Mogwai e o post-rock do presente

 

 

Mogwai – As The Love Continues

Gênero: Rock alternativo

Duração: 61 min.
Faixas: 11
Produção: Stuart Braithwaite
Gravadora: Rock Action

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

O primeiro single deste novíssimo álbum do Mogwai (o décimo em 24 anos de carreira), veio como uma pegadinha. “Richie Sacramento”, o nome da faixa, é uma canção pós-punk clássica, com vocais, cheia de climas e guitarras mais ou menos convencionais, que não tiram um centímetro de seu polimento e eficiência, mas, como já sabemos, em termos de Mogwai, é algo totalmente fora da curva. E a ideia de desorientar o ouvinte se amplia quando passamos pelas outras dez faixas de “As The Love Continues”, que seguem o modelo mais convencional da banda escocesa – faixas instrumentais, climas erguidos a partir de guitarras, pianos e sintetizadores e uma dinâmica que alterna interlúdios de silêncio e esporro e/ou longas e meditativas peças. Tudo basicamente instrumental.

 

O fato de Stuart Braitwaithe, cérebro da banda, ter explicado há poucos dias que o título “Richie Sacramento” era como um amigo seu entendia a pronúncia de “Ryuichi Sakamoto”, já serve para deixarmos de lado a impressão de que o Mogwai é uma banda de caras sisudos e estranhos. Os nomes das canções surgem como contrastes interessantes para sua dimensão ampliada pela ausência de palavras. Sabemos bem que as letras podem restringir o sentido das faixas, o que é óbvio e até desejável. Mas, a partir da liberdade concedida pela ausência de palavras, os sentidos e significados ganham amplitude imensa e tal fato é importante para a música do Mogwai fazer sentido. Há um bom tempo que a banda não faz o que se chamava de “post-rock”, aquela sonoridade enguitarrada, supostamente liberta das amarras radiofônicas ou mercadológicas. A própria “Richie Sacramento” é totalmente feita para tocar no rádio e outras músicas, ainda que sejam nos moldes normais do grupo, também têm a pegada pop necessária para agradar aos fãs mais genéricos de música instrumental.

 

Há momentos peculiares ao longo do álbum. A segunda faixa, “Here We, Here We, Here We Go Forever”, tem uma interessante mescla de guitarras com timbres eletrônicos muito discretos, numa quase intencionalidade de soar datada, algo que, certamente, concede charme e apelo. “Dry Fantasy”, por sua vez, é clássica canção da banda, com timbres que vão aumentando numa espécie de disputa entre guitarras e sintetizadores, mas que nunca chega a ultrapassar os limites do barulho ou da distorção, pelo contrário, é algo belo e civilizado. “Drive The Nail” é mais convencional, seja nos timbres da guitarra, seja na bateria, que vai evoluindo com pratos abertos para um ápice que, ouvindo com calma, chega logo nos primeiros momentos da canção. É como se todos os sete minutos de duração fossem atravessados por esta noção de plenitude, de fim em câmera lenta.

 

Outra surpresa está na ótima “Fuck Off Money”, além de seu ótimo título. A voz de Braithwaite também está presente em meio ao andamento em marcha lenta e aos climas de sintetizadores, mas totalmente modificada por um vocoder e outros efeitos vocais. O resultado é sensacional. A segunda metade do álbum mantém o nível. “Celling Granny” é campo aberto para guitarras ciscarem e sassaricarem à vontade, “Midnight Flit” evolui do silêncio para uma apoteose de sintetizadores com sons de cordas, enquanto a ótima “Supposedly , We Were Nightmares” é uma mistura harmoniosa de timbres de guitarra pouco convencionais com teclados igualmente estranhos, na melodia mais ensolarada do álbum, talvez da carreira da banda. E o fecho, lúgubre a princípio, mas explosivo da metade pra frente, vem com “It’s What I Want To Do, Mum”.

 

“As The Love Continues” tem algumas surpresas mas é um álbum que mantém o Mogwai com seu status de banda relevante e interessante, algo que, depois de 24 anos de carreira, não é para todos. Ouça.

 

Ouça primeiro: “Fuck Off Money”, “Supposedly , We Were Nightmares”, “Richie Sacramento”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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