“O Agente Oculto” – para dar dor de cabeça
Está em cartaz na Netflix o longa “Agente Oculto” (“The Gray Man”), dirigido pelos irmãos Joe e Anthony Russo, os mesmos dos filmes do Capitão América, Vingadores e, mais recentemente, “Extraction”, com Chris Hemsworth no papel de um agente secreto mercenário que parece uma revisita do “Rambo”, de Sylvester Stallone, devidamente adaptado ao mundo atual. Pelas referências, já dá pra saber que a onda dos caras é tiro, porrada e bomba, com muita ênfase, muita câmera espertinha, referências interessantes (“Agente Oculto” é baseado num livro, escrito por Mark Greaney, em 2009), mas com um defeito básico: o abandono do elenco em favor dos efeitos especiais e das tramas.
Explico: “Gray Man” tem um trio milionário protagonizando as ações. Ryan Gosling, Chris Evans e Ana de Armas, todos jovens, bombados na indústria e com talento suficiente para entregar algo bacana. Além deles, três coadjuvantes de peso estão presentes: Billy Bob Thornton, Wagner Moura e Alfre Woodard. E o que os irmãos fazem? Colocam estes atores no meio do roteiro – que é bem fraco – como se eles fossem iniciantes ou atores sem qualquer expressão e talento. O resultado é uma narrativa que tenta ser esperta, mas que padece, justamente, de boas atuações para ser minimamente crível. Mas, o que temos é um monte de clichês. Gosling novamente interpretando um cara que mata e dá porrada quase mudo, Evans com liberdade para criar um personagem carismático, mas que derrapa numa atuação pedante e ridícula e de Armas, que é ótima atriz, mas surge apenas como rostinho bonito para adornar uma mulher que também dá tiro, porrada e bomba. E é isso.
A história é a seguinte: Gosling é um agente secreto da CIA, cuja função é matar pessoas quando as normas internas da agência e as leis internacionais não podem ser burladas. Ele faz parte de um programa que recrutava criminosos, dando a eles indulto em troca deste serviço prestado. Numa missão na Tailândia, ele encontra um agente duplo, que, antes de ser morto, lhe avisa de vários problemas de corrupção e crimes cometidos dentro da própria CIA. É o suficiente para que ele passe de caçador à caça, num clima meio John Wick. Mas, claro, ele irá fazer de tudo para provar que as afirmações do tal agente são verdadeiras. Aí entra o próprio comando da CIA, que contrata um matador terceirizado para cuidar do caso, Lloyd Hansen (vivido por Evans), que não tem escrúpulos, não liga para as leis, tortura indiscriminadamente suas vítimas e, imediatamente, inicia uma perseguição mundial a Gosling, cujo nome é, simplesmente, Seis.
Quando digo “perseguição mundial”, significa dizer que, de cinco em cinco minutos, o filme apresenta uma locação nova, indo de Bangkok a Baku, de Berlim a Mônaco, da Croácia a Viena, tudo sem muita diferença entre os lugares, com a impressão de apenas mostrar milhagem na narrativa. As cenas são filmadas com variação de velocidade, som abafado, efeitos supostamente espertos que, ao fim de algum tempo, cansam a vista e trazem uma baita dor de cabeça. Além do mais, o filme só nos mostra gente má, assassinos, pessoas que derrubam governos, matam indiscriminadamente e atuam em todo tipo de agressão a leis internacionais, como se fossem pessoas boazinhas e sensíveis. Quer dizer, esta última parte fica apenas na vontade, uma vez que o elenco parece ter sido instruído a não interpretar.
Informações da produção dão conta de que “The Gray Man” custou impressionantes 200 milhões de dólares. Só para ficarmos em produções deste ano, “Top Gun – Maverick”, certamente um dos melhores filmes de 2022, custou 25 milhões a menos e, perto desta bomba aqui, parece a trilogia “O Poderoso Chefão”. “The Gray Man” é filme esquecível, ruim e irritante. Evite.
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.