiz Gonzaga tinha tudo para viver a vida-destino das pessoas pobres do sertão do Nordeste, mas carregava no peito sonhador, apaixonado por música e pelas andanças, a vontade de deixar o sertão do Recife e ganhar o país. Das suas léguas percorridas, dos calos nos dedos de segurar sanfonas e carregar seus sonhos até o destino como um dos maiores músicos do país surgiu a concepção do espetáculo “Sertania Nordestina- As léguas tiranas de Luiz “Lua” Gonzaga”, por Claudio do Vale, ator nascido e criado em São José dos Campos, no Vale do Paraíba.

 

 

Claudio explica o espetáculo como Teatro Popular Brasileiro e divide o palco por uma hora com o trio de músicos Denilson de Paula, Gileno Borges e Eliomar Landim em uma contação-repente-cantoria da vida do Gonzagão, começando pelo encontro e casamento de seus pais Ana e Januário, seu nascimento em Exu, dando um passeio pela sua ida para o Rio de Janeiro, seu primeiro trabalho na Rádio Nacional como cantor, o sucesso e o fim da vida.

 

 

O caminho até a Sertania é para Claudio quase sagrado, espiritual e se abriu aos seus olhos nos anos 90, quando ele encontrou em uma caixa que pertencia ao pai uma fita com algumas músicas gravadas por Luiz Gonzaga. Ainda que não fosse grande conhecedor de sua obra,  sentiu que poderia criar de uma homenagem ao pai uma também homenagem a um dos artistas que fez a música brasileira ser potência, imensa, pulsante.

 

 

A peça se transformou durante seus mais de 20 anos de vida, desde a estreia em agosto de 1999, quando a morte de Luiz Gonzaga completava 10 anos. Inicialmente seu formato seguia a estrutura de declamação.

 

 

Conhecedor e vivente da arte, Claudio explica com naturalidade o trânsito da fala para a cantoria, a música que agora faz companhia a ele e seu preparo admirável de voz e corpo. Para tal movimento contou com a ajuda de livros essenciais para conhecermos a figura do Gonzagão, como A vida do viajante: a saga de Luiz Gonzaga, escrito pela jornalista francesa e pesquisadora da música brasileira Dominique Dreyfus e lançado em 1996 pela Editora 34.

 

 

Alguns companheiros que Claudio encontrou neste resgate da cultura brasileira foram embora, outros permaneceram, mais alguns chegaram e hoje sua apresentação é voz, música e vida em todos os seus elementos cênicos, do cenário aos instrumentos, a bandeira do Brasil, ao chapéu que Claudio que ele carrega na cabeça e nas mãos.

 

 

Sertania Nordestina foi levada até quem quisesse ver e ouvir as belezas do cancioneiro brasileiro. Após ser contemplada pela LIF, Lei de Incentivo Fiscal à Cultura, a peça foi encenada em 300 escolas no estado de São Paulo. Em cada uma delas, principalmente entre os alunos do EJA era possível notar a alegria, a emoção que toma um espectador quando ele vê em um palco um pouco da sua própria história.

 

 

Emoção que transborda de Cláudio quando ele fala do seu desejo de levar de novo tanta alegria para nosso povo que anda sendo obrigado a esquecer que ela é possível.

 

 

Em 2000, ele recebeu o prêmio de melhor ator no Mapa Cultura Paulista e a peça parou suas exibições entre 2008 e 2013. Em outubro Sertania foi transmitida na 35 edição do Festivale, o festival de Teatro do Vale do Paraíba, que esse ano priorizou os grupos da cidade de São José dos Campos.

 

 

Uma peça que nutre as nossas raízes dentro de um festival que preza por elas: a arte sendo significativa em todas as suas funções.

 

 

Generosidade é a palavra que para Claudio melhor define Luiz Gonzaga. Entre todas as contradições que viveu durante sua passagem pelo nosso país, nosso planeta, em sua vida familiar, Gonzagão se armou dela para levar alegria ao seu povo, fosse com melhorias que lhe proporcionasse dignidade, ou com sua voz, seu chapéu de couro, as roupas de quem nunca esqueceu onde nasceu e nem do primeiro solo em que seus pés pisaram E é claro, toda a ajuda que deu aos artistas que apadrinhou, como Dominguinhos.

 

 

Qualidade essa que podemos estender ao próprio Claudio, um brasileiro nato, de poesia nos pés, no corpo e na voz, que fez da caixa de memórias do seu pai uma ode à arte brasileira, que apanha, luta, resiste e nunca perde a sua força e majestade.

 

 

Viva Gonzagão, Viva Cláudio do Vale.

 

 

Nesse link vocês podem conferir a peça, em sua transmissão pelo FESTVALE:

 

Debora Consíglio

Beatlemaniaca, viciada em canetas Stabillo e post-it é professora pra viver e escreve pra não enlouquecer. Desde pequena movida a livros,filmes e música,devota fiel da palavras. Se antes tinha vergonha das próprias ideias hoje não se limita,se espalha, se expressa.

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