Tontom Périssé desponta com brilho intenso

 

 

 

Tontom – Mania 2000
18′, 5 faixas
(Independente)

5 out of 5 stars (5 / 5)

 

 

 

 

 

Há muita coisa para dizer além das cinco canções que compõem “Mania 2000”, o EP de estreia de Tontom Périssé. Antes de tudo, é bem provável que o hit viral “Tontom Perigosa” deve ser uma das maiores canções pop nacionais, não só de 2024, mas dos últimos anos. Se você é uma dessas pessoas que sentem saudade do pop rock nacional dos anos 1980, deveria correr atrás dela imediatamente. Vai lá, depois volta aqui para terminar de ler esta resenha. Tontom, ou melhor, Antônia Périssé, é filha da humorista Heloísa Périssé e do diretor Mauro Farias. Ela é irmã, por parte de pai, de Raquel Dimantas, cantora, compositora e estilista, colaboradora frequente de Ana Frango Elétrico. Tontom também é irmã, por parte de mãe, de Luisa Périssé, que é filha do casamento de Heloísa com Lug de Paula, o “Seu Boneco”. Toda essa estrutura familiar artística e antenada/arejada deu à menina condições de se interessar e navegar pelas águas do teatro e da música desde muito cedo. Não por acaso, aos 17 anos, Tontom está no topo da lista de virais do Spotify, que é aquela relação de músicas que grudam à primeira audição e que estão muito visadas em mídias adjacentes como, por exemplo, o Tik Tok.

 

Sendo assim, é possível perceber, de uma vez por todas, que o sucesso de um artista ou o êxito de uma canção/álbum é medido de formas novas e diferentes em nosso tempo e isso pode ser bem legal. Tontom gravou suas canções de forma totalmente independente, com a participação de Guilherme Lírio, que é músico de Ana Frango Elétrico e de gente como Gilberto Gil. Guilherme é uma das mais importantes figuras desse underground criativo carioca, no qual Ana Frango também é importantíssima, junto com Pedro Sá, Moreno Veloso, Kassin, o baixista Alberto Continentino, essa turma que já integrou as bandas de Caetano Veloso e projetos orbitantes, como Gilsons ou Bala Desejo. A sonoridade de Tontom, no entanto, não tem essa mesma vibração, pelo contrário. O idioma que ela apresenta em suas cinco canções, ainda que diverso e moderno, tem um elemento pop de massas que é bem notável. “Tontom Perigosa”, por exemplo, é totalmente tributária de gente como Cazuza, Kid Abelha ou mesmo da Rita Lee ultrapop da virada dos anos 1970/80. A produção de Guilherme vai pelo mesmo caminho de gente como Lincoln Olivetti, usando e abusando de timbres e arranjos muito familiares para os fãs do pop nacional oitentista.

 

As canções são de autoria da própria Tontom. Estudando música desde os sete anos, aprendendo piano e violão desde os onze, ela tem um pequeno acervo de composições e teve que deixar algumas de fora. As cinco que entraram em “Mania 2000” são ótimas e seguram a onda. “Tontom Perigosa” é, de fato, o melhor momento, tanto pelo jeitão pop oitentista, quanto pelo uso do próprio apelido da menina na letra, criando uma identidade bacaninha. “Como Iguais”, faixa que abre o EP, tem um arranjo mais retrô e vinculado a um pop-roquinho setentista meio blues, que resvala num refrão mais sessentista de tecladinho e bons momentos. “Sunshine”, com letra em inglês, é puro pop de almanaque, lentinha, climática e dolente, com mais um arranjo em que Lírio privilegia a doçura de Tontom e contrói uma cama de bons teclados. “Vê Se Atrasa” já envereda por um indiepop de violões neobossa, que não faria feio em “Pitanga”, de Mallu Magalhães. E “Crises 2000” é mais alusão ao pop rock oitentista nacional, mas num tom mais soturno, novamente próximo de Kid Abelha ou de Cazuza.

 

“Mania 2000” demora menos de dezoito minutos para ser ouvido. Ele comprova a existência de um cenário pulsante de música pop nacional sendo produzida neste exato instante. Não há como resistir à fofura de Tontom, que, muito mais que uma adolescente brincando de fazer música, se revela uma cantora promissora e séria, com critério e bom gosto. Seu EP é uma das grandes coisas da música brasileira em 2024.

 

 

Ouça primeiro: “Tontom Perigosa”, “Crises 2000”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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