Luxemburgo no Chili Peppers, Frusciante no Palmeiras

 

 

Ontem eu disse no Facebook que a Célula Pop não daria a notícia da volta de John Frusciante à titularidade das seis cordas no Red Hot Chili Peppers. Miseravelmente eu cedi à pressão da demanda pelo assunto mas, no meio do processo de capitulação ao sistema, pensei que seria bom alguém desafiar o coro dos contentes, das pessoas que estão animadas como se estivéssemos em 1991. Frusciante no Red Hot Chili Peppers é a mesma coisa que Vanderlei Luxemburgo no Palmeiras. Ambos tiveram glória no passado, perderam o bonde da história e vivem à sombra do mito que criaram. Agora, num movimento de anti-modernidade, voltam às suas posições de outrora, para delírio dos conservadores.

 

Pessoalmente – e este é um texto pessoal – eu nunca fui fã da banda californiana. Claro, achei legais algumas gravações aqui e ali e considero que “One Hot Minute”, disco de 1995, é seu melhor trabalho lançado até hoje, justamente porque eles tentavam ali uma mudança de curso, uma ampliação do espectro funk-rock que lhes havia feito famosos. Com a presença de Dave Navarro, ex-Jane’s Addiction, houve uma alquimia estranha, uma promessa de surgimento de algo novo. Navarro dera um pouco mais de peso e conhecimento de causa para a guitarra, fazendo-a transitar entre os eixos setentista e noventista com desenvoltura. Mas não rolou. John Frusciante, que entrou aos 18 anos na banda, justo para gravar o seu disco de mudança de status, “Mother’s Milk”, de 1989, surfou esta onda de glória. Era ele que estava lá quando o grupo surgiu na MTV mundial com a cover de “Higher Ground” e, dois anos depois, quando arrombou a banca, fazendo frente ao grunge com seu quarto álbum, “Blood Sugar Sex Magic”, que rendeu uma fornada de hits aos Chili Peppers.

 

Desentendimentos internos e problemas com drogas afastaram John do grupo, justo quando Navarro entrou em campo para gravar “One Hot Minute”, mas novas brigas e quiprocós o tiraram de cena, muito porque Frusciante decidira voltar (recuperado, com a ajuda dos outros integrantes, especialmente o vocalista Antony Kiedis) e participar da concepção e gravação de outro monstro de hits, o álbum “Californication”, de 1998. Este trabalho marca a tal mudança de parâmetro que o anterior parecia acenar, mas se o disco de 1995, com Navarro, apontava para um caminho de novas experiências sonoras, o que se ouviu em 1999 foi uma espécie de bundamolização do som da banda. As guitarras de Frusciante nas participações anteriores, capazes de mesclar peso e suíngue chacundun funkeiro, encarnou um miado rock que soou como uma espécie de encolhimento das possibilidades das canções. Coisas como “Scar Tissue”, “Otherside” e a faixa-título, vieram mostrar uma “nova banda”, mais afeita aos padrões pop, o que se traduziu pelo enorme sucesso de público.

 

Com Frusciante à frente, os Chili Peppers se mantiveram ativos, porém nunca mais emplacaram um grande disco. A sonoridade domesticada, que intercalava hits à meia-bomba e viagens instrumentais frusciantes, moldaram a identidade do grupo. Sem mais aviso, John novamente deixou o grupo em 2009, colocando em seu lugar o amigo Josh Klinghoffer. Agora, dez anos depois, ele volta. Haja saco.

 

Os fãs anseiam pela reedição daquele 1999, que ocorreu HÁ VINTE ANOS. Outros, mais informados, porém, não menos iludidos, querem a reedição daquele 1991, que já está VINTE E OITO ANOS NO PASSADO. Já deveriam saber que Frusciante é, como se dizia no Rio da época, “pipa avoada”, ou seja, é instável e estranho. Ele acrescenta um potencial experimental ao Red Hot, mas que nunca chegou a ser aproveitado favoravelmente. Os shows do grupo tornaram-se grandes, enormes sessões de piadas internas, execuções cansadas dos hits e se justificam mais como um exercício de nostalgia do que qualquer outra coisa. Agora, com o retorno de John, esta tendência só aumenta. Enquanto isso, o último disco lançado pelo grupo, o bom “The Getaway”, segue quase ignorado pelos fãs mais tradicionalistas do grupo.

 

Segundo informações da imprensa americana, o grupo está em fase inicial de produção do próximo disco. Há quem espere essas reedições do passado mencionadas acima. Se alguma faixa tiver a surpreendente força de “Go Robot”, do último trabalho, já terá valido a pena. No mais, Frusciante é aquele sujeito que parece em busca de um “pojeto pofixional” nos Chili Peppers. Exatamente como Vanderlei Luxemburgo no Palmeiras. Poderiam inverter as posições e colocar o velho Luxa nas seis cordas. Eu iria ao show.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

One thought on “Luxemburgo no Chili Peppers, Frusciante no Palmeiras

  • 16 de dezembro de 2019 em 12:03
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    O futuro já chegou e foi embora. Logo não há modernidade nenhuma a se buscar. Rock, hoje, é coisa bem comportada, para pessoas de meia idade em saraus no Delirium ou na Praia de São Francisco. Só!

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