Hootie And The Blowfish – Imperfect Circle

 

 

Gênero: Rock alternativo

Duração: 46 min.
Faixas: 14
Produção: Frank Rogers e Jeff Trott
Gravadora: Spinefarm Records

4 out of 5 stars (4 / 5)

 

O Hootie And The Blowfish é um típico guilty pleasure. Ele apresenta vários motivos para a detração absoluta: faz um som “banal” que já era assim lá em 1994, quando estreou em disco, com o ótimo “Cracked Rear View”; exalta uma imagem americana com histórias de amor e reflexão que soam ingênuas até para quem tem menos de 15 anos hoje; tem o vocalista Darius Rucker, cujo registro roufenho soa como um Eddie Vedder anabolizado e que trilhou carreira pelo country mais canastrão. Além disso, o quarteto da Carolina do Sul parece uma banda de bar, despojada, cujos integrantes – inclusive Darius – passariam ao seu lado na rua e você nem saberia. Mas tem um porém, enorme, do tamanho de um caminhão: o Hootie sabe – como pouquíssimos – misturar o rock enquanto sonoridade abstrata e de senso comum com melodias terrivelmente infecciosas, grudentas, praticamente perfeitas. São mestres da composição, da objetividade, da eficácia. Seu novíssimo álbum – o primeiro em 14 anos – “Imperfect Circle”, não só é um dos melhores de sua carreira, como é um pequeno milagre da composição pop perfeita. Não há faixa ruim.

 

O problema é que o mundo mudou e a gente não tem mais muita paciência para canções que poderiam sonorizar séries de TV como “Gilmore Girls” ou “Party Of Five” sem qualquer cerimônia, a não ser como nostalgia. O tempo passou, certo? Mas o Hootie não quer saber disso, segue enfileirando refrões perfeitos, arranjos pé no chão, com baixo, bateria e guitarra numa trindade energética e simplérrima, turbinados apenas por alguns metais aqui ou teclados ali. E tudo, absolutamente tudo, funciona às mil maravilhas. A tal ponto que é impossível ouvir “Imperfect Circle” apenas uma vez. O diacho gruda nos ouvidos e pede por mais e mais audições. É um disco terrivelmente simples, que ignora totalmente as regras do pop rock atual e poderia existir sem problemas em 1975. Ou em 1997. É um pequeno milagre involuntário de resistência ao teste do tempo.

 

A voz de Rucker, que eu critiquei acima, por outro lado, soa perfeita como prova de vigor para as canções. Quando entram as guitarras e as vozes de apoio, o Hootie ganha força e decola em vários momentos ao longo do disco. Aliás, “Imperfect Circle” traz duas participações femininas: Lucie Silvas, na faixa “Wildfire Love” e Sheryl Crow, que faz vários backing vocals aqui e ali. Mas o impressionante mesmo é constatar a perfeição pop/rock que os caras imprimem em suas canções. “Everybody But You” é um caso típico: tem levadinha malandra na bateria, início brando e alcança os céus quando entra o refrão, com as guitarras e a dobra dos vocais. É quase impossível não admirar a construção que os caras conseguem imprimir em uma simple canção de amor. Tem mais exemplos.

 

“Miss California” tem letra de amor, na qual Rucker se derrama em sentimentos por um amor impossível, banal toda vida, mas que funciona dentro do parâmetro de sonho/ingenuidade que a banda explora. O instrumental é perfeito, alternando momento lentinho com aceleração no refrão. É tudo assim, com verdadeiros acertos no alvo numa média altíssima: “Hold On”, “New Year’s Day”, os metais pop/soul de “Turn It Up”, “we Are One”, com clima de amor total, “Rollin'”, o ritmo levemente dançante de “Half A Day Ahead”, enfim, praticamente tudo por aqui é encantadoramente simples, descomplicado e direto. E eficiente. De quebra, aproveitando o lançamento digital do álbum, há uma cover de “Losing My Religion”, do REM, que, apesar do talento do Hootie, não vai além do ok, com uma quase-cópia do origina. Talvez seja o momento menos interessante por aqui.

 

Poucos ou nenhum crítico de música admite gostar dessas bandas e artistas, considerados “uncool” pelo descompromisso com tendências, modernidade e outros conceitos acessórios à música, mas, quando o assunto é, justamente, música, não dá pra ignorar a maestria desses sujeitos. Ouça dirigindo, viajando de ônibus ou apenas para desligar das coisas. Funciona. E bem.

Ouça primeiro: “Hold On”

 

CEL

Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.

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