Novo disco do Ratos de Porão é obrigatório

 

 


Está disponível nas plataformas de streaming o décimo-terceiro álbum dos Ratos de Porão – “Necropolítica”. Você não precisa ser um fã dos sons mais pesados para apreciar a belezura que é o disco. Na verdade, “belezura” talvez não seja o termo mais preciso para transmitir a extensão do álbum. São dez faixas, todas com letra de João Gordo, e melodia composta pelos outros três integrantes da banda – Boka, Juninho e Jão. Na capa uma citação quase explícita a “Sabbath Bloody Sabbath”, devidamente atualizada para os nossos tristes tempos. O trabalho reafirma a postura progressista que o Ratos sempre envergou em outros trabalhos que cronificaram a realidade nacional ao longo do tempo, caso de “Crucificados pelo Sistema” (1986), “Brasil” (1989) e “Século Sinistro” (2014).

 

Com uma sonoridade totalmente tributária do thrash metal oitentista e suas derivações, o Ratos construiu um disco conceitual que merece ser ouvido por todos. As letras são tão contundentes e, ao mesmo tempo, tão verdadeiras, que funcionam como uma espécie de jornal nacional que nunca foi ao ar. O governo atual e tudo o que ele representa, seus apoiadores, seus eleitores, enfim, está tudo aqui. Não há forma melhor de deixar este disco falar do que listando alguns trechos das letras, divulgando o clipe de “Aglomeração” e indicando a audição reiterada.

 

 

Do buraco do escárnio
Gente tosca, ignorante
Ódio branco inoperante
Analfabeto funcional

em “Alerta Anti-Fascista”

 

 

Negando a realidade
Neopentec antivacina
Ozônio vai no cu
Não esqueça a cloroquina

Matando a própria mãe
Por esta luz que te ilumina
A morte é mais que certa
No hospitalzinho do terror

Jesus te protege na aglomeração

em “Aglomeração”

 

 

O agro é pop!
O agro é top!
O agro é tech!
O agro é morte!

Cê tá sem moral?
Passa pano pra elite
Cê tá baixo astral?
Passa pano pra elite

em “Passa Pano Pra Elite”

 

 

Poder decidir quem deve viver
Poder decidir quem deve morrer
Poder decidir quem deve viver
Poder decidir quem deve morrer

Necropolítica
Necropoder
Foda-se a vida!

em “Necropolítica”

 

 

Decapitado
Dependurado
Cabeça pra baixo
Pulmão queimado
Câmara de Gás
Emparedado até sufocar
Morte indolor
Guilhotinado em Cristo

em “Guilhotinado em Cristo”

 

 

Com vergonha de ser brasileiro
Tão fuleiro o vira lata
Cúmplice dessa mamata
Gado muge e paga pau

Passa pano na cagada
O meme ensina, pró Jesus
Mercado sem carne e gasolina
Rachadinha podre pra golpista anti-China
Privatizando a morte, comprando o centrão

em “O Vira-Lata”

 

 

 

GDO
Milícia digital
Ação robotizada
Pra enganar geral

GDO
Fanáticos conduz
Melhor morrer na praia
Do que morrer na cruz

em “GDO”

 

 

 

Bostanágua, infectando nosso viver
Bostanágua, quando vai parar de feder?
Bostanágua, de que cu será que saiu?
Bostanágua, sujo, podre e vil

em “Bostanágua”

 

 

 

Pandemia é a câmara de gás
Velho, pobre ou preto, leva a morte eficaz
Sem oxigênio, Manaus já sucumbiu
Gado esperando, sua vida por um fio

em “Entubado”

 

 

 

Contemplando a terra plana da ilusão
Loira elite, flor de lotus ostentação
Menosprezo, a empatia tá ali no chão
Boy nervoso, arrogante sem razão

em “Neonazi Gratiluz”

 

 

 

 

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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