Midnight Oil chama as novas gerações pra luta

 

 

Midnight Oil – Resist

Gênero: Rock alternativo

Duração: 61 min
Faixas: 12
Produção: Warne Livesey
Gravadora: Sony

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

Não fosse pelo EP “The Makarrata Project”, lançado há um ano e meio, o Midnight Oil seria uma banda sem nada de novo desde 2002. O grupo esteve na estrada em 2017/18 – passou até pelo Brasil – e parece ter retomado o gosto pelo estúdio e pelas canções inéditas, fato que se reflete neste novo “Resist”, seu décimo-segundo álbum de material original, descontando coletâneas e discos ao vivo. Mas os velhos fãs não devem se animar muito, visto que este é o último trabalho que Pete Garrett e seus amigos lançam. O Oil vai se aposentar devidamente, com ares surpreendentemente tristonhos para um grupo tão engajado politicamente. Não tem nada a ver com maturidade ou desistência de pontos de vista, os caras sempre serão progressistas e engajados nas questões referentes ao clima e aos direitos dos povos originários da Oceania, mas, uma olhada para o presente – que já foi futuro – vai mostrar que, sim, a gente está perdendo a luta pela manutenção do planeta e temos a certeza de que, se algo não for feito imediatamente, o modo de vida que temos hoje – ainda imperfeito que só – não será possível em vinte, trinta anos. E os integrantes do Midnight Oil sacaram isso e admitem, neste disco, que a luta continua, mas não é mais privilégio deles e de sua geração. A galera mais jovem precisa tomar seu lugar no embate.

 

A gente sabe que a juventude planetária tem se mobilizado bastante nas questões que envolvem uma nova noção de meios de produção, trabalho, remuneração e, em meio a tudo isso, um maior respeito pelo planeta. Porém ainda é pouco para causar alguma transformação de fato. Além disso, sempre há o risco de governantes inescrupulosos do estilo bolsonaro e trump que, em nome da manutenção de um status quo de poucos, incentivam a submissão absoluta de recursos e gente menos favorecida, o que vem arruinando a humanidade há décadas. Tudo isso está contido neste álbum de doze canções e a maestria da banda está em te conscientizar sem que você precise sair por aí. Pelo contrário, Garrett e sua turma te apresentam fatos e a interpretação deles em relação a isso. Você aceita ou não, mas, do jeito que eles defendem essas bandeiras há mais de quatro décadas, é impossível não acreditar, se comover e, por que não, se aliar.

 

Quando Garrett canta uma faixa como “Rising Seas”, abrindo o álbum, ele admite que estamos perdendo a partida que vai decidir nosso futuro. Fala sobre o risco que já se transformou em fato e passa a bola para os mais jovens os colocando como sujeitos dessa mesma luta. Sim, porque o planeta é de todos, especialmente de quem ainda vai viver nele por muito tempo. Os mais velhos, por ordem natural das coisas, deixarão a Terra para quem novas e novíssimas formas de sobrevivência sejam instauradas. Deixando o discurso um pouco de lado e adentrando na parte musical, é o velho Oil de tantas glórias e tradições. O rock’n’roll bem urdido, com ótimas guitarras de Jim Moginie e Martin Rotsey, que cortam e aparam solos e linhas melódicas com facilidade e destreza. O baterista Rob Hirst segue com sua pegada habitual, bem característica e o desfalque fica por conta de Bones Hilman, baixista fundador da banda, que morreu vitimado por um câncer, mas deixou seus últimos registros nas faixas  de “Resist”. Ou seja, trata-se de um álbum 100% Midnight Oil, que soa como um amigo que não vemos há tempos.

 

Belezas sonoras estão por todos os cantos. Além de “Rising Seas”, temos uma admirável “The Barka-Darling River”, que começa com a levada tradicional da banda, mas interrompe tudo lá pelo meio da canção, mudando totalmente para uma espécie de blues sob a luz da lua, com Garrett vociferando em meio a violões e pianos. Temos a dinâmica de faixas como “Reef”, “Lost At Sea” ou a pesadinha “At The Time Of Writing” são apenas alguns dos destaques neste trabalho, que surge num momento em que, sim, precisamos de discos assim. Fechando os trabalhos, a dedilhada e climática “We Are Not Afraid” e a épica “Last Frontier”, apropriadas e redondíssimas.

 

O Midnight Oil, cujo primeiro álbum data de 1978, seguiu até aqui com uma imaculada força de expressão e um público fiel. Após lutar pelos aborígenes, pelos direitos dos mais pobres e pela defesa da ecologia, fazendo isso sempre com grande música, os caras se retiram de cena. Bravo.

 

“Rising Seas”, “Reef”, “Last Frontier”, “The Barka-Darling River”

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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