E o disco de remixes nacionais do DJ Memê?
DJ Memê Apresenta – Clássicos Reboot (vol.1)
70′, 10 faixas
(Universal)
Marcelo Mansur, o DJ Memê, certamente gosta do trabalho de Tom Moulton, Joey Negro e John Morales. Estes remixadores, DJs e produtores gringos fundaram e pavimentaram a atuação de profissionais que se arvoraram a mexer em gravações já existentes, alongando-as, acrescentando elementos, tornando-as diferentes dos originais, mas conservando a sua essência. Não espere nunca alguma ação radical e remodeladora por parte deles em suas versões. Meme é um cara que faz o mesmo, acrescenta, tempera, joga pitadas de cordas, batidas, linhas de baixo, percussão no que faz. Desde quando surgiu para um público maior, ao fazer o – ótimo – remix de “No Mundo da Lua”, do Biquini Cavadão, em 1985, ele vem surfando em águas elegantes que o levaram a colaborar criativamente com vários artistas desde o início dos anos 1990.
O mais importante deles foi Lulu Santos, para quem produziu cinco álbuns e que dividiu um deles com o DJ, em 1995. Gabriel, o Pensador (produção no álbum “Quebra Cabeça”, em 1997), Kid Abelha (produção de “Autolove”, em 1998), Barão Vermelho (produção de “Puro Êxtase”, em 1998), Claudinho e Buchecha (produção em “A Forma”, 1996 e do o megassucesso “Só Love”, 1998), entre outros, também contaram com a presença de Memê, que lançaria, em 1999, um álbum “Memê e Eles”, no qual mistura artistas do pop rock nacional dos anos 1980 e 1990 em versões diferentes e interessantes. Mas Memê sempre foi um cara que esteve mais à vontade na discotecagem e no trabalho de estúdio, pesquisando e remexendo em canções. Daí veio a ideia de fazer um álbum como este “Clássicos Reboot”, a partir de uma remixagem feita com “Fullgás”, canção de 1984, produzida por Liminha, que fez decolar a carreira de Marina Lima. Não parece, mas já se vão 38 anos desde o lançamento da faixa e ela encabeça o grupo de dez canções do álbum.
Alguns momentos aqui são menos inspirados, caso de “Daqui Pro Méier”, de Ed Motta, alongada aos sete minutos e meio, sem muita necessidade, visto que há pouca ou nenhuma adição interessante ao já suingado original. A versão para “Cheiro de Amor”, de Maria Bethânia, de 1979, é curiosa, mas não vai muito além do ótimo registro original. E “Lança Perfume”, de Rita Lee, com quase dez minutos, com mudanças em favor de um batidão meio estéril que acaba cansando. As outras sete canções presentes em “Clássicos Reboot” justificam o investimento de tempo e atenção no trabalho que Memê empreende por aqui, a começar pela alardeada versão de “Fullgás”, batizada aqui como “DJ Memê & Faccinetti RMX”, que tem na ênfase nas ótimas linhas de baixo de Liminha o seu grande trunfo.
Bem legal também é o resgate de “Pessoa”, original de 1983 de Dalto, imersa num ambiente technopop adoravelmente datado, cheia de teclados e sintetizadores, revalorizados aqui. E tem a original sacada de trazer uma versão para “Quero Um Baby Seu”, do Caetano Veloso de 1981, fase “Outras Palavras”, um de seus discos mais cariocas e ensolarados. Também tem escolhas mais óbvias que convencem pela excelência da remixagem que Memê faz, caso explícito de “A Noite Vai Chegar”, de Lady Zu, que é enxertada por trechinhos de “Do The Latin Hustle”, de Van McCoy e naipe de metais em brasa, talvez o melhor momento do álbum. Também tem as ótimas releituras de “Só Você”, classicão de Vinícius Cantuária e “Lindo Lago do Amor”, o momento technopop de Gonzaguinha, de 1984. E a versão de “Óculos”, dos Paralamas do Sucesso, lembrando que Memê é um conhecedor do rock oitentista, capaz de valorizar detalhes de canções que parecem esgotadas.
“Clássicos Reboot” (vol.1) é uma dessas coletâneas que valem a pena ter por perto. Algumas versões aqui são ótimas e motivam a gente a correr atrás dos originais para tentar achar os detalhes aqui ressaltados/revelados. Que venham mais álbuns como este, a música brasileira agradece.
Ouça primeiro: “Pessoa”, “A Noite Vai Chegar”, “Lindo Lago do Amor”, “Fullgás”
Carlos Eduardo Lima (CEL) é doutorando em História Social, jornalista especializado em cultura pop e editor-chefe da Célula Pop. Como crítico musical há mais de 20 anos, já trabalhou para o site Monkeybuzz e as revistas Rolling Stone Brasil e Rock Press. Acha que o mundo acabou no início dos anos 90, mas agora sabe que poucos e bons notaram. Ainda acredita que cacetadas da vida são essenciais para a produção da arte.