Djavan – Produtivo e operante

 

 

 

 

Djavan – D
54′, 12 faixas
(Sony)

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

 

Se engana quem pensa que Djavan é um desses artistas que pararam de produzir e vivem do passado. Com uma obra elegante, numa carreira que já conta com 26 discos, o cantor e compositor alagoando segue dono de uma das marcas sonoras mais características da música brasileira e ainda é um mestre no domínio das linguagens do funk e jazz americanos dos anos 1980, aplicando-a às suas canções cheias de classe e beleza. A obra de Djavan é tão versátil que ele foi homenageado pelo trio de pop Melim em um álbum chamado “Deixa Vir do Coração”, lançado ano passado. As novas gerações que ouvem o grupo certamente tiveram acesso a canções como “Se”, “Outono” e “Lilás”, todas incluídas no álbum. Além disso, Djavan lançou um belo álbum em 2018: “Vesúvio”, no qual, além de duetar com o uruguaio Jorge Drexler, gravou uma das canções mais belas de sua trajetória: “Solitude”, que até entrou na lista de melhores faixas nacionais daquele ano. Agora, Djavan lança outro álbum de inéditas, “D”, no qual mantém esse pique.

 

 

Produzido, dirigido e arranjado – em sua maioria – pelo próprio, “D” é um álbum padrão da carreira de Djavan a partir dos anos 1990, mais precisamente, de “Coisa de Acender”, seu vencedor trabalho de 1991. A tal mescla com estilos americanos segue presente, o amor e a vivência mantém sua condição de temas principais e a leveza do toque de Djavan ao violão também está presente. Os arranjos, luxuosos e de ótimo gosto, emolduram as composições com graça e o resultado é sempre interessante. Para tudo isso funcionar, é preciso que ele esteja com uma boa safra de canções, algo que aconteceu em “Vesúvio” e que segue em “D”. A voz apresenta um ou outro efeito do passar do tempo, mas, ora, quem nunca? E, ainda por cima, “D” tem um fato histórico bem importante – a presença de Milton Nascimento em “Beleza Destruída”, segundo single do álbum, a primeira colaboração entre os dois em todos os tempos.

 

 

Mas esta, apesar de ser uma bela faixa, não está entre as melhores de “D”. A abertura, logo com “Primeira Estrada”, talvez seja o que há de mais belo por aqui. A poética abstrata de Djavan – outra marca registrada de suas canções – está presente e o arranjo é belo, elegante e capaz de evidenciar belo uso de metais e uma levada quase em câmera lenta, com direito a um belo solo de guitarra, cortesia de Max Viana, filho do homem. A seguir, outro colosso, “Num Mundo de Paz”, primeiro single do álbum, novamente cheia de guitarras elegantes e dona de um arranjo cheio de groove, lembrando até algo que poderia estar num disco de Sade. Essa fluência aparece em vários momentos ao longo de “D”, como, por exemplo, em “Camisa Vazia”, que tem a levada característica dos grandes sucessos de Djavan, como “Linha do Equador”. Este também é o caso da ótima “Sevilhando”, com ótimos teclados, discretíssimos, mas que marcam o andamento com precisão. Nela está o momento “djavanear” do álbum, no verso: “Queria sândalo, mas também podia ser camomila, ou mesmo lavanda ou vanila, pra enfrentar o viver”.

 

 

“Quase Fantasia” é uma outra faixa suingada, mas que exibe o tempero de um piano floreando detalhes latinos e simpáticos, enquanto “Eh, Eh” é um samba cadenciado, meio bossa, que é parceria com Zeca Pagodinho e que já teve gravação prévia de Alcione. O fecho vem com a ótima “Iluminado”, com participação dos filhos de Djavan – Max, Flavia Virginia, João e Sofia – todos vocalizando, arranjando e tocando. A canção é, sem trocadilhos, luminosa por natureza e exalta um clima otimista de união fazendo a força. “Tudo é possível como um dia de sol, é jogar o anzol e esperar para ver o que vem”. É emocionante a trama de vocais de Djavan e dos filhos, especialmente para quem acompanha o artista há bastante tempo.

 

 

“D” é um trabalho que dialoga tanto com os fãs que conheceram Djavan através de canções como “Se” ou “Eu Te Devoro”, mas também tem carinhos e beijinhos para quem o acompanha desde “Flor de Liz” e “Sina”. É totalmente digno de figurar entre os bons lançamentos de uma carreira com altíssimo grau de acertos.

 

 

Ouça primeiro: “Sevilhando”, “Iluminado”, “Num Mundo de Paz”, “Primeira Estrada”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *