Moby – All Visible Objects
Gênero: Eletrônico
Duração: 72 min.
Faixas: 11
Produção: Moby
Gravadora: Lab 344
Moby tem vivido uma maré de grande inspiração. Lançou três versões de um álbum em 2018 – o ótimo “Everything Was Beautiful (And Nothing Hurts)” – soltou um disco com mais de quatro horas de sons para meditação, gravou com The Pacific Void Choir um outro trabalho, “Fast Songs About The Apocalipse”, sem falar em remixes, versões, um livro – “Porcelain” – enfim, tudo isso sem mencionar o constante ativismo do sujeito em defesa dos animais, da causa vegana, dos direitos humanos e, ufa, a gerência de um restaurante/empório especializado em alimentos e produtos sem uso de substâncias de origem animal. Quando a gente pensa que ele vai descansar um pouco, ele ressurge com um novo disco, o bom “All Visible Objects”, no qual procura recuperar um pouco das sonoridades dançantes do passado recente. E se sai bem.
Vocês lembram, Moby surgiu lá em meados dos anos 1990 como um dos protagonistas da cena eletrônica daquela década. Rapidamente foi absorvido pelos grupos e artistas ingleses e ficou meio de lado, num caminho próprio, fato que lhe garantiu sobrevida no século 21. Até hoje os fãs estão esperando por algo próximo de “Play”, seu magnífico trabalho de 1999, no qual ele usou blues e outros ritmos ancestrais para fornecer os samples para as faixas. Aqui, em “All Visible Objects”, ele não faz isso ao pé da letra, mas há um cuidado em tratar bem os beats eletrônicos com sonoridades acústicas e inesperadas, com muito uso de sampling. É uma visão de eletrônica já datada, mas ainda com muito charme e eficiência. E Moby não deixou de ser um sujeito talentoso na engenharia das faixas e produção. Ele manda muito bem.
O que dá uma cor diferente ao disco é a aura consciente de que o mundo foi para o buraco e só nos resta protestar e tentar reverter a situação. Não é um álbum de “aviso”, na base do “se não fizermos isso, perderemos o mundo para eles”, é mais um “ferrou, temos que nos mexer agora” e isso faz toda a diferença. O single “Power Is Taken”, que tem participação de D.H Peligro, baterista do Dead Kennedys, enverga os versos: “We who hate oppression / Must fight against the oppressors / Power is not shared / Power is taken”, num claríssimo movimento em direção a uma postura muito bem definida – e necessária. A faixa é propulsionada por batidas em ritmo rápido, em que o refrão é repedido como um mantra. Funciona bem. Outras canções têm beleza própria dentro do espectro de sons que a música eletrônica pode proporcionar.
“One Last Time”, por exemplo, tem belos usos de vocais e cordas em meio a uma levada funky que chega a surpreender. O efeito é belo e contrasta com o clima mais sombrio de “Refuge”, com batidas mais serenas e camadas de sintetizadores sobrepostos. “Rise Up In Love” já é uma canção com viés contemplativo e lento, mas que não abre mão da abordagem “para as pistas”, com teclados e batidas sintéticas. Apesar disso, “Too Much Change”, a faixa-título e “Separation” evocam os tons mais sombrios dos trabalhos mais recentes de Moby, equilibrando um pouco o passado e o presente.
Moby segue ativo e pensante. Este é o seu décimo-sétimo trabalho e há uma inegável beleza nas canções nele contidas. Ele mostra que pode se reinventar, mas também não esquece seus primeiros passos – e seus tempos de maior êxito comercial. Um bom disco, sem falar que cada faixa foi designada pelo músico para ajudar uma entidade beneficente diferente, sempre atuando em temas caros a ele. Uma baita iniciativa.
Ouça primeiro: “Power Is Taken”
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.