Três resenhas: Def Leppard, Fantastic Negrito e Banditos

 

 

 

 

Def Leppard – Diamond Star Halos
(Mercury)
61′, 15 faixas

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

 

 

 

Ninguém discute que os ingleses do Def Leppard formam uma das bandas mais sólidas do chamado hard rock dos anos 1980. Eles conseguiram isso às custas de largar o máximo possível de suas origens metaleiras da virada dos anos 1970/80 em nome de um rock mais simples, que se transformaria no que as pessoas passaram a chamar de hair metal ou “rock farofa”. Tudo bem, é um dos gêneros mais achincalhados da música pop recente, mas é, também, um dos mais bem sucedidos comercialmente. E o Leppard sempre estará entre seus maiores representantes, tendo concebido e lançado discos como “Pyromania” (1983, espécie de “marco zero” da coisa toda) e “Hysteria”, clássico maior, de 1987. Neste meio tempo, o grupo estava para aparecer no Rock In Rio de 1985, mas cancelou sua participação por conta do acidente no qual o baterista Rick Allen perdeu um dos braços. Sua manutenção no grupo é, até hoje, uma das maiores histórias de superação de um músico. Mas isso é assunto pra outro dia.

 

Com “Diamond Star Halos”, o DL quebra um silêncio de sete anos e segue como uma banda a ser ouvida. É bom que se diga que, a esta altura do campeonato, os caras não irão promover mudanças significativas no som. Sendo assim, o que você ouvirá no álbum é uma sucessão de bons rockões guitarreiros e canastrões, com ótima performance do vocalista Joe Elliott, ainda que seja visível a perda de alcance de sua voz. Mesmo assim, o grupo provê boas guitarras e ótimas canções, como “Kick”, que, além do nome, lembra o INXS se este fosse uma banda, digamos, mais enguitarrada. Também há chama e vigor na faixa de abertura, a ótima “Take What You Want” e nas duas participações da ótima cantora country americana Alison Krauss, “Lifeless” e “The Guitar”. No fim das contas, o ouvinte tem a certeza de ter ouvido um disco que entrega tudo o que a banda é capaz de dar hoje em dia. Tem canastrice, tem talento, tem o pacote completo. E ainda funciona.

 

Ouça primeiro: “Kick”, “The Guitar”

 

 

 

 

 

 

Fantastic Negrito – Black Jesus, White Problems
(Storefront)
41′, 13 faixas

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

 

O três vezes vencedor do Grammy, cantor, compositor, músico e ativista Fantastic Negrito (nome artístico de ́Xavier Dphrepaulezz) vem com este que é o seu projeto mais ambicioso e provocativo até hoje: “White Jesus Black Problems”. É um misto de jornada ancestral, uma história de amor improvável e até uma autodescoberta do verdadeiro nome, com Negrito mandando bala em sua mistura acentuada de rock com grooves de R&B e funk, oferecendo um som que consegue parecer vintage e experimental ao mesmo tempo.

 

O álbum foi escrito, gravado e filmado em Oakland, onde Negrito cresceu e atualmente reside. Combinado com o visual, temos uma experiência que desafia noções de identidade, origem e futuro, sendó baseado na história real de sua avó (sétima geração de sua família) escocesa branca (Gallamore), uma serva contratada, vivendo em um casamento de direito comum com seu avô escravizado afro-americano (Courage); desafiando abertamente as leis racistas e separatistas da Virgínia colonial da década de 1750. Em uma crítica de quatro estrelas, MOJO descreveu o álbum como uma “Esta tremenda síntese de retórica e blues-rock retorcido e de funk… um potente tour de force” e a American Songwriter faz comparações com Prince enquanto Negrito cria seu próprio “groove musical e temático que impulsiona sua música ainda mais”. De fato, há toques de Prince em várias canções, mas há surpresas como o viés baladeiro de “Venomous Dogma”, o funkaço de “Highest Bidder” e a psicodelia setentista de “Nibbadip”, que lembra um pouco de Sly Stone e por todo o disco adentro. Realmente, este é o melhor trabalho de Fantastic Negrito e tem cacife para ir alto em listas de melhores de 2022.

 

Ouça primeiro: “Highest Bidder”, “Nibbadip”, “Venomous Dogma”

 

 

 

 

 

 

 

Banditos – Right On
(Egghunt)
38′, 10 faixas

4.5 out of 5 stars (4,5 / 5)

 

 

 

 

Os Banditos são um grupo que vem de Nashville e iniciou sua carreira há poucos anos, como uma formação fincada no bluegrass e no country. Aos poucos eles foram mudando a orientação sonora e hoje, 2022, são uma belíssima banda de country’n’soul, levando adiante o som que gente como Dan Penn, Dusty Springfield e, mais recentemente, o Alabama Shakers pratica. Mas, enquanto o grupo de Brittany Murphy investe em sons mais modernos e climáticos, o Banditos se esmera em reproduzir texturas e climas dos anos 1970, com resultados ótimos. O grande charme dos sujeitos é a vocalista Mary Beth Richardson, que tem um vozeirão e muita presença de palco, além de compor. Não há uma única faixa ruim neste ótimo “Right On”, terceiro trabalho dos caras.

 

Mesmo tendo mudado a palheta sonora, os Banditos ainda conservam detalhes de suas origens e isso aparece em alguns momentos, quando o clima pende mais para o country sulista, ou mesmo um pouco de southern rock, caso da faixa-título, que tem uma levada clássica e detalhes de banjo que são uma lindeza. “Deepend Weekend” é um desses casos em que o grupo pisa mais fundo nessa seara rock, com ótimo resultado, mutando para uma dessas bandas de beira de estrada, convincente e encrespada. Também há um certo elemento noir que deve ser levado em conta, presente, por exemplo, na bela “Easy”. Mas é na forma de banda de soul que o grupo encontra seus melhores resultados, caso da magistral faixa de abertura, “Time Wasted”, na fofíssima “Here Tonight”, e na maravilhosa, sublime “Waves”, que tem bala na agulha pra brigar em topo de lista de melhores canções do ano. Quem gosta de música americana de hoje mas com um olho na boa tradição, vai adorar Banditos. Vai na fé.

 

Ouça primeiro: “Waves”, “Time Wasted”, “Here Tonight”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

One thought on “Três resenhas: Def Leppard, Fantastic Negrito e Banditos

  • 14 de junho de 2022 em 11:38
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    Parabéns.
    Um pequeno ajuste. O motivo do Def Leppard cancelar em 1985 não foi o Rick Allen.

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