Guloseimas Capciosas

 

Quem segue meu perfil pessoal no Facebook já deve saber que hoje, de manhã de cedo, fui, com minha mulher, na padaria da esquina de casa, para tomar café. É algo raro, seja pelo preço meio salgado do estabelecimento, seja pela circunstância. Pois bem: ela pediu pão na chapa com café preto e eu, gordo que sou, pedi um italiano e … uma bebida de … Danoninho. Explico: há um tipo específico de gordo que tem a mente aguçada por guloseimas novidadeiras. É pior quando a pessoa, além do excesso de peso, tem um paladar infantilizado, que é o meu caso. Ainda acho vantagem em balas e vários tipos de lanches de fast food, mas isso é um assunto para um outro texto. O fato é que eu fui experimentar a tal bebida de Danoninho, feita com … amêndoas e cacau. Um descuido na leitura da embalagem me custou 2,90 reais, porque o sabor era muito, muito ruim. Depois da primeira golada, vi que a bebida “láctea” não tinha leite, sendo feita 100% à base de amêndoas. Repito: era muito ruim.

 

Tal fato me fez pensar. O que o velho Danoninho, que costumava ser anunciado na TV como “queijo petit-suisse com frutas” tem a ver com essa coisa que bebi hoje? Exato: nada. Nada a ver. Sabemos que é muito mais fácil para a Danone, empresa multinacional catalã-francesa, instalada no Brasil há décadas, lançar um novo produto com um velho nome, certo? Ou com uma nova marca. Deve custar mais dinheiro e impor mais riscos, portanto, nada melhor que usar um nome do passado, já fidelizado e sedimentado na mente dos consumidores para batizar algo que nada tem a ver com a história da marca. Porque, ora bolas, nunca houve um Danoninho sem leite.

 

Isso não é novo, claro, mas se intensificou nos anos 1990. Várias guloseimas passaram a exibir nomes de outras, ampliando assim, o escopo de vendas dos produtos. Picolé de Chambinho, milkshake de Ovomaltine, sorvete de Oreo, sucrilhos de Nescau, bebida de Galak, Nescau de cerais integrais, sempre o novo item do mercado exibe formato distinto do original da marca que lhe dá nome, mostrando que, sim, a indústria da propaganda aposta numa espécie de estratégia conservadora para explorar a afeição do público com algo que já exista há tempos. Até pasta de dentes com carvão ativado, shampoo de minerais do Mar Morto ou pão integral com cereais ancestrais, tudo é motivo para o marketing de produto exercitar sua criatividade, mesmo que seja de uma forma conservadora.

 

A estratégia parece, a meu ver, que não sou formado na área, uma forma explícita de enganar o consumidor ou, no mínimo, induzí-lo a uma confiança no nome, em detrimento de uma percepção mais apurada do que está comprando. Veja o meu próprio caso de hoje: li “Danoninho” na embalagem e isso me bastou para acionar meu desconfiômetro sobre a bebida, julgá-la “boa para consumo” e comprá-la. Serviu para perceber que, além de totalmente diferente da proposta que a marca sugere, a tal bebida tem sabor e proposta que vão na direção oposta: a ideia de algo sem leite vai de encontro a uma certa consciência alimentar que passa por intolerância à lactose e uma preocupação adjacente com a sustentabilidade. Resumindo, é um produto “consciente”, que “faz bem” e vai de encontro ao público-alvo: as crianças. Talvez o problema seja meu, que, aos 49 anos, ainda acho uma boa ideia comprar tal produto.

 

Só para contrabalançar a crítica negativa, é bom que se diga que a bebida láctea do Galak também é ruim. Talvez aí seja porque eu não considero que chocolate branco seja, de fato, chocolate. É aguada, tem gosto de baunilha e é muito doce. O Tal Nescau com cereais integrais custa o dobro do preço do normal, portanto, por questões de crise econômica, ainda não pude experimentar para dar meu veredito. O fato é que as prateleiras do supermercado e das padarias em geral exibem um festival de contos do vigário à espreita, apenas esperando pelo próximo … consumidor? Gordo? Otário? Todos juntos? Você decide.

OBS: é uma clara manifestação de gosto pessoal dizer que o tal Danoninho de amêndoas “é ruim”. Claro que o produto tem um público definido e deve atendê-lo de forma apropriada.

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

One thought on “Guloseimas Capciosas

  • 4 de outubro de 2021 em 13:55
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    Querido, DANONINHO é uma MARCA, não um PRODUTO.
    E, que bom que alguma empresa se voltou para as crianças alérgicas.
    Aliás, desde sempre a embalagem vem escrita “BEBIDA 100% VEGETAL”.

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