Yusuf/Cat Stevens paira sobre o mundo em novo disco

 

 

 

Yusuf/Cat Stevens – King Of A Land
43′, 12 faixas
(BMG)

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

 

Pode não parecer aos mais jovens, mas Yusuf, quando atendia pelo nome de Cat Stevens, era um dos maiores popstars do planeta Terra. Lá na primeira metade dos anos 1970, seu show, seus álbuns, sua presença eram tão disputados como os de um Paul Simon ou um George Harrison, sem qualquer exagero. Sua voz marcante, sua facilidade para escrever belas melodias e letras profundas eram diferenciais num mercado competitivo, que dava a chance de surgirem mitos. Mas, como a maioria sabe, a partir de 1978, Cat virou Yusuf e sumiu do mercado mundial, convertendo-se ao islamismo. Depois de algum tempo, ele voltou com álbuns infantis, cantando em árabe, voltados para sua comunidade.

 

 

Em 2007, no entanto, Yusuf voltou ao mundo, lançando um trabalho muito interessante, chamado “An Other Cup”, que marcava não só seu retorno ao cenário musical global, mas fazia isso lidando com interessantes diferenças estéticas. Se as canções de sua juventude quase sempre tinham um viés existencial-religioso, dando a entender que Cat estava em busca de algo que o completasse ou justificasse sua presença neste mundo, sua ressurgência como Yusuf mostrava que ele havia, enfim, encontrado o que procurava. E voltara para talvez oferecer a poucos e bons o caminho. Desde então, sua carreira é marcada por álbuns cheios de canções que parecem orientar e iluminar as caminhadas pessoais em busca de algo, empreendidas por seus admiradores. Não é diferente com este bom “King Of A Land”, quinto lançamento desde o retorno e décimo sétimo da carreira.

 

 

O álbum segue o mesmo formato destes trabalhos mais recentes. Basicamente, é um trabalho que tem o folk como alicerce maior, deixando espaço para que Yusuf insira suas letras e empreste sua figura ao resultado final das canções. Sendo ele quem é, dono de vivências muito peculiares, dentro e fora do mundo da música, cada uma das faixas ganha em profundidade e relevância. Este é o caso, por exemplo, da faixa-título, que contém uma mensagem para o Rei Charles III, comparando-o com aquele que Yusuf acha o verdadeiro Rei: Deus. Suas canções contém este viés religioso, mas o sujeito tem a manha de fazer isso sem expressar o desejo de catequisar o ouvinte para que venha integrar sua fé. Para Yusuf, ter fé e praticar a bondade, seja em que dogma for, é o que realmente importa. Como dissemos acima, ele parece ter encontrado o que procurava, justo nesta capacidade de abraçar ensinamentos de vida que vêm de sua relação com a religião islâmica. E traduzir isso sem soar doutrinador, é um de seus grandes méritos contemporâneos.

 

 

O feixe de canções carrega seu DNA lírico. São belos momentos ao violão, com instrumentais delicados, mas interessantes exceções. “Pagan Run”, que tem uma letra duríssima contra as pessoas que vivem suas vidas prejudicando e oprimindo os outros, ostenta alguns riffs de guitarra que têm origem no … hard rock. Temos também a presença de uma interessante e adorável faixa de protesto: “All Nights, All Days”, que ostenta uma levada que incorpora alguns bons elementos de rock. O álbum foi gravado em diferentes e icônicos estúdios europeus, como o Hansa Studios, em Berlim (lar da trilogia berlinense de David Bowie e de “Achtung Baby”, do U2), e o Friar Park, estúdio pessoal de George Harrison. Sobre gravar no estúdio de Harrison, Yusuf declarou:

 

 

“Foi uma honra ser um dos primeiros artistas de fora a estar naquela sala de estúdio para mixar o álbum. George Harrison é uma influência pra mim na música e na espiritualidade”. Se você ouve o disco, você vai sentir o espírito de George”, completou ele, que lança o álbum pela Dark Horse Records, fundada pelo próprio Harrison.

 

 

“King Of A Land” é um belo álbum de um artista que segue relevante e que porta uma mensagem espiritual intrínseca à sua música. A cada trabalho que lança, Yusuf/Cat mostra que sempre fez isso, apenas ajustou detalhes e aparou arestas. E segue belo. Ouça.

 

 

Ouça primeiro: “Pagan Run”, “All Nights, All Days”, “Another Night In The Rain”, “King Of A Land”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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