Built For Spill segue fiel ao rock americano de guitarras

 

 

 

 

Built To Spill – When The Wind Forget Your Name
45′, 9 faixas
(Sub Pop)

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

 

Os anos 1990 têm uma quantidade de bandas e artistas imensa, prontos para ser (re) descobertos. Por conta do sucesso e da exposição, a maioria dos fãs ocasionais de rock pensa que a década se dividiu entre grunge, britpop e, correndo por fora (para eles) a música eletrônica e o hip hop. Mas, além dessas caixinhas, havia um rótulo mais abrangente chamado “rock alternativo de guitarras”, eminentemente americano, que poderia comportar gente distinta como Sonic Youth, Pavement e Dinosaur Jr, entre muitos outros. E, com o passar do tempo, ficou claro que nesta grande caixa estavam os maiores tesouros sonoros daquele tempo, entre os quais se insere, com louvores, o Built To Spill. Ativo ao longo de quase trinta anos, o grupo tornou-se naturalmente o veículo criativo de Doug Martsch, guitarrista marcante e arquiteto sonoro com registro vocal muito próximo de ninguém menos que Neil Young.

 

 

“When The Wind Forget Your Name” tem uma história curiosa. Em 2019, Doug preparava uma nova reencarnação do Built For Spill para uma excursão ao Brasil, quando conheceu Lê Almeira e João Casaes, sujeitos muito atuantes no underground nacional, que se tornaram então a encarnação do BTS então vigente. O trio então fez shows tocando a totalidade do ótimo álbum de 1999, “Keep It Like A Secret” e, quando terminaram os shows, foram para o estúdio e registraram o que seria este novo álbum. Com a chegada da covid-19, Lê e João ficaram presos no Brasil e Doug foi terminar mixagem e outras etapas do álbum, que, só agora vê a luz do dia. Quem conhece o Built For Spill sabe que há vários trabalhos maravilhosos lançados por Martsch, que chegou a gravar um disco apenas com versões do músico americano Daniel Johnston em 2020, o belo e sentido “Built To Spill Plays The Songs Of Daniel Johnston”, que acabou servindo como o “disco de pandemia” oficial do grupo.

 

 

A belezura de “When The Wind Forget Your Name” está em mostrar como Doug conseguiu manter intacta sua fórmula sonora – guitarras doces que se transformam em trovões violentos em curto espaço de tempo – sendo favorecido pela maturidade naturalmente alcançada com a idade. A base do clássico rock alternativo noventista de guitarras, que se prolongou para os anos 2000 em casos específicos, está toda lá, devidamente refrescada pela pegada respeitosa e afetuosa de Almeida e Casaes. A presença deles confere um ar fresco ao som típico da banda, além de alguns toques psicodélicos aqui e ali, que são, sim, algo novo. Porém, como em todo disco que o BFS lançou até hoje, o brilho vai para as belas canções que Doug continua a compor.

 

 

“Gonna Lose”, que abre o álbum, é um clássico – e curto – rockão alternativo mais clássico, com guitarras pesadas, bateria nervosa e aquela dinâmica meio lenta, meio rápida, com a voz anasalada à la Young fazendo a ligação dos pontos. A psicodelia sessentista novidadeira chega em canções como “Fool’s Gold”, que se movimenta sem pressa em meio a boas viradas de bateria e detalhes belos no teclado. Assim também são “Understood” e “Elements”, sendo que a última tem tempo para dedilhados belos na guitarra, outra marca registrada de tempos idos. Os vocais mixados parecem cair das nuvens, num belo efeito. Mas é com “Rocksteady” e, especialmente, com “Spiderweb”, que o disco chega ao ápice. Ambas as canções mostram detalhes sonoros do grupo – guitarras dedilhadas, dinâmica de bateria e a oposição entre agressividade e doçura – tudo muito bem pontuado, sendo que “Spiderweb” é uma clássica canção com o padrão BTS, que dá aquela impressão de que perdemos de vista muita coisa boa por aí. Foi a avalanche de dados, as toneladas de informação ou apenas a vida que ficou mais difícil e rápida, muito além dos MTV 120 Minutos das madrugadas? Fechando o disco ainda temos o trio de belezinhas “Never Alright”, “Alright” e “Comes A Day”, uma daquelas canções longas que Doug faz de quando em vez.

 

 

“When The Wind Forget Your Name” é um discaço desses que vão passar despercebidos, mas que vão fazer os velhos fãs suspirarem com mais sentimento enquanto ajustam suas contas com o futuro que não se concretizou do jeito que devia. Quem nunca?

 

Ouça primeiro: “Spiderweb”, “Rocksteady”, “Never Alright”, “Elements”

 

 

 

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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