OUTROEU e seu pop de almanaque

 

 

 

 

OUTROEU – A Mágica Por Trás da Forma
41′, 15 faixas
(Universal)

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

 

 

O pop brasileiro sempre teve ótimos representantes. De Roberto Carlos e Erasmo, passando por Rita Lee, Ritchie, Kid Abelha, Guilherme Arantes, Lulu Santos, Marina, Claudinho & Buchecha, entre outros. De uns tempos pra cá, esta linhagem mais tradicional do estilo ganhou uma nova vertente, o chamado pop good vibes, de artistas como AnaVitória, Melim e similares. Ainda que razoavelmente competentes, essa galera nova ainda não conseguiu honrar o pessoal que triunfou – e ainda triunfa – no passado. Até que chegamos neste terceiro álbum do duo fluminense OUTROEU, “A Mágica Por Trás da Forma”. Ainda que esteja situado, em termos de produção e estética, no tempo presente, trata-se de um trabalho em que o melhor do pop nacional tradicional é exaltado e adaptado para 2023, com quinze canções absolutamente grudentas, bem feitas e cheias de achados de refrão e ótimas letras. É isso mesmo.

 

Um mérito inicial do disco é não conter qualquer tipo de crossover com ritmos como reggaeton, funk, trap ou algo do gênero. É música pop tradicional, de inspiração oitentista, com arranjos que privilegiam baixo, bateria, guitarra e teclados, tocados e manipulados por Mike Tulio e Guto Oliveira, que integram a dupla. Tudo aqui é cheio de harmonia, um verdadeiro poço sem fundo de grude musical, que pode fisgar o ouvinte mais desavisado e mantê-lo por muito tempo em suas quinze faixas. A receita parece simples, ou seja, um investimento pesado nas melodias, mas sem arranjos abarrotados ou superproduzidos, apenas esse design básico, originário do pop anglófono dos anos 1970, repetido e adaptado no Brasil ao longo do tempo.

 

 

Uma das adaptações está na duração das canções. Das quinze faixas de “A Mágica Por Trás da Forma”, apenas duas vão além dos três minutos de duração. Nada mais normal em termos de tempo superativado, corrido, tiktokado. A dupla, mesmo nessa velocidade curta, deixa claro o seu talento. Não por acaso, Lulu Santos, em sua faceta cantor, está presente na faixa “Praia”, numa colaboração que faz todo o sentido, dando à melodia – que tem muito a ver com vários hits do próprio Lulu no passado – um tom de leveza e relevância ainda maiores. Além dele, as cantoras Clarissa e Anna Pego estão presentes, sem falar no rapper Nanno, que faz um flow em velocidade superlenta em “Meu Bem”, uma das faixas mais belas e simpáticas do álbum. Sempre haverá alguém disposto a se encantar com versos como “Meu bem/Quanto tempo faz/Que a gente nem fala mais/Eu tô com saudade de você”.

 

 

A maioria das faixas do álbum se equilibra no chamado “midtempo”, ou seja, são canções nem tão rápidas, nem tão lentas. Em alguns momentos, Mike e Guto atingem ótimo nível como intérpretes e mesmo cantores. É o que acontece em “Baby”, que tem menos de dois minutos e meio de duração, sendo quase totalmente preenchida por melodia perfeita e arranjo technopop light. O refrão entrega a simplicidade: “Baby, eu gosto/Baby, eu gosto de você/Por que você não quer me dizer?”. É o binômio “simplicidade x belezura” elevado a graus altíssimos. Isso já acontece logo na faixa de abertura, “Me Jogou Fora”, que tem um arranjo eficiente e inspirado, chegando a conter a melodia do tema de “Interstellar” no todo. O mesmo acontece em “Terminei”, o dueto com a cantora mineira Anna Pêgo. Outra melodia de talhe clássico, levemente inflexionada no r&b mais tradicional dos anos 1990, com arranjo econômico que realça o todo. “Nada Demais” é outra pequena perfeição melódica, dessa vez mergulhada num arranjo technopop de almanaque e “Praia”, o tal “feat” com Lulu Santos é mais uma representante dessa fórmula de composição e execução.

 

 

É certo que os artistas mencionados no início desta resenha já têm nome consolidado na música brasileira. Gravaram seus discos e canções em outros tempos, mas, se há alguém carregando a estética pop clássica na atualidade, com chances reais de deixar sua marca, e o OUTROEU. Ouça este disco sem preconceitos.

 

 

Ouça primeiro: “Baby”, “Meu Bem”, “Terminei”, “Praia”, “Nada Demais”

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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