Três Resenhas: Warpaint, Belle And Sebastian e Artur Araújo
Warpaint – Radiate
(Virgin)
41′, 10 faixas
O quarteto californiano Warpaint pertence à geração de bandas 2010, que recicla a reciclagem do pós-punk oitentista, misturando elementos que podem lembrar Joy Division e, digamos, Slowdive. Tem um aceno evidente para experimentalismos que sempre passam longe da dificuldade e não exigem muito do ouvinte. A ideia que o grupo passa é de propor um transe pela música, pela dança. Lembra também bandas como Luna e recicladores do Velvet Underground com um apelo mais viajante, ou seja, é uma música quase abstrata, mas que, quando menos se espera, te induz a bater o pezinho. As quatro integrantes do grupo – Jenny, Emily, Stella e Teresa tocam com a certeza do conhecimento total e da antecipação do que cada uma pode fazer com seu instrumento.
De cara, “Champion”, abrindo o disco, é uma das grandes canções de 2022. Etérea, aos poucos vai caindo na Terra, puxando o ouvinte para um plano menos abstrato e mais objetivo. No caldeirão do Warpaint cabe a batida quebrada de “Hips”, a trama intrincada de “Hard To Tell You” e o apelo pop – com ressalvas, claro – de “Stevie”, que é um dos singles. “Altar” e “Send Nudes” também são ótimas e mostram uma banda com identidade e caminho bem claro. Depois de um hiato de seis anos, o Warpaint voltou com um de seus melhores trabalhos. Ouça e conheça.
Ouça primeiro: “Champion”
Belle And Sebastian – A Bit Of Previous
(Matador)
48′, 12 faixas
Veja só como o tempo passa. “A Bit Of Previous” é o décimo primeiro álbum da carreira do Belle And Sebastian, que já dura 26 anos. Sim, isso mesmo. Os escoceses surgiram como uma delicada luz indie em meio ao rock alternativo de guitarras dos anos 1990 e, desde então, reaparecem de tempos em tempos para dar sua versão musical do que está acontecendo por aí. Ainda liderados por Stuart Murdoch, o Belle veio mudando sua sonoridade ao longo do tempo, adicionando mais elementos e mais força. Quando digo “força”, não me refiro a peso ou guitarras altas, mas a detalhes que trouxeram mais foco e personalidade às canções. Aliás, pode conferir: em todo disco do grupo há, pelo menos, umas duas ou três ótimas composições, que mostram o quanto os sujeitos têm a manha na hora de escrever e pensar em detalhes bacanas.
“A Bit Of Previous” é um desses álbuns que a gente ouve fácil, tudo funciona. Mas ele cansa no fim do percurso, justamente porque é tudo muito bonitinho e fofo demais. Aliás, esse sempre foi um problema que pairou sobre as obras do grupo desde o início. Dá, no entanto, para contornar essa fofura exuberante e excessiva prestando atenção na criatividade dos arranjos vocais e instrumentais, que seguem muito bons. Detalhes de belezura são mais ricos em “If They’re Shooting You”, na “raivosinha” “Unnecessary Drama” e na melhor canção do álbum, “Come On Home”, na qual o Belle flerta timidamente com sonoridades da Motown e se sai como o Beautiful South ou uma versão light do Style Council.
Ouça primeiro: “Come On Home”
Artur Araujo – Morada dos Ventos
(Tratore)
43′, 10 faixas
Artur é cearense e mudou-se pra Minas no meio da década de 2010. Primeiro em Ouro Preto, depois em Belo Horizonte, ele parece ter absorvido boa parte da identidade musical do estado, algo que fica evidente em seu disco de estreia, “Morada do Vento”. Mas dizer que este é “mais um trabalho inspirado no ‘Clube da Esquina'” é ser reducionista demais. Artur tem a manha para misturar toques sutis de jazz nas canções, de forma muito elegante e que exige conhecimento e sensibilidade. Em “O Fim da Noite”, terceira faixa do disco, há um improviso de piano jazzístico perto do fim da canção que surpreende e chama a atenção do ouvinte. Em alguns momentos, seu canto chega a lembrar Djavan, noutros, mostra uma personalidade muito bem definida.
Com destaque para a excelente banda que o acompanha, além da participação de Toninho Horta na canção “Belo Horizonte” (a mais bela por aqui) o álbum tem um sentimento de empatia e sensibilidade, falando de amor, saudade, experiência e muito do que o músico viveu até aqui, especialmente sua mudança de um estado para outro e como isso impactou em sua vida. As sonoridades que Artur alcança em “Morada dos Ventos” é singela, muito bonita e que acena para tempos mais gentis e ternos. Que seja assim.
Ouça primeiro: “Belo Horizonte”
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.